A cena islamista na Alemanha
20 de novembro de 2015Os jihadistas na Alemanha são mais jovens do que costumavam ser e se tornam radicais num período de tempo mais curto, segundo o Departamento Federal de Investigações da Alemanha (BKA). Em alguns casos passaram-se apenas algumas semanas ou meses até que uma pessoa tenha se unido a extremistas na Síria ou no Iraque, afirmou o presidente do BKA, Holger Münch, ao jornal Die Welt.
Pelo menos 750 extremistas já viajaram da Alemanha para a Síria, e um terço deles retornou – 70 com experiência no campo de batalha. O potencial de novos combatentes para a "guerra santa" está, porém, longe de ter sido esgotado. O BKA e o Departamento Federal de Proteção da Constituição calculam que 43 mil islamistas vivam na Alemanha. Nesse caso, islamista refere-se a uma pessoa que almeja elevar o islã ao status de ordem social obrigatória e base da formação do Estado.
O número de salafistas continuou a aumentar em 2014. As autoridades de segurança calculam que eles são cerca de 7.900. Os salafistas defendem uma ordem jurídica islâmica especialmente estrita, baseada em interpretações do Alcorão e de outros textos. Nem todo salafista está disposto a usar de violência para impor seus ideais, mas, de acordo com o presidente da BKA, Holger Münch, esse número está crescendo. Vários grupos e líderes estão contribuindo para essa radicalização.
Os seguintes pregadores e organizações são considerados influentes na cena islamista alemã.
Ansarul Aseer: "Assistente dos detentos", como o nome indica, é uma organização salafista que se dedica principalmente a detentos muçulmanos. A maioria desses detentos pertence a organizações jihadistas e cumpre pena na Alemanha ou no exterior por apoio ao terrorismo. A organização tenta atrair novos seguidores entre os detentos. Ansarul Aseer pede àqueles que visitam o seu site para que entrem em contato com os detentos e deem apoio moral a eles.
Daesh, ou "Estado Islâmico" (EI): A propaganda do assim chamado "Estado Islâmico" (EI), ou Daesh em árabe, chega à Alemanha principalmente pela internet. A organização terrorista domina grandes áreas no norte da Síria e do Iraque. Em 2014, seu líder Abu Bakr al-Bagdadi proclamou um califado sunita. Milhares de combatentes se juntaram à organização jihadista, entre eles muitos alemães.
O ex-rapper berlinense Denis Cuspert, conhecido como Deso Dogg, uniu-se ao EI provavelmente em 2012. Em vídeos do EI, ele convoca atentados na Alemanha. Ele também aparece em vídeos que mostram decapitações, tornando-se o mais importante propagandista em língua alemã do Daesh. Ele teria sido morto em outubro de 2015 num ataque aéreo dos Estados Unidos.
Radicais muçulmanos continuam viajando da Alemanha para a Síria e o Iraque para lutar pelo "Estado Islâmico".
Hassan Dabbagh: Este alemão de origem síria é considerado um dos mais importantes líderes salafistas da Alemanha. Ele divide as pessoas entre "muçulmanos" e "infiéis". Dabbagh é presidente e imã da mesquita Al-Rahman, em Leipzig, onde ele organiza "seminários" e "encontros educativos" sobre o islã.
Segundo o Departamento de Proteção da Constituição da Saxônia, os discursos agressivos de Dabbagh podem contribuir para a radicalização de jovens muçulmanos. Ele organiza ainda uma "Academia Islâmica Móvel", que ele usa para propagar suas interpretações do islã por toda a Alemanha. Seus sermões também podem ser encontrados em vários fóruns na internet.
Ibrahim Abou-Nagie: Nasceu no campo de refugiados palestinos Nuseirat, na Faixa de Gaza, em 1964, e se tornou cidadão alemão em 1994. Mesmo sem qualquer formação em teologia, Abou-Nagie é considerado um dos pregadores salafistas mais influentes da Alemanha. Seus textos com interpretações estritas da lei islâmica podem ser encontrados na internet. Ele também diferencia as pessoas entre "muçulmanos" e "infiéis".
Abou-Nagie mantém um site chamado "A verdadeira religião". Membros da rede de mesmo nome distribuem o Alcorão em cidades alemãs. O Departamento Federal de Proteção da Constituição reportou, em 2014, haver indícios de pessoas que "primeiramente participaram da distribuição do Alcorão e depois se uniram à luta na Síria".
