Os oito segundos em que a Catalunha foi independente
11 de outubro de 2017A estudante Laura Grau, de 19 anos, correu do campus universitário para o Passeig de Lluis Companys, o passeio que conecta o Arco do Triunfo com o maior parque de Barcelona, a Ciutadella. Apenas 600 metros além está o Parlamento regional, onde o chefe do governo catalão, Carles Puigdemont, declararia, minutos depois, a "independência suspensa" da Catalunha.
Laura carregava nos ombros a estelada, a bandeira que é um dos símbolos do movimento de independência catalã, quando se uniu à multidão de apoiadores da secessão reunidos na avenida. Organizações separatistas haviam convocado a manifestação para acompanhar o aguardado discurso de Puigdemont, transmitido em telões instalados no passeio de nome simbólico.
O Passeig de Lluis Companys homenageia o líder histórico da esquerda republicana catalã e antigo presidente regional, que buscou o exílio na França depois da Guerra Civil Espanhola. Ele foi preso, torturado e morto pela polícia do ditador Francisco Franco, em 1940. O nome Lluis Companys ganhou um significado adicional alguns dias atrás, quando Pablo Casado, um membro de alto escalão do Partido Popular, que está no governo, disse que "Puigdemont pode acabar como Companys" se seguir adiante com a independência. "Essas são as pessoas que nós queremos abandonar", afirmou Laura.
Pouco antes da fala de Puigdemont, o clima no Passeig de Lluis Companys era de expectativa e esperança. "Esperei toda a minha vida por este dia", disse uma senhora que estava entre a multidão. A manifestação reuniu pessoas de todas as idades, e muitas delas falavam catalão. Mas havia também falantes do castelhano na multidão, além de estrangeiros movidos pela curiosidade. "Não é todo dia que se vê o nascimento de um novo país", disse um jovem cientista político de Portugal.
Muitos apoiadores da independência seguravam rosas vermelhas. Quando o discurso do líder catalão foi adiado em uma hora, os apoiadores se mantiveram ocupados entoando cantos pró-independência e fazendo apostas sobre o que ele diria. A maioria apostava na chamada DUI, ou declaração unilateral de independência. Os cantos eram em alto som, assim como as vaias e assobios quando opositores apareciam no telão.
Do entusiasmo à decepção
O silêncio se impôs logo depois do início da sessão do Parlamento da Catalunha. Alguns separatistas até mesmo foram às lágrimas diante da iminência de uma independência há tanto aguardada. Mas, em vez disso, Puigdemont anunciou que "assume o mandato do povo", para, oito segundos depois, suspender a independência "por algumas semanas" para tentar negociações com o governo espanhol.
A primeira parte foi recebida com aplausos pela multidão, mas o entusiasmo se transformou em decepção quando o líder catalão prosseguiu com seu discurso. A notícia da "independência suspensa" foi um balde de água fria para a multidão reunida no Passeig de Lluis Companys.
A confusão se impôs. Alguns aplaudiram Puigdemont, outros o vaiaram. Muitas pessoas que vieram dos arredores de Barcelona disseram que perderam seu tempo com a viagem. Apoiadores da independência, principalmente de organizações de extrema esquerda, começaram a gritar "traidor", pois esperavam uma declaração de independência feita com palavras claras. Eles pediram a renúncia de Puigdemont.
Quando o discurso acabou, e a compreensão de que a aguardada independência havia sido adiada se impôs, as pessoas reunidas no Passeig de Lluis Companys começaram a ir para casa, desapontadas e irritadas.
Negociações sem perspectiva
Entre os manifestantes predominava a opinião de que negociações com o governo espanhol não levarão a lugar algum. "Não tem mais volta," disse o estudante de física Andreu. "Não queremos mais ouvir falar do governo espanhol. Não devemos negociar com eles."
A frustração dos apoiadores da independência contrastava com os sinais de alívio entre as pessoas contrárias a ela. "Eu estava esperando o pior", comentou a professora Maria Jose, de 45 anos. "Espero que agora as coisas se acalmem e que eles comecem a negociar e reconstruir as pontes que derrubaram."
"Meus pais são do sul da Espanha, são migrantes da Guerra Civil Espanhola, como várias outras pessoas aqui na Catalunha", ela acrescentou. "Por isso eu me sinto tanto catalã como espanhola. E há muitas pessoas aqui que sentem o mesmo. A separação da Espanha é uma ideia totalmente inconsequente, me pergunto se eles sabem o que estão fazendo."
O fotógrafo Marc Medina tinha opinião semelhante. "Para mim, é uma decisão inteligente". Ele contou ter festejado a vitória do "sim" no referendo com amigos na Plaza Catalunya. "Uma 'verdadeira' declaração de independência só colocaria lenha na fogueira, e não queremos isso. Queremos diálogo. Agora a bola está com o governo da Espanha."
O farmacêutico Gerard disse que estava temeroso diante das consequências de uma declaração unilateral de independência. "Estou realmente preocupado com as consequências econômicas e o potencial êxodo de empresas da Catalunha. Incerteza, divisão e discurso do ódio dominaram nos últimos meses. Espero que os dois lados se acertem logo."