A tragédia dos botos mortos no Amazonas
Mais de 150 animais morreram nas últimas duas semanas em Tefé, no interior do Amazonas. Pesquisadores ainda analisam os botos em buscas de respostas.
Boto morto é inspecionado
Biólogas, veterinárias e oceanógrafos inspecionam um boto de 150 kg morto recentemente e chegado em bom estado ao centro remoto de pesquisas montado pelo Instituto Mamirauá numa praia às margens do lago Tefé, na cidade amazonense localizada a 500 km de Manaus. A morte há menos de 24 horas comprova que os cetáceos continuam perdendo a vida na região, apesar de o pior já ter passado.
Botos mortos no leito seco do lago
Ao todo, mais de 150 botos já morreram na região de Tefé, 70 deles somente no último dia 28 de setembro, tornando-os as maiores vítimas, entre os grandes animais, da seca histórica deste ano na Amazônia. Todos os animais vitimados são recolhidos, e dependendo do grau de decomposição, são descartados ou encaminhados para necropsia, feita nas margens do lago.
Sem explicação para o fenômeno
Todo animal estudado é medido, pesado e tem partes da pele, órgãos, sangue, dentes e outros tecidos levados para análise laboratorial. Cientistas vindos de todo o país buscam entender por que tantos animais vêm morrendo na cidade. A temperatura da água, próxima dos 40ºC, é uma das principais suspeitas, mas não explica por completo o fenômeno.
Volta da chuva
Após duas semanas, na sexta-feira (06/10) voltou a chover em Tefé, reduzindo a temperatura da água de 37ºC para 26ºC. No dia anterior as águas alcançaram quase 40ºC, criando um ambiente perfeito para a proliferação de algas e outros contaminantes que podem estar por trás das mortes em massa dos botos. Ao longo de um mês foram 121mm de chuva na cidade.
Capacidade de julamento dos botos afetada?
Águas quentes e rasas são sopa de contaminação, na avaliação da oceanógrafa Miriam Marmontel, coordenadora do Grupo de Pesquisa em Mamíferos Aquáticos Amazônicos do Instituto Mamirauá e que há 25 anos estuda os botos. Ela questiona se algo afetou a capacidade de julgamento dos animais que, em vez de fugirem para águas frias e fundas ao longo do Solimões, permanecem "cozinhando" perto da cidade.
Urubus como sinal
Ao longo de todo o lago urubus espreitam os restos dos botos, cujas retirada das carcaças foi concluída somente nesta sexta-feira. Nas enseadas que se formaram por conta da redução do nível das águas do rio Solimões, urubus se reúnem para comer os restos mortais dos animais, servindo até mesmo de sinal para que os veterinários localizem uma nova vítima do desastre.
Exame de sangue
A veterinária Claudia Sacramento coleta sangue do boto diretamente do coração do animal morto há menos de 24 horas. Funcionária da Fiocruz, Sacramento veio do Rio para compor a força-tarefa comandada pelo ICMBio junto ao Instituto Mamirauá. O sangue passará por uma série de exames em busca de infecções, parasitas e outras possíveis causas.
Imagens chocantes mesmo para profissionais
Apesar de toda a preparação profissional, as cientistas responsáveis pela necropsia dos animais dizem sofrer com o cenário vivido. "Você nunca estará preparado de fato para algo assim. Estudamos para tentar mantê-los vivos o máximo de tempo, e de forma muito repentina vimos o contrário, nos deixando impotentes", comenta a mexicana Hilda Chávez, comandante da operação de emergência.
Qualidade das águas em xeque
Os botos amazônicos estão no topo da cadeia alimentar dos rios da floresta, e deste modo se tornam indicadores sensíveis da qualidade das águas e de problemas ambientais em todo o bioma. Daí a importância dada ao estudo da mortandade grave e inédita, que pode dar sinais de que algo ainda mais grave que a redução dos níveis da águas vem ocorrendo, como a floração de uma alga rara.