A importância de Kherson, porta de entrada da Crimeia
11 de novembro de 2022A Rússia capturou toda a região de Kherson durante os primeiros dias da invasão da Ucrânia. A resistência militar foi mínima, e a capital da província, com 280 mil habitantes, foi ocupada no início de março.
Imagens de vídeos amadores mostravam civis ucranianos, a maioria dos quais fala o idioma russo, protestando contra as tropas invasoras. Nenhuma outra região foi ocupada com tanta rapidez. Ainda não está claro como isso foi possível. Esta continua sendo uma questão dolorosa para o governo em Kiev.
A região de Kherson se estende por 28,5 mil quilômetros quadrados, uma área quase do tamanho da Bélgica. A paisagem é caracterizada por estepes – espaços abertos que vão tão longe quanto a vista pode alcançar.
Considerada de importância estratégica, a região pode ser tida como a de maior relevância no sul ucraniano, devido ao acesso a dois mares: o Mar de Azov, a leste, e o Mar Negro, a oeste.
Porta de entrada
Ainda mais importante é o fato de a região de Kherson possuir a única conexão por terra com a Crimeia. É a porta de entrada da península anexada pela Rússia em 2014 – entrada esta que permaneceu amplamente aberta durante a invasão russa.
As pontes de acesso não foram destruídas, o que poderia ter bloqueado o acesso de tropas. As numerosas unidades militares russas na Crimeia puderam avançar centenas de quilômetros rumo ao norte.
O principal objetivo da Rússia era, provavelmente, ganhar o controle do Canal do Norte da Crimeia, que começa próximo à cidade de Nova Kakhovka, a 80 quilômetros a leste de Kherson, e termina na cidade de Kerch, no interior da península.
A Crimeia sofre uma escassez crônica de água. Mesmo durante a era soviética, era abastecida pelo rio Dnipro através desse canal. Em seguida à anexação, a Ucrânia fechou essa via fluvial, o que gerou problemas para as atividades de agricultura da península. Em reação, a Rússia explodiu uma barragem erguida em 2014, restaurando o fluxo de água para a região.
Ao ocupar Kherson e outras cidades ao norte da foz do rio Dnipro, o exército russo conseguiu simultaneamente bloquear um importante acesso da Ucrânia ao Mar Negro.
Estaleiros e melancias
Kherson é conhecida por sua indústria naval. A cidade, na foz do Dnipro, foi fundada no final do século 18, quando a região se tornou parte do Império da Rússia. Seu nome advém do antigo assentamento grego de Quersoneso, na Crimeia.
A cidade possui o porto marítimo mais antigo da costa ucraniana, onde foram construídos os primeiros navios da frota russa do Mar Negro. Desde a era soviética, Kherson se especializou na produção de embarcações comerciais civis, como petroleiros.
Em fevereiro de 2022, dias antes da invasão russa, o estaleiro local anunciou que havia firmado um contrato para a construção de quatro navios cargueiros para a Holanda.
Quando os ucranianos pensam em Kherson, no entanto, a primeira coisa que lhes vem à cabeça não são os navios, mas sim, tomates e melancias, sendo que estas últimas são particularmente famosas. Todos os anos, a partir de agosto, as lojas ucranianas estão cheias dessas frutas – com a exceção deste ano.
Nas redes sociais, fotografias de soldados ucranianos segurando melancias em suas mãos se tornaram símbolos das retomadas de território.
A região de Kherson é famosa pelo cultivo de frutas e vegetais e se vangloria de possuir 2 milhões de hectares de terras para agricultura – as maiores da Ucrânia, e quase o dobro das que existem na Holanda.
Não chega a surpreender que a primeira empresa de ketchup na Ucrânia, a Chumak, tivesse sido fundada em 1993 na cidade de Kakhovka, na região de Kherson. Idealizada por dois suecos, é considerada uma das histórias de sucesso da Ucrânia independente. Em seu portal de internet, consta que ela, orgulhosamente, possui a maior plantação de pepinos da Europa.
Kakhovka foi ocupada pelas tropas russas durante os primeiros dias da guerra. A Chumak, atualmente a segunda maior no mercado ucraniano, interrompeu a produção e mudou sua sede para Kiev.