Abate de visons gera crise política na Dinamarca
19 de novembro de 2020A primeira-ministra da Dinamarca, Mette Frederiksen, foi alvo na quarta-feira (18/11) de pedidos de renúncia por parte da oposição por causa de uma ordem que determinou o abate de todos os 17 milhões de visons em criadouros no país. No início do mês, o governo ordenou a erradicação desses mamíferos usados na indústria de peles após relatos de que eles carregavam uma mutação do coronavírus Sars-Cov-2, algo que poderia ameaçar o desenvolvimento de vacinas.
O problema é que o governo não tinha base legal para aplicar a medida em todo o território, apenas nas áreas afetadas. Na semana passada, o próprio ministro da Agricultura, Mogens Jensen, admitiu que a ordem não estava amparada em mecanismos legais. Na quarta-feira, ele apresentou sua renúncia ao cargo.
"Não tenho mais o apoio necessário dos partidos no Parlamento", disse Jensen, em entrevista à rede de TV DR. "Devo apresentar minha renúncia."
Após a queda do ministro, a oposição pediu que a primeira-ministra seguisse o mesmo caminho, ampliando a crise política. "Quero que a primeira-ministra faça o mesmo", disse o líder da oposição Jakob Elleman-Jensen, do Partido Liberal. "Quero que a primeira-ministra reconheça que, quando cometer um erro, a responsabilidade é dela." Elleman-Jensen foi apoiado por outros partidos da oposição, incluindo o Partido do Povo Dinamarquês.
Outros parlamentares dinamarqueses afirmaram que desejam a instauração de uma investigação independente para determinar se o governo infringiu a lei de forma deliberada.
Após a medida ser denunciada como ilegal, aliados do governo tentaram aprovar um projeto de lei de emergência, mas a primeira tentativa falhou. Foi só no início desta semana que o governo conseguiu aprovar a legislação necessária, por uma pequena maioria, após milhões de animais já terem sido abatidos.
Anteriormente, as autoridades de saúde da Dinamarca disseram que a indústria de visons representava um risco para a saúde pública no país devido aos surtos generalizados em fazendas. Também apontaram que vários animais estavam infectados com uma cepa de vírus mutante.
Maior produtor global de visons, usados em casacos de pele, o país nórdico já havia abatido animais de fazendas anteriormente por causa de infecções pelo vírus, mas os surtos persistiram. A pressão para erradicar todos os animais aumentou após os relatos da mutação.
As autoridades acabaram enviando militares e policiais para ajudar os 1.100 criadores de visons da Dinamarca com o abate. O país tem entre 15 milhões e 17 milhões desses animais. Até o momento, 10,2 milhões já foram mortos em toda a Dinamarca. Antes da crise, a Dinamarca era responsável por 40% da produção global de visons.
Também surgiram dúvidas sobre o potencial risco da mutação sobre o desenvolvimento de vacinas. Anthony Fauci, o principal membro da força-tarefa de combate à pandemia nos Estados Unidos, disse que a mutação detectada no vison dinamarquês não compromete as vacinas. Já o Centro Europeu para Prevenção e Controle de Doenças apontou que a mutação poderia atrapalhar, mas salientou que ainda há "alta incerteza" em relação ao tema e que "mais investigações são necessárias".
Diante da crise, a confiança dos dinamarqueses no governo despencou, de acordo com um levantamento da Universidade Aarhus. A pesquisa apontou que pouco mais da metade da população afirmou confiar no governo. Em julho, a taxa era superior a 75%.
Ainda na quarta-feira, as autoridades de saúde dinamarquesas afirmaram acreditar que a mutação do novo coronavírus encontrada em vários visons foi erradicada.
"Nenhum outro caso da mutação em visons Cluster 5 foi detectada desde 15 de setembro, razão pela qual o instituto encarregado de doenças infecciosas (ISS) acredita que essa mutação está provavelmente extinta", declarou o Ministério da Saúde dinamarquês num comunicado, anunciando o levantamento das restrições na região afetada do país.
Casos em outros países
A Dinamarca não foi o primeiro país a tomar essa medida drástica contra os visons. A Holanda e a Espanha também já abateram milhares desses animais por preocupações semelhantes. Em agosto, a Holanda, depois de abater dezenas de milhares de visons, resolveu banir por completo a criação para a indústria de peles, após o registro de vários focos de infecção em criadouros.
Em maio, as autoridades holandesas já tinham decidido proibir o transporte de peles de visons em todo o país, depois que dois trabalhadores de um criadouro teriam contraído o coronavírus por meio desses pequenos animais.
Em julho, quase 100 mil visons em uma fazenda no nordeste da Espanha foram sacrificados depois que muitos deles testaram positivo para o coronavírus. Um surto na província de Aragão foi descoberto depois que a esposa de um funcionário de um criadouro contraiu a doença em maio.
Vison ou marta é a designação comum a várias espécies de mamíferos mustelídeos, que se assemelham às doninhas da América do Norte.
JPS/dw/lusa/ots