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As acusações que pesam sobre Ricardo Salles

8 de julho de 2020

Para procuradores do MPF, ministro do Meio Ambiente favorece interesses que não têm relação com a finalidade da pasta. Servidores do Ibama denunciam interferência. Salles também é investigado por enriquecimento ilícito.

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Ricardo Salles
"A ação de um grupo de procuradores traz posições com evidente viés político-ideológico", disse Salles por meio de assessoriaFoto: Imago/Fotoarena

A lista de argumentos reunidos pelo Ministério Público Federal (MPF) para pedir o afastamento urgente de Ricardo Salles do Ministério do Meio Ambiente é longa. Numa ação de improbidade administrativa assinada por 12 procuradores, Salles é acusado de, intencionalmente, desmontar órgãos de fiscalização, desestruturar orçamentos e infringir princípios da administração pública – da moralidade, eficiência, legalidade, entre outros.

O documento, de 128 páginas, chegou na tarde desta segunda-feira (06/07) à 8ª Vara de Justiça Federal. Ele aponta que o atual ministro atuou, omitiu e discursou para esvaziar as políticas ambientais do país "mediante o favorecimento de interesses que não possuem qualquer relação com a finalidade da pasta que ocupa".

Segundo os procuradores, os efeitos maléficos da gestão são imediatos e, em muitos casos, irreversíveis. "Como mostram os dados sobre o aumento do desmatamento e o avanço de atividades econômicas ilegais sobre áreas de floresta nativa, incluindo áreas especialmente protegidas, como terras indígenas e unidades de conservação", exemplificam.

A polêmica reunião ministerial sob comando do presidente Jair Bolsonaro que foi gravada em vídeo e tornada pública pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no fim de maio teria deixado claras as intenções de Salles. "A manifestação do requerido na reunião ministerial de 22 de abril de 2020 escancarou os propósitos de sua gestão e o desvio de finalidade nos atos praticados", pontua a ação.

Na ocasião, Salles considerou a pandemia do novo coronavírus, que já matou mais de 66 mil brasileiros, uma "oportunidade" para modificar normas ambientais. Ele sugeriu fazer uma "baciada" de mudanças e "passar a boiada" enquanto a imprensa tem a covid-19 como foco.

Além do afastamento do cargo, o Ministério Público pede que o atual ministro tenha os direitos políticos suspensos por cinco anos, arque com o ressarcimento dos danos que provocou e que seja condenado a pagar os custos e despesas do processo, estimados em 1,5 milhão de reais.

Redução do papel do Ibama

No Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), responsável pela fiscalização ambiental, servidores denunciaram em diversos momentos as incoerências de Salles.

"A perda da autonomia é o maior dos nossos pesadelos. Começa com o ministro interferindo diretamente no Ibama e no ICMBio [Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade] como se fossem órgãos subordinados, e não apenas vinculados ao Ministério do Meio Ambiente. Passa pelo presidente do Ibama, Eduardo Bim, que tem agido como assessor do Salles, sem se posicionar em defesa da instituição e seus servidores mesmo diante de tantos ataques", disse um funcionário que prefere não ter o nome revelado nesta reportagem.

Servidores ouvidos pela DW Brasil criticam ainda a interferência das Forças Armadas na área ambiental. "Dedicamos grande parte dos nossos esforços à Amazônia e agora sob o comando de militares que procuram a todo custo nos empurrar para estratégias de ações antiquadas que abandonamos há quase 20 anos, gerando ainda mais desgaste nas nossas reduzidíssimas e sobrecarregadas equipes", revelam.

Um dos argumentos apontados pelos procuradores na ação contra Salles é o custo da Operação Verde Brasil, que enviou soldados do Exército para combater as queimadas na Amazônia depois da repercussão internacional em 2019. Em apenas dois meses, a operação custou mais de 124 milhões de reais, 14 milhões de reais a mais do que o orçamento anual previsto para ações de comando e controle pelo Ibama no mesmo ano.

Para o MPF,  "Salles decidiu encolher as estruturas do Estado responsáveis pelo combate ao desmatamento e às queimadas e reduzir o papel do Ibama, de maneira ilegal". A ação estima que, em 2019, sob a gestão de Salles, 318 mil quilômetros quadrados de florestas viraram cinzas – um recorde. Também houve aumento nas taxas mensais de desmatamento. 

Outros processos

Para o Observatório do Clima, motivos para a queda do atual ministro não faltam. "Ele faz mal para a economia do país. Há muitas manifestações de investidores dizendo que vão tirar dinheiro do Brasil pela política ambiental e ameaça aos indígenas", comenta Márcio Astrini, secretário executivo do observatório, rede formada por 37 entidades da sociedade civil. "Mas talvez ele só saia de lá (do comando do ministério do Meio Ambiente) preso."

Antes de assumir o cargo no governo Bolsonaro, Salles havia sido condenado em primeira instância em São Paulo por fraudar um processo do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental da Várzea do Rio Tietê quando foi secretário estadual do Meio Ambiente. O caso corre agora na segunda instância.

Outra investigação no Tribunal de Justiça de São Paulo apura denúncias de enriquecimento ilícito de Salles, que sextuplicou seu patrimônio entre 2012 e 2018, de 1,4 milhão de reais para 8,8 milhões de reais. O atual ministro foi secretário particular do então governador Geraldo Alckmin de 2013 a 2014 e secretário do Meio Ambiente de São Paulo de 2016 a 2017.

Recentemente, outras ações foram protocoladas no Supremo Tribunal Federal (STF) e na Justiça Federal do estado do Amazonas contra o ministro por exportação de madeira sem fiscalização e congelamento do Fundo Amazônia e do Fundo Clima.

"Ele está alinhado com Bolsonaro que, em várias áreas, tem a 'destruição' como agenda. É assim na área de comunicação com a imprensa, de direitos humanos, de educação, de ciência e na área ambiental", avalia Astrini.

Questionado pela DW Brasil sobre a ação movida pelo MPF, Salles respondeu, por meio de sua assessoria de imprensa, com a mesma nota que já havia sido divulgada à imprensa na segunda-feira. 

"A ação de um grupo de procuradores traz posições com evidente viés político-ideológico em clara tentativa de interferir em políticas públicas do Governo Federal. As alegações são um apanhado de diversos outros processos já apreciados e negados pelo Poder Judiciário, uma vez que seus argumentos são improcedentes", diz a nota.

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