As lições deixadas pela segunda onda de covid-19 na Índia
17 de junho de 2021Apesar da diminuição no número de novos casos de covid-19 e da flexibilização das restrições na Índia, especialistas alertam que o país ainda tem um longo caminho a percorrer para prevenir a disseminação do coronavírus com eficácia.
Em resposta à devastação registrada em abril e maio, muitos estados começaram a expandir sua infraestrutura de saúde para garantir a disponibilidade de equipamentos essenciais, medicamentos e leitos de UTI.
No auge da segunda onda, em abril e no início de maio, o número diário de novos casos frequentemente ultrapassou 400 mil. Nesta quarta-feira (16/06), no entanto, a Índia registrou apenas 62.200 novos casos, marcando uma queda acentuada em relação aos números de maio.
Ainda assim, muitos alertam que uma nova onda pode estar a caminho, diante de uma campanha de vacinação que custa a deslanchar e a disseminação de novas variantes. A Índia está lutando contra uma escassez aguda de oxigênio e medicamentos que salvam vidas, enquanto pacientes não conseguem um leito, e muitos morreram fora dos hospitais por falta de tratamento.
Proteção para crianças
O chefe de governo de Nova Déli, Arvind Kejriwal, anunciou a criação de uma força-tarefa pediátrica e dois laboratórios de sequenciamento de genoma, assim como de um plano para aumentar a capacidade de oxigênio no território da capital nacional. A região foi uma das mais atingidas pela segunda onda.
Devido ao fato de as crianças virem a ser mais vulneráveis a uma potencial terceira onda, o estado ocidental de Maharashtra planeja aumentar o número de leitos pediátricos para covid-19 para quase 2.300, ante o número atual de 600.
A capital financeira, Mumbai, que ganhou elogios pela gestão da segunda onda, já está adquirindo respiradores, monitores e outros equipamentos médicos. "Estamos totalmente equipados. Temos quatro centros de atendimento de covid-19 com unidades pediátricas, que poderão abrigar mais de mil crianças", disse o comissário municipal de Mumbai, Iqbal Singh Chahal, à DW.
Da mesma forma, o estado de Jharkhand, no leste do país, revelou um plano que inclui a instalação de 20 leitos de UTI pediátrica em cada distrito e a conversão de todos os centros de tratamento de desnutrição em unidades destinadas a fornecer um nível de cuidado mais intensivo do que enfermarias normais. O plano também identifica lacunas em recursos essenciais e necessidade de medicamentos entre grupos de idade pediátrica.
"Acho que estamos melhor preparados para lidar com a terceira onda. Pode haver gargalos, mas hospitais e autoridades governamentais tomaram medidas preventivas", diz Priscilla Rupali, especialista em doenças infecciosas do Christian Medical College.
Vacinação lenta
Os virologistas e cientistas acreditam que a chave para impedir uma terceira onda é vacinar os vulneráveis, juntamente com a obtenção de dados confiáveis sobre o sequenciamento do genoma das variantes do coronavírus em circulação.
"O lento progresso da vacinação é um problema. Isso favorecerá o desenvolvimento de mais variantes, e também a terceira onda pode nos atingir mais cedo do que o resto do mundo desenvolvido, porque ainda haverá um grande número de indivíduos suscetíveis", acredita Vineeta Bal, cientista do Instituto Nacional de Imunologia.
"Não são apenas as crianças que serão suscetíveis na próxima onda porque não receberão a vacina, mas também as pessoas de outras faixas etárias e mulheres grávidas", diz Bal.
Embora a Índia tenha estabelecido uma meta ambiciosa de fabricar mais de 2 bilhões de doses de vacinas contra covid-19 até dezembro, o que seria suficiente para inocular a maior parte da população, a campanha de vacinação foi criticada por se mover em um ritmo lento.
Dados oficiais mostram que apenas 11% da população recebeu pelo menos uma dose, enquanto apenas 3,4% completaram as duas doses necessárias.
"Para vacinar toda a população, são necessários tanto o abastecimento quanto uma equipe treinada", ressalta Bal.
Novas variantes
A segunda onda na Índia também foi impulsionada por uma variante altamente infecciosa, agora comumente conhecida como variante delta. Uma cepa da variante delta agora é classificada como "preocupante" pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e, de acordo com a equipe de resposta à covid-19 do Imperial College do Reino Unido, ela também pode contribuir para uma forte terceira onda.
"A segunda onda sobrecarregou o sistema. Precisamos vacinar pelo menos entre 9 e 10 milhões de pessoas todos os dias e conter agressivamente o vírus", diz o epidemiologista Giridhar Babu.
"A gravidade dessa onda não se deve ao fato de o vírus ter se tornado mais letal, mas porque se tornou mais infeccioso e transmissível", explica.
Além disso, um ritmo lento de vacinação permite que novas variantes se desenvolvam e se espalhem.
"A segunda onda nos ensinou lições valiosas, e acho que estamos melhores em termos de suprimento de oxigênio em hospitais distritais e centros de saúde comunitários. Não acho que haja motivo para pânico", avalia Shally Awathi, pneumologista pediatra da King George's Medical University em Lucknow.
A Índia registrou oficialmente quase 120 mil mortes e mais de 9 milhões de infecções somente em maio, um número que os especialistas acreditam ser muito menor do que a realidade. Ao todo, o país soma 30 milhões de casos e mais de 380 mil mortes desde o início da pandemia.