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Artes

5 de outubro de 2010

Museu em Berlim reúne trabalhos de artistas do Die Brücke, grupo inserido no expressionismo alemão, que redefiniu a arte nos primórdios do século 20. Retrospectiva atual é dedicada às pinturas de Erich Heckel.

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'Duas Meninas na Água' (1910), de Erich HeckelFoto: Sammlung Hermann Gerlinger: Klaus Göltz

A maior coleção de obras do Die Brücke (A Ponte, literalmente) está alojada em uma edificação modesta, de um andar, na periferia de Berlim. O coletivo foi fundado em Dresden, em 1905, por quatro estudantes universitários que abandonaram seus estudos para se dedicarem inteiramente à arte.

Eles – Ernst Ludwig Kirchner, Fritz Bleyl, Erich Heckel e Karl Schmidt-Rotluff – eram obcecados pelo desejo de criação de um novo tipo de arte que, nas palavras deles próprios, fosse "imediata e pura". "O objetivo era revolucionar a arte. E eles realmente revolucionaram a arte alemã, ao retratarem suas emoções mais íntimas e percepções subjetivas, o que, para a época, era algo novo", explica à Deutsche Welle a estudiosa Kathy Stoike.

A forma com que os artistas representavam objetos e pessoas era muito nova e não foi compreendida naquele momento, pontua Stoike. "Você vê uma tempestade de cores e tem que imaginar que as pessoas, em 1905, ainda não tinham fotografias coloridas, nenhum filme em cor e as cores em neon, que temos hoje, não existiam. Era tudo um pouco mais escuro e em preto-e-branco", lembra a especialista.

Do coração para a tela

Brücke Museum in Berlin
Museu Brücke, em BerlimFoto: AP

Os artsitas do Die Brücke esforçavam-se para captar suas percepções interiores e transpô-las para a tela – não exatamente o que diziam, mas sim o que sentiam. Sob a ótica de Schmitt-Rottluff, por exemplo, um barco navegando transforma-se num caleidoscópio de cores vibrantes, que evoca o encanto e a magia de um dia de verão no mar.

Já um nu em repouso de Kirchner, pintado com movimentos impulsivos de um vermelho reluzente, com as sombras das curvas da pessoa retratada em azul e verde, é surpreendente e sensual, confortável e quente.

Os artistas do grupo rejeitavam não somente as convenções e a estética da arte clássica, mas também as técnicas estabelecidas, criando seus próprios métodos enquanto desenvolviam seus trabalhos. Embora essas técnicas fossem muito eficazes em termos de expressão criativa, elas eram também impraticáveis, explica Magdalena Möller, diretora do Museu Brücke em Berlim.

"Os artistas eram autodidatas. Eles estudaram Arquitetura, não Artes, e não sabiam como preparar telas nem como trabalhar com pintura a óleo", observa. Eles simplesmente aplicavam as tintas diretamente do tubo sobre a tela. "Essa era uma forma completamente não ortodoxa de trabalhar óleo sobre tela. E essa é também a razão pela qual as pinturas deles são tão frágeis, não tendo estabilidade sobre a tela. É por isso que esses trabalhos, hoje, precisam ser transportados com tanto cuidado", completa Möller.

Brücke no auge

Até 1910, o grupo foi desenvolvendo um estilo coletivo distinto, centrado em temas como a beleza natural das paisagens e a forma humana. Cada artista tinha sua própria técnica individual, mesmo que os trabalhos desse período, como um todo, tenham mantido características comuns, como a simplicidade da representação, o uso de cores vibrantes e uma harmonia extraordinária em termos de composição. Esse período é considerado como o auge das atividades do Die Brücke.

Ausschnitt aus Ernst Ludwig Kirchners Berliner Strassenszene
'Cena de Rua Berlinense': obra de Ernst Ludwig Kirchner já influencidada pela vida na metrópoleFoto: AP

Em 1911, os artistas se transferiram para Berlim. A partir de então, a vida na metrópole passou a influenciar decisivamente os trabalhos do grupo: ângulos pronunciados, em um trabalho aguçado e sensível, e uma gama de cores mais suaves tornaram-se os elementos que passaram a marcar o estilo do grupo, mais focado em cenas de rua e em retratos austeros.

Difamados pelos nazistas

Em 1913, divergências pessoais e profissionais levaram à dissolução do grupo, embora os artistas tenham continuado a trabalhar separadamente, cada um lutando pelo reconhecimento de sua obra até nos anos 1920.

"É claro que, nos anos 1930, com a ascensão dos nazistas ao poder, todos eles foram difamados como artistas 'degenerados'. Eles foram reestabelecidos depois da Segunda Guerra Mundial, mas aí a arte figurativa já não era mais favorecida, por ter sido explorada pelos nazistas na propaganda do regime", diz Stoike.

A arte do Die Brücke, embora expressionista, era demasiado figurativa para o pós-guerra, e acabou "saindo de moda". Entrava em voga o gosto por uma arte mais abstrata, com artistas como Wassily Kandinsky chamando atenção no cenário internacional.

Com o tempo, porém, o Die Brücke resgatou seu espaço na história da arte, tendo se tornado sinônimo do movimento expressionista alemão e ocupando justamente seu lugar na lista da vanguarda internacional.

Resgatando a popularidade do grupo

Hoje, pode-se falar em um ressurgimento, em nível internacional, da popularidade do grupo, analisa Magdalena Möller, diretora do Museu Brücke em Berlim, que tem recentemente recebido pedidos de empréstimo de mais de 150 obras de seu acervo, vindas de renomadas instituições espalhadas pelo mundo, como o Museu Pushkin de Moscou, a Royal Academy de Londres e o MoMa (Museu de Arte Moderna) de Nova York, para citar apenas algumas.

Até mesmo os franceses estão adquirindo gosto pelos primórdios do expressionismo alemão: está agendada para o próximo ano a primeira exposição do Die Brücke na França.

Diebstahl im Brücke Museum in Berlin; Gemälde Römisches Stillleben von Erich Heckel gestohlen
'Natureza Morta Romana', de Erich Heckel, foi roubada do Museu Brücke em 2002Foto: AP

Möller diz que a simplicidade e a retidão da arte do grupo ó que a torna tão atraente hoje. "O observador não tem que interpretar nada abstrato, complicado ou sobrecarregado de problemas. E nem a arte do Die Brücke é conceitual, de forma que você tenha que ter um conhecimento adicional para compreendê-la", salienta a diretora do Museu.

Para o observador, basta simplesmente sentar-se, relaxar e deixar-se levar pelas cores vibrantes, claras, e pela simplicidade das linhas. A abordagem não ortodoxa da arte criada por eles naquela época acabou sendo um golpe do destino, explica Stroke.

"Era um movimento contra a sociedade burguesa. Os artistas adoravam trabalhar ao ar livre, próximos da natureza e inspirados por ela. Gosto de pensar neles como os primeiros hippies da história, muito antes dos da década de 1960", conclui Möller.

Autora: Leah McDonnell (sv)
Revisão: Alexandre Schossler