Comunidade Islâmica Milli Görüs (IGMG): A Comunidade Islâmica Milli Görüs ("Visão Nacional") é considerada a maior organização islamista da Alemanha. São cerca de 31 mil membros, além de muitas outras pessoas que mantêm laços estreitos com a organização. O político turco Necmettin Erbakan fundou o grupo no fim da década de 1960.
Os seus representantes afirmam que o capitalismo e o sionismo são as causas da atual "ordem mundial injusta" e aconselham seus membros a não terem relações com "infiéis". O líder do grupo, Mustafa Kamalak, chamou a União Europeia de "clube dos cristãos" e "união de cavaleiros das cruzadas".
Em junho de 2013, ele afirmou na edição do jornal do IGMG, o Milli Gazete: "É uma heresia colocar as leis do homem acima das leis de Deus."
Brigada de Lohberger: Em 2013, cerca de 20 jovens do estado da Renânia do Norte-Vestfália partiram para aumentar as fileiras da Jihad na Síria. Eles são da cidade de Dinslaken e quase todos do bairro de Lohberg – de onde vem o nome do grupo. O grupo teria se formado em torno do autoproclamado pregador Mustafa T.
Ao menos quatro dos jihadistas morreram na Síria, e ao menos um deles se suicidou como homem-bomba. Um suposto membro do grupo, Nils D., foi preso no começo de 2015. Ele havia retornado à Alemanha em novembro de 2014. Seu julgamento deve começar em janeiro de 2016.
Pierre Vogel: É considerado um dos islamistas mais influentes da Alemanha. Desde 2006, esse convertido atua como pregador islamista. Suas ideias são propagadas principalmente entre o público jovem, por exemplo por meio de vídeos na internet.
Ele afirma que a violência contra inocentes, ataques terroristas e crimes de honra são incompatíveis com o islã. Segundo a Agência Federal de Educação Civil da Alemanha (BPB), a visão de mundo dele é baseada numa estrita divisão entre comportamentos islâmicos (certo/bem) e não islâmicos (errado/mal). Para as autoridades de segurança, os sermões de Vogel podem contribuir para a radicalização de "indivíduos jovens e muito religiosos".
Sven Lau: Este alemão seguiu um caminho semelhante ao de Vogel. Filho de pais católicos, ele se converteu ao islã por volta de 2000 e, anos depois, optou pelo salafismo. Até 2008, Lau era bombeiro na cidade de Mönchengladbach, no estado da Renânia do Norte-Vestfália. Depois, ele teve uma loja de acessórios islâmicos. Lau também presidiu a associação "Convite para o paraíso".
Lau viajou diversas vezes para a Síria nos últimos anos, segundo ele por razões humanitárias. Em setembro de 2014, ganhou notoriedade nacional ao criar em Wuppertal, com outros salafistas, uma "polícia da sharia". Entre as funções dessa "polícia" estava evitar que jovens muçulmanos entrassem em cassinos e clubes. Promotores abriram um inquérito por violação do "direito de reunião".
Tauhid Germany ou Tauhid Deutschland: É a organização que sucedeu a Millatu Ibrahim. É proibida na Alemanha, mas continua divulgando ideias salafistas na internet. A organização mantém um site e também está ativa em sites como Facebook e YouTube.
Entre os vídeos divulgados estão alguns que glorificam a violência jihadista. Algumas publicações propagam o ódio contra os "infiéis". O jihadista alemão Denis Cuspert era considerado um dos líderes do grupo. Ele e outros membros do Millatu Ibrahim se uniram ao "Estado Islâmico".
Célula de Wolfsburg: Cerca de 20 jihadistas viajaram de Wolfsburg para o Iraque e a Síria em 2013 e 2014 para lutar pelo "Estado Islâmico". Dois membros da "célula de Wolfsburg" estão agora sendo julgados na Alemanha. Eles viajaram para a Síria, passando pela Turquia, em 2014.
Um deles declarou ao júri que o grupo foi influenciado pelo pregador Yassin O., do "Estado Islâmico" e que nesse meio tempo fugiu para a Síria. "Ele dava a impressão de ter uma resposta para todas as perguntas", afirmou o réu, tentando explicar a fascinação do grupo por Yassin. "Todos o respeitavam." Ambos os réus aguardam sentenças que podem chegar a até dez anos de prisão. Ao menos sete dos jihadistas de Wolfsburg morreram na Síria.