Acionistas exigem proteção contra fraudes na bolsa
4 de agosto de 2002Nem todas as baixas nas bolsas de valores são motivadas por crises financeiras, como a que afeta o Brasil. Se o desaquecimento da conjuntura não propiciou bons negócios nos mercados financeiros dos EUA e Europa, o que afetou gravemente a confiança dos investidores foram os balanços forjados, manipulações econômicas e falsas informações que culminaram na falência de várias grandes empresas, Enron, Worldcom e Qwest, entre elas.
Na Alemanha, os acionistas saíram prejudicados com falências espetaculares como a da EM.TV ou da Infomatec. As queixas se voltam agora contra a prestadora de serviços financeiros MLP, de Heildeberg, suspeita de haver apresentado lucros bem além da realidade. Mas neste contexto não se pode esquecer que a Deutsche Telekom também deu um exemplo de "contabilidade criativa", ao superestimar o valor do seu setor de imóveis no ano passado. Esse não foi, contudo, o único motivo da gigantesca desvalorização das suas ações, que queimou o patrimônio de milhares de acionistas.
Crise de confiança afastou 25% dos investidores da bolsa
Somente maiores direitos para os investidores e controles mais severos de empresas e auditores farão com que acabe a crise de confiança, segundo Klaus Schneider, presidente da Associação de Proteção aos Acionistas (SdK), sediada em Frankfurt. Se não forem tomadas providências, mais pessoas irão virar as costas à Bolsa de Valores. Depois de chegar ao auge em 2000, o número de acionistas caiu 25%. Atualmente, 11,6 milhões de alemães possuem ações, 18% da população acima de 14 anos. Desde 2000, o Mercado Novo, segmento das firmas de tecnologia avançada e internet na Bolsa de Frankfurt, perdeu 70 firmas, aproximadamente a metade, através de falências. Cerca de 90% dos balancetes de firmas do Mercado Novo apresentam falhas, reclamou Schneider.
Abaixo a ganância e a mentira
Os auditores muitas vezes não fazem bem seu trabalho e os conselhos administrativos não conseguem controlar a diretoria das empresas. Mas também sobrou para os executivos: "A ganância dos altos executivos é mais uma causa da crise de confiança. O mais criticável são os programas de opção de compra de ações para a diretoria. A DaimlerChrysler, por exemplo, reservou ações no volume de 3 bilhões de marcos para seus executivos", um exagero segundo Schneider, que não deixa por menos: "Os salários dos diretores é outro tema escabroso. Afinal, não tem cabimento o diretor de uma grande empresa com ações na bolsa ganhar um salário 40 vezes superior ao do chanceler federal." O salário da diretoria do Deutsche Bank aumentou 83% em média em cada um dos últimos três anos, embora tenham diminuído os lucros e os dividendos do capital próprio. "A moral tem que se impor sobre a ganância", exige a Associação de Proteção ao Pequeno Acionista, diante dessas práticas.
O comportamento de muitos analistas também contribuiu para agravar a crise de confiança no mercado. Principalmente nos EUA, alguns propagaram notícias em proveito próprio e em prejuízo dos investidores, como divulgar grandes encomendas inexistentes. Para avaliar a situação das empresas, na hora de comprar ações, os investidores consultam as declarações das empresas e os comentários dos analistas e precisam confiar no que lêem.
Leis obsoletas na Alemanha e nova lei nos EUA
O sistema vigente na Alemanha para o controle das empresas também se mostrou ineficaz. As atuais leis para os mercados financeiros datam, em grande parte, do início do século passado, reclamou Schneider, lembrando a nova lei aprovada nos EUA. Crimes econômicos e fraudes em balancetes estão sujeitos a penas de até 20 anos de prisão a partir de agora. "Esta lei sinaliza aos funcionários que não se tolera mais o uso de práticas desonestas para forçar artificialmente a valorização de ações, o que, afinal, acaba levando à ruína da firma, à perda do emprego e da aposentadoria", disse o presidente norte-americano George W. Bush. Será criado um órgão independente para fiscalizar balancetes. Lucros obtidos ilegalmente terão que ser devolvidos aos investidores.
"O melhor controle de uma empresa continua sendo o temor de ser processada", afirmou Harald Petersen, especialista em questões jurídicas da associação. Como as leis alemãs são antiquadas, o pequeno acionista praticamente não tem como impor seus direitos, pois não pode responsabilizar a diretoria por falsas informações. Essa seria outra alteração a ser feita na lei, para que a diretoria possa ser responsabilizada pelos danos que causar a terceiros. Como "processar significa jogar mais dinheiro fora na tentativa de recuperar o que se perdeu nas manipulações", e diante dos altos custos dos processos, a SdK também exige que sejam permitidas queixas coletivas, como nos Estados Unidos.