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Agronegócio pede combate a queimadas e desmatamento ilegal

30 de agosto de 2019

Preocupados com crise de imagem do Brasil, representantes do setor afirmam que país está sendo "vilanizado", se distanciam de práticas ilegais e pedem mais comunicação e ações efetivas por parte do governo Bolsonaro.

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Vista aérea de área desmatada para uso agrícola no Mato Grosso, em foto de 2013
Vista aérea de área desmatada para uso agrícola no Mato Grosso, em foto de 2013Foto: picture-alliance/Demotix/K. Hoffmann

A crise diplomática provocada pelo aumento do desmatamento e das queimadas na Amazônia, potencializada por declarações do governo Jair Bolsonaro, já dá sinais de que o agronegócio brasileiro pode acabar prejudicado.

A VF Corporation, que controla marcas de vestuário, bolsas e calçados como Timberland, Kipling e Vans, suspendeu as importações de couro brasileiro até estar segura de que o material não contribui para a degradação ambiental.

A Mowi, maior produtora mundial de salmão, anunciou que cogita suspender a compra de soja brasileira, usada para alimentar os peixes, se o Brasil não combater o desmatamento ilegal na Amazônia.

Nesta quarta-feira (28/08), a ministra da agricultura da Alemanha, Julia Klöckner, se juntou aos governos da França e da Irlanda em ameaças ao acordo de livre- comércio entre a União Europeia e o Mercosul, que ainda precisa ser ratificado pelos países do bloco europeu, se o Brasil violar compromissos de manejo florestal sustentável.

Entidades do agronegócio brasileiro e especialistas no setor ouvidos pela DW Brasil concordam que há uma crise de imagem prejudicial ao país e à reputação de produtores regularizados e comprometidos com o Código Florestal. Para superá-la, eles dizem que o governo deve combater o desmatamento e as queimadas ilegais e ser capaz de se comunicar melhor com atores internos e externos.

Luiz Cornacchioni, diretor executivo da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), afirmou à DW Brasil que a entidade está olhando "com cuidado" para a questão.

"Precisamos de ações efetivas para reduzir o desmatamento e as queimadas ilegais, que são o motivo dessa confusão dos últimos dias. O governo tem os mecanismos legais, de fiscalização e de controle para isso", diz. "Já começou a ter um reflexo no setor de couros, por isso precisamos agir para que isso não viralize para outros setores."

Ele estima que ações ilegais são responsáveis por "95% a 97%" da crise das últimas semanas. "O grande problema que estamos vivendo é desmatamento ilegal e grilagem de terra. Tem que demonstrar para a sociedade que esse é o problema, e em paralelo os órgãos competentes precisam mostrar que estão tomando medidas para coibir."

Questionado sobre o papel da gestão Bolsonaro na crise, Cornacchioni disse que "no atual governo talvez tenha ficado mais explícito que temos que criar uma ação efetiva para reduzir o desmatamento e as queimadas ilegais".

Ele compara essas atividades a elos de cadeias criminosas. "É como combater o tráfico de drogas e armas. Se começa a afrouxar, cria problemas. Precisa atuar na cadeia toda e aplicar todos os mecanismos", diz.

Ao considerar que, de 2004 a 2012, o desmatamento na Amazônia estava em queda e então voltou a subir, ele afirma: "Talvez a gente tenha que olhar as ações que vínhamos fazendo e retomá-las de maneira rápida."

A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), por sua vez, divulgou nota em que "repudia qualquer prática que possa incorrer no desmatamento ilegal ou em queimadas".

"A briga é econômica"

Bartolomeu Braz Pereira, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), afirmou à DW Brasil que o desmatamento em áreas ilegais tem que ser combatido e punido pelo governo. Ele considera, no entanto, que o "alarme" atual em torno do tema é desnecessário e um "problema de mídia".

"Alguns pontos sobre esse tema foram entendidos errados, pela forma como foram colocados. [...] Os ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura têm que conversar mais com a sociedade", diz.

No momento, ele não vê risco de grande impacto nas exportações brasileiras, por considerar que o agronegócio está estabelecido em áreas legais. Para ele, a reação durante a recente cúpula do G7, que incluiu críticas contundentes do presidente da França, Emmanuel Macron, está relacionada mais a disputas comerciais do que à preocupação com o meio ambiente.

"Essa briga toda é econômica, por interesses de cada país", afirma. "O produtor da Europa não tem competitividade, o Macron viu uma oportunidade nessa questão das queimadas, e a imprensa tornou esse fato muito forte", diz.

Falta de comunicação

Roberto Rodrigues, que foi ministro da Agricultura de 2003 a 2006 e hoje é coordenador do Centro de Agronegócio da FGV-EESP, acredita que a crise será resolvida com esclarecimentos do governo.

"A agricultura profissional brasileira é sustentável e não aceita desmatamento ilegal ou incêndios criminosos, e defende a punição para quem cometer tais delitos. Só não vê isso quem não quer ver ou quem está mal informado", diz. Ele afirma que o "incidente" será superado, "a não ser que prevaleçam interesses comerciais menores".

Já Marcos Jank, professor de agronegócio global do Insper, afirma que a percepção internacional sobre desmatamentos e incêndios na Amazônia tem potencial para impactar as exportações. "A luz vermelha se acendeu nessa crise, que é essencialmente uma crise de comunicação", disse à DW Brasil.

Segundo ele, o governo tomou atitudes nos últimos meses que levaram a uma percepção de que o desmatamento estava fora de controle, o que, segundo ele, não é verdade. "[O problema] é o desmatamento ilegal, não é ligado ao agronegócio moderno, regularizado. E a ilegalidade é forte no meio do ano, quando é mais fácil de queimar", diz.

Jank afirma que o maior risco é quanto a exportações para países europeus, já que, segundo ele, governos ou grandes compradores podem elevar o rigor das certificações exigidas.

Ele vê pouco espaço para um boicote liderado por consumidores, pois 95% do que o agronegócio brasileiro exporta entra em outras cadeias produtivas no exterior, como o caso da soja que vira ração e o algodão na indústria têxtil. "Não há produtos brasileiros identificados como tal nos supermercados, com raríssimas exceções, talvez o café", diz.

Para evitar prejuízos, ele defende que a gestão Bolsonaro exercite o diálogo com o público interno e com outros países. "Faltou a esse novo governo explicações mais detalhadas sobre como as coisas estão sendo conduzidas nesse ciclo. É natural que, numa democracia, haja novas políticas, mas elas têm que ser explicadas melhor. E tem que continuar o combate ao desmatamento ilegal", diz.

"Estamos sendo vilanizados"

Jank, assim como os representantes das associações ouvidos pela DW Brasil, afirma que o Código Florestal brasileiro é um dos "mais rigorosos" do mundo, ao estabelecer áreas de preservação obrigatória dentro das propriedades rurais, que varia de 20% a 80% dependendo do bioma.

"É uma pena que estamos sendo vilanizados, pois há situações muito piores do que a do Brasil mundo afora", diz.

Em 2018, as exportações do agronegócio brasileiro somaram quase 102 bilhões de dólares (422 bilhões de reais), um recorde histórico, e representaram 42,4% das vendas externas naquele ano. O setor foi responsável pelo superávit da balança comercial registrado nos últimos quatro anos. O agronegócio responde por cerca de 22% do PIB (Produto Interno Bruto) e suas atividades ocupam cerca de 30% do território brasileiro, segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

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