Acabou! Chega! Depois de muitas fake news, muita gritaria nas redes sociais e de muito medo de pessoas armadas fazendo loucuras, o Brasil se livrou de um incendiário para respirar novamente. O país elegeu um presidente que busca a paz, a pacificação, a volta ao normal.
Parece uma viagem no tempo: vejo as imagens da Avenida Paulista tomada por apoiadores de Lula, festejando sua terceira eleição. Em 2002 e 2006, estive na Paulista para ver a festa das vitórias de Lula. Eram tempos de esperança, de ventos novos e fortes.
Depois, estive nas manifestações de junho de 2013, quando o PT de Dilma começou a perder a rua. E estive em 2015 e 2016, quando a massa verde e amarela pediu a cabeça de Dilma. Ah, também vi o boneco inflável de Bolsonaro na Paulista. Agora o boneco broxou, e o PT retomou a Paulista.
Voltamos para o final do ano de 2010, com o terceiro mandato de Lula. Será? Parece que os anos de 2011 a 2022 foram uma década perdida. E dolorosa demais. As manifestações de 2013, o 7 a 1 de 2014, a tempestade perfeita de 2015 e 2016, os anos Temer, a Lava Jato e a prisão de Lula. E o mandato de Jair Messias, com as florestas queimando, o desprezo pelo coronavírus, a escalada armamentista e as ondas de fake news.
Acordamos agora de um pesadelo? Não, foi tudo real. Quantas experiências horríveis, quanta desgraça, quantas brigas. Mas agora chega. Agora o Brasil volta a ter relações normais com o resto do mundo e consigo mesmo. Espero.
E o Brasil volta a proteger os indígenas e as florestas. Volta a ter uma política para a cultura. Volta a priorizar livros e não armas. Volta a valorizar universidades e não quartéis.
Para isso, o Brasil se livrou da extrema direita, como os Estados Unidos fizeram há dois anos ao eleger Joe Biden. Temos a sorte que os pesadelos acabaram mais cedo do que o previsto. Pois nunca antes um presidente havia perdido a reeleição. Agora perdeu, mesmo abusando da máquina governamental.
Mas, para livrar o país, Lula precisou de mais de 60 milhões de votos. Bolsonaro, por sua vez, juntou mais de 58,2 milhões de votos, uma imensidão. Foi por pouco – 2 milhões de votos – que o Brasil escapou de mais uma tragédia. Imaginem!
Foram os pobres e as mulheres, a maioria deles do Nordeste, que salvaram a democracia brasileira. Não vamos esquecer disso. E não vamos esquecer que é um homem condenado em processos duvidosos e sem provas concretas, que teve que passar 580 dias na prisão, que agora estende a mão para pacificar o país. Isso é de uma grandeza impressionante.
Enquanto isso, do Palácio do Planalto em Brasília, sai um silêncio estarrecedor. Nenhuma palavra, nem a ligação obrigatória para dar os parabéns para o vencedor. Nem para uma saída digna serve. Mas vai acabar logo, no 1º de janeiro o Brasil volta ao normal. Espero que os incendiários larguem os fósforos e baixem as armas. Chega dessa loucura.
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Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.
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