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PolíticaVenezuela

Venezuela: EUA querem atitude do Brasil, mas Lula se esquiva

31 de julho de 2024

Os protestos contra a suposta fraude eleitoral na Venezuela aumentam e teme-se uma escalada. Enquanto isso, o Brasil tenta se manter neutro – apoiando, assim, a ditadura de Nicolás Maduro, opina Alexander Busch.

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Manifestante de braços abertos e com bandeira da Venezuela em suas costas durante protestos contra suposta fraude eleitoral no país latino-americano.
Protestos eclodiram de forma espontânea em várias cidadesFoto: Pedro Rances Mattey/Anadolu/picture alliance

A crise política se agravou na Venezuela após as suspeitas de fraude eleitoral cometida pelo governo de Nicolás Maduro no domingo (28/07). Nesse ínterim, os observadores eleitorais do Centro Carter confirmaram que não houve eleições democráticas. Protestos espontâneos eclodiram em várias cidades.

Segundo dados do governo, 750 manifestantes foram presos. Relatos não confirmados apontam ainda que 11 indivíduos já morreram. Os militares venezuelanos dizem que havia planos de golpe contra Maduro. A oposição, por outro lado, afirma que um líder da oposição foi sequestrado pelas forças de segurança.

As eleições na Venezuela passaram agora para o centro da geopolítica: entre os principais Estados do mundo, a vitória eleitoral de Maduro foi reconhecida até agora apenas por aliados da Venezuela, como China, Rússia e Irã. Na América Latina, como esperado, os governos de esquerda da Bolívia, Honduras e Cuba ficaram ao lado de Caracas.

Na esteira de críticas explícitas às eleições, a Venezuela rompeu relações diplomáticas com sete governos latino-americanos, incluindo Argentina, Chile e Peru.

Dois importantes países vizinhos, Brasil e Colômbia, não reconheceram a vitória eleitoral de Maduro, mas também não criticaram o processo eleitoral. Ambos os chefes de Estado estão mantendo a discrição. Aparentemente, querem deixar abertos os canais de comunicação com Caracas.

Por algum momento, houve rumores de que os governos de esquerda do Brasil, Colômbia e México emitiriam uma declaração conjunta sobre as eleições. Isso, no entanto, ainda não se concretizou. Não é de se espantar: em termos de política externa, os três governos não estão em sintonia.

"Não tem nada de grave, nada de anormal", disse Lula sobre eleição contestada na Venezuela. A oposição e o governo só têm opiniões diferentes e eles chegarão a um acordo na Justiça, minimiza Lula. "Se a ata estiver disponível e se for estabelecido que a ata é verdadeira, todos temos o dever de reconhecer o resultado das eleições na Venezuela".

Ligação de Biden para Lula

Uma outra tentativa de mediação no alto escalão também parece ter poucas chances de sucesso: na segunda-feira à noite, Washington anunciou que o presidente Joe Biden queria consultar Lula por telefone.

Em teoria, isto poderia fazer todo o sentido. "O papel dos Estados Unidos e dos seus aliados na América Latina e na Europa será crucial para uma coordenação multilateral mais forte", diz Geoff Ramsey, especialista em Venezuela do think tank Atlantic Council. Só assim, avalia, o governo de Caracas poderá ser persuadido a respeitar a vontade do povo e a restabelecer o direito fundamental dos venezuelanos de elegerem os seus dirigentes.

Mas não é nenhuma coincidência que tanto Biden quanto Lula tenham hesitado até agora em comentar sobre a Venezuela. Ambos têm suas razões.

Em ano de eleições, o governo americano quer minimizar os custos políticos de novas sanções contra a Venezuela. Durante o atual processo eleitoral no país latino-americano, os EUA inclusive aliviaram as sanções que haviam sido reforçadas por Trump em 2019 devido à fraude eleitoral no pleito anterior.

Agora, apesar da evidente fraude eleitoral, Washington hesita em endurecer novamente as sanções. Um novo isolamento econômico da Venezuela, exportadora de petróleo, poderia levar ao aumento dos preços da gasolina e a uma nova onda de refugiados na fronteira sul dos EUA. Isso seria fatal para Kamala Harris, a provável candidata democrata, especialmente porque, como vice-presidente, ela a responsável pela política de refugiados nos EUA.

Por isso também o regime antecipou tão inesperadamente, dois meses atrás, as eleições que deveriam transcorrer em dezembro, depois das americanas. Sob o governo recém-eleito em Washington, possivelmente Maduro tinha bem menos razões para contar em ser poupado por motivos de política interna.

Lula também está sob pressão política interna: o Partido dos Trabalhadores (PT) já comemorou a "vitória eleitoral" de Maduro. O próprio Lula tem defendido repetidamente Maduro como um democrata, e só nos últimos dias apelou à realização de eleições limpas e à aceitação do resultado. Maduro reagiu com indignação à repreensão ao Brasil.

A oposição em Caracas tem agora grandes esperanças de que Lula use a sua influência como potência regional sul-americana para persuadir Maduro a fazer concessões. "A posição de Lula em relação a Maduro e à Venezuela é importante", afirma Roberto Patiño, político da oposição venezuelana. "Ele tem grande influência sobre a esquerda na América Latina".

No entanto, as chances de sucesso parecem escassas. Afinal, uma ação coordenada com os EUA seria um tabu absoluto para Lula e para o seu mais importante conselheiro de política externa, Celso Amorim. A esquerda latino-americana jamais aceitaria a interferência dos EUA em assuntos internos.

Mesmo antes da conversa com Biden, Lula já havia dito, referindo-se aos EUA: "Acho que é preciso acabar com a ingerência externa nos outros países", enfatizou. "A Venezuela tem o direito de construir seu modelo de crescimento e desenvolvimento sem que haja um bloqueio. Um bloqueio que mata Cuba há 70 anos, que penaliza o Irã, a Venezuela", acrescentou.

No final, os dois presidentes conseguiram chegar a acordo que não compromete a reputação de nenhum deles: "Os dois líderes compartilharam a perspectiva de que o resultado da eleição venezuelana representa um momento crítico para a democracia no hemisfério e se comprometeram a permanecer em estreita coordenação sobre a questão".