Alemanices: O intrigante sinal vermelho
16 de junho de 2017A placa do outro lado da rua avisa: "Atravesse apenas no verde, seja um exemplo para as crianças." A impaciência aumenta, já se passaram três minutos e nada de o rote Ampel (sinal vermelho) mudar para verde, permitindo que os pedestres possam atravessar a rua sem olhar algum de reprovação.
Não importa se não há nenhum veículo por perto, se o sinal de pedestres está fechado há muito tempo, ou até se é madrugada e as temperaturas estão negativas. Na Alemanha, os pedestres costumam respeitar a sinalização. E o motivo é mesmo dar exemplo para as futuras gerações, respeitar as mais velhas e garantir a segurança de todos.
No meu impulso de paulistana, já atravessei a rua muitas vezes com o sinal de pedestres fechado por aqui, e sempre fui repreendida por não seguir as regras do trânsito. Já ouvi de um senhor que aguardava pacientemente o sinal abrir do outro lado: "Você é cega? Não vê que o sinal está fechado?" Já recebi olhares tão desconcertantes de reprovação de pais com crianças que percebi como é importante respeitar o intrigante rote Ampel.
De acordo com as regras do trânsito alemão, as pessoas só podem atravessar a rua na faixa de pedestres ou nas áreas onde há semáforos de pedestres. A multa para quem é pego cruzando no vermelho é de cinco a dez euros.
Em cidades do Leste alemão, os semáforos têm o formato do Ampelmännchen, o "homenzinho do semáforo", que é um dos símbolos de Berlim. Em Dresden, na Saxônia, os semáforos ganharam uma versão feminina: a Ampelfrau.
Os motoristas, em geral, respeitam a faixa de pedestres. Ao ver um pedestre na calçada, eles imediatamente reduzem a velocidade, mesmo que a pessoa não dê sinais claros de que pretende atravessar. Com ciclistas, a prudência também é grande. Os carros não ultrapassam ciclistas em ruas estreitas. Eles seguem atrás em velocidade reduzida até que haja espaço suficiente para seguir o trajeto.
Se for a primeira vez que você visita a Alemanha ou acabou de chegar para uma longa jornada no novo país, não estranhe ver dezenas de pessoas enfileiradas em frente ao sinal vermelho esperando pacientemente a luzinha ficar verde, mesmo com a rua vazia.
No começo pode não fazer nenhum sentido, mas, na Alemanha, regras, precaução e segurança nunca ficam em segundo plano. O jeito é desacelerar, apertar o botão para liberar o sinal e testar sua paciência.
Depois de um tempo, você acostuma. E, quando for para outros países ou cidades grandes onde é comum cruzar a rua a qualquer momento, vai talvez titubear na hora de atravessar com o sinal vermelho. Depois de um tempo, é inevitável não incorporar as "Alemanices".
Na coluna Alemanices, publicada às sextas-feiras, Karina Gomes escreve crônicas sobre hábitos alemães, com os quais ainda tenta se acostumar. A repórter da DW Brasil e DW África tem prêmios jornalísticos em direitos humanos e sustentabilidade e vive há três anos na Alemanha.