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A dura realidade de migrantes no México

Joseph Sorrentino do México / av
1 de fevereiro de 2019

Milhares de centro-americanos enfrentam incerteza e falta de perspectivas em território mexicano. A maioria não quer viver no país, mas se vê impedida tanto de seguir para os EUA quanto de voltar para a terra natal.

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Migrantes atravessam a pé o caminho do México aos EUA
Migrantes atravessam a pé o caminho do México aos EUAFoto: DW/J. Sorrentino

Manuel Laba Alvarado está sentado na cama que divide com o filho Jairo, de 13 anos, na Casa Tochan, um pequeno abrigo para requerentes de refúgio centro-americanos na Cidade do México.

O leito é pequeno, na parte de baixo de um conjunto de beliches bastante usados, e, a rigor, com lugar para só uma pessoa. Embora Jairo seja pequeno, ambos ficam bastante apertados. "Não tem muito espaço", admite Manuel. "Mas não é tão ruim assim."

Assim como um número crescente de centro-americanos, ele procura refúgio no México, mas, também como muitos, não está certo de que poderá permanecer.

"Tenho uma família em Honduras, mais três crianças. Eu ganhava 215 pesos [cerca de 10 dólares] por dia, trabalhando numa construção como ajudante geral. Isso mal dá para sobreviver", diz.

Segundo Claudia Leon Ang, coordenadora de advocacia do Serviço Jesuíta para Migrantes da Cidade do México, a maior parte dos centro-americanos não quer viver no país, mas não pode seguir para os Estados Unidos e não pode voltar para seu país de origem.

Estima-se que entre 400 mil e 500 mil centro-americanos entrem ilegalmente no México a cada ano, ou seja, fora dos pontos de ingresso oficiais. Eles pagam 20 pesos para cruzar de balsa o rio Suchiate, na fronteira entre o México e a Guatemala.

Hondurenho Manuel Laba Alvarado e o filho Jairo na Casa Tochan
Hondurenho Manuel Laba Alvarado e o filho Jairo na Casa TochanFoto: DW/J. Sorrentino

A maioria foge dos países do Triângulo do Norte – Guatemala, Honduras e El Salvador –, sistematicamente classificados entre os mais violentos do mundo. A maior parte da violência é perpetrada por duas gangues, a Mara Salvatrucha (MS-13) e a 18th Street (Mara 18), que matam, sequestram e violentam impunemente.

Elas também extorquem dos negociantes a "renta", que muitos também pagam apenas para ter permissão de morar num bairro. Questionado sobre o que acontece se alguém se recusa a pagar, o salvadorenho Jonathan Arnoldo Varias, habitante de Tochan, forma um revólver com os dedos e finge apertar o gatilho diversas vezes.

Antes de 2014, viam-se centenas de centro-americanos a bordo dos trens de carga que apelidam de "La Bestia", na esperança de chegarem aos EUA. Em agosto daquele ano, porém, o então presidente do México, Enrique Peña Nieto, implementou o Plano Fronteira Sul (PFS).

Embora se alegasse que a finalidade do plano era proteger os migrantes, na prática eles ficaram impedidos de subir a bordo da "Bestia", sem nenhuma medida para reduzir o número das travessias de fronteira, já que os migrantes encontraram rotas alternativas para entrar no México.

Para Manuel e seu filho, isso significou caminhar até 12 horas por dia: "A gente andava por três ou quatro horas, depois descansava." Segundo grupos de advocacia que trabalham com migrantes, os riscos da travessia são altos: cerca de 80% deles são assaltados, 60% das mulheres, violentadas, e as gangues recrutam à força meninos de até dez anos de idade.

Migrantes atravessam de balsa o rio Suchiate, entre Guatemala e México
Migrantes pagam 20 pesos para cruzar o rio Suchiate, entre Guatemala e MéxicoFoto: DW/J. Sorrentino

Até o presidente nos EUA, Donald Trump, começar a adotar políticas de imigração cada vez mais cruéis, a maior parte dos que vinham da América Central planejava atravessar para os EUA, esperando poder requerer refúgio. Mas, constatando que agora as chances de que isso aconteça são quase nulas, eles encaram o México como país de destino. Se em 2015, 3.400 centro-americanos requereram refúgio no país, 14 mil o fizeram somente no primeiro semestre de 2018.

Mas não é certo que o México seja realmente uma opção viável. Segundo Francisco Senties, da Casa Refugiados, na Cidade do México, a maioria desses centro-americanos "não tem muita instrução". Portanto, restam-lhes apenas duas opções de trabalho: empregos de salário mínimo, que é de 102 pesos diários na metrópole, ou o trabalho na economia informal – se conseguirem.

"Eles nos ouvem falar e sabem pelo nosso sotaque que somos migrantes", explica Joel Linares Lizana, "às vezes você não consegue trabalho por causa disso". Edgar Galeas Morena acrescenta que "aqui, às vezes, você trabalha e eles não pagam, ou pagam menos".

Oscar Molina enfrentou outro desafio: "Tenho 69 anos, e é difícil encontrar emprego." Ele vive na Casa Tochan há cinco anos, desde que perdeu o apartamento por não poder mais pagar o aluguel.

Além de cuidar da manutenção do abrigo em troca do quarto e de refeições, ele tem uma pequena oficina onde faz chaveiros que vende por 30 pesos. Cada um tem inscritas algumas linhas sobre os residentes do abrigo. Voltar para El Salvador é impossível: "As gangues matam você", afirma Oscar.

Apesar dos perigos, alguns migrantes decidiram retornar a seus países de origem, na América Central. Jonathan Arnoldo Varias, que tem mulher e três filhos em El Salvador, é um deles.

"Preciso voltar, não consigo ganhar o suficiente aqui para sustentar minha família, é impossível. É muito perigoso em El Salvador, mas não há outras opções", diz

Oscar Molina vende chaveiros na Casa Tochan
Oscar Molina vende chaveiros para completar o orçamentoFoto: DW/J. Sorrentino

Discriminação e pagamento insuficiente não são os únicos problemas enfrentados pelos migrantes. Muitos consideram o México quase tão perigoso quanto seus países de origem. Um estudo de 2017 da ONG Médicos Sem Fronteiras constatou que os centro-americanos "estão encurralados e expostos a mais violência no México devido às políticas de controle de fronteiras cada vez mais estritas e impiedosas dos Estados Unidos".

A despeito dessas políticas, muitos migrantes ainda sonham em chegar aos EUA. Carlos Cuellar trabalhou como telhador no Brooklyn por dez anos, até ser deportado de volta para El Salvador, em 2012. Ameaças de gangues o forçaram a procurar repetidamente reentrar nos EUA. Apesar de ter sido deportado mais quatro outras vezes, ele está decidido a tentar de novo.

"Não consigo ganhar o suficiente no México. Eu tenho minha mãe, quatro irmãs e uma filha em El Salvador, e não consigo ganhar o bastante para ajudá-las. Quando eu atravessar a fronteira, vou ficar animado, porque esse é o meu sonho, fazer dinheiro, dinheiro para ajudar a minha família."

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