Escândalo na Fifa
31 de maio de 2011A poucas horas da eleição para a presidência da Fifa, aumenta a pressão sobre o atual detentor do cargo, Joseph Blatter, de 75 anos, candidato a um quarto mandato. Nesta terça-feira (31/05) as federações de futebol de Inglaterra e Escócia pediram o adiamento da eleição, e patrocinadores de alto nível da entidade se mostraram preocupados com a crise.
Os ingleses exigiram o adiamento do pleito, agendado para esta quarta-feira, em face das acusações de corrupção. Eles solicitaram também às federações de outros países que façam o mesmo, no que foram atendidos pelos escoceses. Tradicionais patrocinadores de eventos da Fifa, como a companhia aérea Emirates, a empresa de cartão de crédito Visa, além de Coca-Cola e Adidas, divulgaram comunicados expressando preocupação e cobrando o rápido esclarecimento das acusações.
Denúncias acabam sob o gramado
Acusações de corrupção e denúncias de suborno existem há décadas dentro da Fifa, mas nunca chamaram tanto a atenção. No mais tardar a partir dos acontecimentos dos últimos dias, até o torcedor mais ingênuo se dá conta que, para os responsáveis pela Fifa, o mais importante não é o futebol e sim seus próprios interesses.
Entretanto, ninguém se atreve ainda a mostrar o cartão vermelho ao presidente Joseph Blatter e aos membros do comitê executivo da entidade. Pois os envolvidos participaram, eles mesmos, de uma ou de outra forma de um escândalo menor ou maior e até agora sempre conseguiram varrer tudo para debaixo do gramado.
A esperança é que, no maior escândalo da história de 107 anos da Fifa, a pressão do público se torne tão grande que alguém acabe confessando. Ou que alguém se sinta ofendido tão profundamente que venha a confessar suas práticas irregulares para prejudicar outra pessoa.
Esta poderia ser o vice-presidente da organização, Jack Warner, que anunciou um "tsunami no futebol". Ele afirmou no domingo (29/05), após ser suspenso provisoriamente, que o presidente Joseph Blatter fez à associação de Warner (a Concacaf, Confederação de Futebol da América do Norte, Central e Caribe), em maio, "a doação de um milhão de dólares (o equivalente a quase 700 mil euros) para livre utilização".
Além disso, Warner apresentou um e-mail de Jérôme Valcke, secretário-geral da Fifa, em que Valcke insinua que o Qatar poderia ter comprado a Copa do Mundo de 2022. Em uma entrevista coletiva prevista para esta terça-feira, quatro membros do comitê executivo seriam acusados de ter recebido um total de 20 milhões de dólares em subornos pela escolha do Qatar como sede da Copa do Mundo de 2022. A coletiva acabou não acontecendo por motivos não totalmente esclarecidos até a tarde de terça-feira.
Crise? Que crise?
Na coletiva à imprensa, seriam citados os nomes de quatro dos 24 membros comitê executivo. Os acusados seriam o vice-presidente sênior, Julio Grondona (Argentina), o vice-presidente Issa Hayatou (Camarões) e os dois membros, Nicolas Leoz, do Paraguai, e Rafael Salguero (Guatemala). Além disso, documentos e contas bancárias seriam divulgados para provar os fluxos de dinheiro.
Na segunda-feira, em uma entrevista coletiva, foi possível perceber que o presidente da organização estava nervoso. "Crise? Que crise?", desconversou Blatter, se recusando a responder mais perguntas dos jornalistas e se retirando do local. Se apenas um destes casos de corrupção fosse realmente tornado público, a Fifa teria uma grande oportunidade para fazer reformas, podendo se livrar de membros acusados de corrupção e trabalhar de forma mais transparente. Mas é improvável que, de fato, seja possível provar que membros da Fifa cometeram violações do código de honra.
Acusações sem consequências
Já houve algumas tentativas no passado de levar os executivos da Fifa à Justiça e todas falharam. O exemplo mais proeminente é envolve a então agência de direitos esportivos ISL, que surpreendentemente conseguiu arrematar os direitos de televisão e marketing para as copas de 2002 e 2006. Há muitos anos, são conhecidas as acusações de que, entre 1989 e 2001, milhões de dólares teriam sido pagos a alguns membros da Fifa para possibilitar o negócio.
Mas a Fifa logo retornou a seus afazeres cotidianos e fechou o inquérito sobre a ISL ano passado, sem fornecer maiores detalhes sobre as investigações. O próprio Blatter foi "inocentado de qualquer comportamento irregular". Como agora, quando a comissão de ética da entidade apurou no fim de semana, em apenas dois dias, e absolveu seu presidente rapidamente de todas as acusações.
Blatter, rei-sol
Parece que nada atinge o presidente da Fifa. Talvez porque o dirigente, de 75 anos, tenha poder como poucas pessoas no mundo. Ele domina o esporte mais popular do planeta. Em todo o mundo, mais de 270 milhões de pessoas jogam futebol ativamente, o número de torcedores é muito maior. Blatter é o chefe da maior organização esportiva mundial, com 208 federações filiadas. São 16 membros a mais do que a ONU. Não é de se admirar que o suíço seja cortejado por chefes de governo, reis e ditadores.
Sem fins lucrativos
Além disso, a Fifa, como organização sem fins lucrativos que diz ser, é difícil de ser cobrada juridicamente. Mas mesmo este status deveria ser questionado publicamente. Nunca antes a Fifa ganhou tanto dinheiro como no ano passado, com a Copa do Mundo de 2010, na África do Sul.
A entidade arrecadou 1,93 bilhão de euros, 20% a mais que quatro anos atrás, na Alemanha. Além disso, a Fifa conseguiu da África do Sul que os lucros da entidade não sofressem descontos fiscais, enquanto o país que acolheu os jogos ficou com um buraco financeiro de quase 2,5 bilhões de euros. Enquanto organização sem fins lucrativos, a Fifa não paga imposto na Suíça, onde fica sua sede.
Que a Fifa não é uma instituição sem fins lucrativos é evidente. Os tão propagados projetos sociais da entidade não chegam a perfazer 123 milhões de euros, de acordo com uma ONG suíça. Ao mesmo tempo, Joseph Blatter e os outros altos executivos da Fifa ganharam bônus de 41 milhões de euros nos últimos dois anos.
Autora: Sarah Faupel (MD/rtr)
Revisão: Roselaine Wandscheer