Apoiadores de Trump migram para redes sociais de nicho
17 de janeiro de 2021Há semanas, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, repete, sem apresentar provas, a acusação que a oposição democrata fraudou as eleições presidenciais de novembro.
Depois de insuflar seus apoiadores de tal modo que alguns deles acabaram por atacar Capitólio, o Twitter suspendeu o perfil de seu mais infame usuário, inicialmente, por um período de 12 horas. Pouco depois, acabaria por encerrar sua conta de modo permanente, removendo do presidente o seu maior palanque.
Durante seus quatro anos à frente do governo, Trump compartilhou seus pensamentos com seus quase 90 milhões de seguidores praticamente todos os dias, às vezes, a cada hora. A suspensão permanente de seu perfil pegou o mundo de surpresa. A chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, descreveu a medida como "problemática”, e sugeriu que uma empresa privada não deveria tomar decisões que possam coibir a liberdade de expressão e que uma ação do tipo deveria ser baseada em legislação governamental.
Especialistas americanos, porém, afirmam que a 1ª emenda da Constituição americana impõe limites apenas às instituições do governo no que diz respeito a restrições ao discurso livre, e não se aplica ao setor privado. "Não é assim que funciona”, afirmou o ex-diretor de Cibersegurança e Infraestrutura de Segurança do Departamento de Segurança Interna dos EUA, Chris Krebs.
"Questão delicada” para o Twitter
Pinar Yildirim é professora assistente de marketing da Faculdade Wharton da Universidade da Pensilvânia. No ano passado ela foi coautora do estudo chamado Mídias sociais e contribuições políticas: O impacto de novas tecnologias na competição política”.
"No que diz respeito às preocupações de Merkel, acho que ela também tem o direito de expressá-las, e posso entender de onde elas vêm”, afirmou a especialista. "Acho que as companhias devem agir. [Elas não devem] simplesmente se omitir e deixar que a troca de informações, que potencialmente possam gerar violência, ocorra em suas plataformas.”
Ela, porém, diz compreender o dilema do Twitter. Para ela, a plataforma se encontra em posição delicada. "É uma decisão difícil e complicada de se tomar, porque eles têm de decidir também se concedem aos indivíduos a habilidade de se expressarem.”
"Ao mesmo tempo”, prossegue Yildirim, "eles precisam assegurar que a troca de informações em sua plataforma não gere violência nas ruas, não cause danos a indivíduos e prioridades e não acarrete prejuízos à democracia.”
Isso, contudo, é exatamente o que Trump vinha fazendo. "As redes sociais são a ferramenta mais eficiente para informar, motivar e mobilizar [os apoiadores]. Trump usou o Twitter com bastante eficiência de modo a informar ou, às vezes, desinformar, manipular e mobilizar sua base e expor pessoas das quais ele não gosta.”
Agravamento da polarização
Alguns usuários do Twitter reagiram ao banimento de Trump com sugestões de outros meios que ele pode utilizar para divulgar sua mensagem, como sinais de fumaça ou pombos-correios, por exemplo.
Marco Verweij observa que o presidente em fim de mandato poderá sempre optar por alternativas em mídias sociais que ganham popularidade, como o Rumble ou o Gab, utilizado pelo senador republicano Ted Cruz. Mas, se Trump o fizer, sua influência poderá se tornar ainda mais perigosa.
"Isso vai apenas reforçar a polarização”, diz o professor de Ciência Política da Universidade Jacobs, de Bremen. "Essas formas de mídia social são pouco ou nada reguladas.”
Yildirim também cogita que Trump possa se comunicar com seus apoiadores através de mensagens de vídeo. Atualmente, eles podem se inscrever em uma lista de e-mails do portal de internet do filho do presidente, Donald Trump Jr., onde ele afirma denuncia "censura” em letras capitais. "Se mantenham conectados [...] e recebam mensagens de Don Jr. e seus afiliados”, afirma o website
Debandada das mídias sociais tradicionais
Depois de o Twitter marcar mais e mais as postagens e repostagens de Trump com indicadores de conteúdo falso, contestado ou enganoso, a plataforma viu um êxodo de usuários simpatizantes do presidente. Outros gigantes da internet também notaram uma debandada.
Em comentários em um vídeo postado no canal do Youtube da Fox Business, de propriedade da emissora conservadora Fox News, os seguidores de Trump expressaram sua raiva contra o que entendem como censura por parte das chamadas Big Techs, como a Amazon, Facebook e o próprio Twitter.
O Facebook e o Youtube também baniram Trump de suas plataformas por tempo indeterminado. Os conservadores de direita se irritaram com a Amazon depois da suspensão imposta à rede social Parler de seus servidores, após o ataque ao Capitólio. A plataforma utilizada por apoiadores de Trump, teóricos da conspiração e extremistas de direita caiu na obscuridade.
Os especialistas, contudo, alertam que as plataformas de mídia social de nichos específicos, com menos restrições, estão em alta e contribuem para uma cultura cada vez maior de extremismo.
"Em espaços online onde todos podem assistir e observar indivíduos trocando informações, podemos antecipar, podemos antever o que deve estar por vir, afirma Yildirim.
"Estado oculto"
"Se esse grupos começarem simplesmente a se dividir em múltiplas plataformas ou criar alternativas offline, ou ainda irem para a clandestinidade, será muito mais difícil observá-los e identificar os danos ou violência que esse tipo de evento pode realizar.”
Verweij se preocupa que o banimento de Trump no Twitter tenha feito com que seus apoiadores se sintam justificados.
"O problema, é claro, é se as pessoas acreditarem que há um Estado oculto que persegue Trump, e que as elites comerciais, de Hollywood e do jornalismo, estão inflexivelmente contra ele, dessa forma, banindo-o. É claro que isso apenas reforça a crença dessas pessoas em um ‘Estado oculto'”, afirma.