1949: Promulgada a Lei Fundamental Alemã
Publicado 23 de maio de 2016Última atualização 23 de maio de 2019A elaboração da Carta Magna alemã foi autorizada pelos três aliados ocidentais nos chamados Documentos de Frankfurt, em julho de 1948. Esta Assembleia Constituinte, batizada de Conselho Parlamentar, foi formada por 65 representantes de assembleias estaduais da Alemanha Ocidental e cinco observadores enviados por Berlim.
O conselho foi presidido por Konrad Adenauer, da União Democrata Cristã (CDU), que ainda em 1949 seria eleito primeiro chefe de governo alemão-ocidental no pós-Guerra.
A tarefa da Assembleia Constituinte era redigir uma Lei Fundamental com poderes de Constituição, mas que não tivesse caráter definitivo, para não ameaçar a almejada unificação alemã. Depois da Segunda Guerra Mundial, a Alemanha havia sido dividida em duas, ocupadas por soviéticos e aliados ocidentais.
Em agosto de 1948, uma conferência havia definido as linhas gerais da Grundgesetz, prevendo os três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário. A tarefa dos parlamentares foi complementá-la com mecanismos que definissem todos os direitos civis e criassem os fundamentos jurídicos do país.
Antes da aprovação da Lei Fundamental, muita polêmica agitou os dois grandes partidos alemães, a União Democrata Cristã (CDU) e o Partido Social Democrata (SPD). Uma questão controvertida foi, por exemplo, a igualdade entre homens e mulheres perante a lei. Somente o engajamento da social-democrata Elisabeth Selbert, apoiada por sindicatos e associações feministas, conseguiu garantir os mesmos direitos para os dois sexos.
Com 53 votos a favor e 12 contra, a Lei Fundamental Alemã foi aprovada pela Constituinte e anunciada por Adenauer a 23 de maio de 1949.
Proteger fundamentos naturais da vida e dos animais
Com a unificação dos dois Estados alemães, em 1990, a Lei Fundamental deixou de ter caráter provisório. Em maio de 2002, o Parlamento aprovou a inclusão da proteção aos animais num parágrafo da Constituição.
Com a emenda, a Alemanha foi o primeiro país da União Europeia a incluir esse preceito entre as tarefas fundamentais do Estado. O parágrafo 20 da Lei Fundamental passou a ter três palavras a mais e o seguinte teor: "O Estado protege os fundamentos naturais da vida e os animais".
O professor Vital Moreira, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, destaca a importância das cartas magnas alemãs no contexto internacional: "Já a Constituição de Weimar, de 1919, serviu de modelo para as constituições entre as duas guerras. A ela se deve a constitucionalização dos direitos sociais e da economia".
A Constituição de Weimar pela primeira vez ensaiara um compromisso no sistema de governo parlamentar, com um presidente da República eleito diretamente, dotado de importantes poderes institucionais próprios. Mas algumas das suas soluções acabaram por favorecer a instabilidade política da República de Weimar e, mais tarde, a tomada do poder por Hitler.
Weimar serviu de inspiração
Algumas das instituições da Lei Fundamental de 1949 baseiam-se nos preceitos da Constituição de Weimar, explica Vital Moreira: "É o caso da opção por um parlamentarismo racionalizado, com garantia de estabilidade governamental, sobretudo por intermédio da moção construtiva, que só permite o derrube de um governo desde que com a aprovação simultânea de um governo alternativo. É o caso da barreira dos 5%, que veda a eleição de deputados por pequenos partidos extremistas e que impede a pulverização parlamentar".
"É o caso", prossegue o professor português, "da interdição dos partidos anticonstitucionais, que permitiu a proibição do Partido Comunista Alemão. Ou do afastamento da eleição direta do presidente da República, bem como do referendo. É o caso da garantia dos direitos fundamentais, sobretudo por meio de um Tribunal Constitucional, diretamente apelável pelos cidadãos mediante o mecanismo da queixa constitucional, em caso de violação dos seus direitos".
Nos seus 65 anos de existência, a Constituição alemã exerceu grande influência internacional. Não existe Constituição europeia elaborada nas últimas décadas que não tenha colhido soluções na Constituição alemã.
"Isso é evidente desde logo na Constituição portuguesa de 1976 e na espanhola de 1978. Ela foi fonte de inspiração também para as novas Constituições dos países do Leste Europeu, nascidas da transição democrática e da fragmentação da União Soviética", complementa Vital Moreira.