8 de maio marca capitulação incondicional da Wehrmacht
6 de maio de 2015"A guerra acabou. As armas silenciam." Hildegart Theinert escreveu em 9 de maio de 1945, dia em que foi anunciada em toda a Alemanha a capitulação das Forças Armadas nazistas, essa frase no diário de seu marido. Pouco depois, na cidadezinha de Glatz, na Baixa Silésia, o professor de latim Johannes Theinert a matou com um tiro, para se suicidar em seguida.
Mas é preciso ir por partes.
Karlshorst, subúrbio de Berlim, 8 de maio de 1945, 23h45. O marechal-de-campo Wilhelm Keitel assina a capitulação incondicional da Wehrmacht. Essa é a data oficial do documento, mas, na realidade, Keitel só o firmou no dia seguinte, e sua assinatura era uma mera repetição formal do que já fora acertado no dia 7, em Reims.
Na cidade francesa, o coronel-general Alfred Jodl declarara a "capitulação incondicional de todas as tropas de terra, água e ar [...] diante do supremo comandante da Força Expedicionária Aliada e, ao mesmo tempo, diante do comando supremo das tropas soviéticas". Todas as operações bélicas deveriam ser suspensas às 23h01 de 8 de maio.
Entretanto, a cerimônia teve que ser repetida em Berlim – por pressão de Josef Stalin, segundo a teoria vigente, já que em Reims não estivera presente nenhum representante de alto escalão do Exército soviético.
"Esse fato certamente teve relevância", concorda Margot Blank, do Museu Teuto-Russo de Berlin-Karlshorst. "Porém mais decisivas foram as ressalvas por parte dos britânicos. Eles apontaram que, no fim da Primeira Guerra, a liderança militar alemã não havia capitulado, mas enviara na frente o governo civil, só para dizer posteriormente 'não fomos vencidos no campo de batalha'."
Nazistas ainda no poder
Assim, segundo Blank, foi por temor de uma segunda "lenda da punhalada pelas costas" que os britânicos cederam à sugestão de Stalin. A nova capitulação foi assinada pelos mais altos comandantes de tropas alemães. Keitel como supremo comandante por toda a Wehrmacht, o coronel-general Hans-Jürgen Stumpff pela Força Aérea, e o almirante-general Hans-Georg von Friedeburg pela Marinha de Guerra.
As cerimônias em Reims e Karlshorst ocorreram de comum acordo com o presidente do Reich, Karl Dönitz. Com o suicídio de Adolf Hitler, em 30 de abril de 1945, Dönitz se tornara o sucessor oficial do ditador. Desde a fuga de Berlim, o governo em exercício tinha como sede Flensburg, no norte do país, para onde retornou após a assinatura em Karlshorst, permanecendo no poder.
"Não foi o Reich que capitulou, mas a Wehmacht", explica Johannes Hürter, do Instituto de História Contemporânea de Munique. Somente em 23 de maio, Dönitz e todos os demais membros do governo foram presos. A ocupação britânica fora pressionada a prendê-los pelos americanos, que haviam sido informados de que, mesmo depois de 8 de maio, seguiam ocorrendo execuções com base em sentenças de tribunais militares alemães.
Fogo em retrato de Hitler
A "hora zero" não soou necessariamente em 8 de maio para todos os cidadãos da Alemanha. Para Esther Bejarano, ela chegou já no fim de abril, quando soldados russos e americanos se encontraram e, em júbilo, atearam fogo a um retrato de Hitler. Em sua companhia estavam algumas jovens judias, que haviam conseguido escapar de uma das "marchas da morte" através do Império Alemão.
"Eles dançaram em volta dessa foto, e eu toquei a música de acompanhamento", conta Bejarano, hoje com 90 anos. Era a primeira vez que ela tocava seu acordeão por vontade própria desde que a atividade na orquestra feminina fora sua única chance de sobrevivência em Auschwitz. "Foi a minha libertação. Agora sabíamos que éramos pessoas livres."
Todos os campos de concentração e extermínio estavam libertos até 8 de maio, mas muitos ex-detentos não sabiam para onde ir. Muitos vagaram pela Alemanha, na busca por familiares, outros tiveram que permanecer nos campos onde haviam estado confinados tanto tempo, por pura exaustão, ainda semanas após a libertação. Em Bergen-Belsen, os britânicos instalaram um acampamento para pessoas desalojadas.
"Pelo antigo Império Alemão, milhões de desterrados erravam. Eram desalojados, trabalhadores forçados, refugiados, antigos detentos dos campos de concentração e extermínio", relata o professor de história Hürter. "Havia as mais diversas emoções: de libertação, mas também de medo."
Onda de suicídios
O casal Theinert, da Baixa Silésia, tinha medo. Medo da vingança dos vencedores, pois – o mais tardar desde o retorno de um ex-aluno que lutara no Front Oriental – eles sabiam sobre os crimes dos alemães.
"Muitos tinham um sentimento de culpa e de envolvimento cúmplice e, por isso, também medo do que viria depois", analisa Florian Huber. Em seu livro Kind, versprich mir, dass du dich erschiesst (Filho, prometa que te matarás com um tiro), ele descreve a maior onda de suicídios em massa da história da Alemanha.
O autor apresenta registros de que, somente na localidade de Demmin, na Pomerânia Ocidental, entre 700 e mil pessoas tiraram a própria vida, de um total de habitantes de 15 mil. Em Berlim, o número de suicídios no último ano da guerra foi cinco vezes maior do que nos anos anteriores.
Também na cidadezinha de Glatz, o professor Johannes Theinert e sua esposa não foram os únicos para quem viver se tornara insuportável. "São só uns momentos, e aí tudo acabou, tudo – para sempre!", escreveu Hildegard Theinert pouco antes de seu marido disparar contra ela, apenas um dia depois do fim da Segunda Guerra Mundial.