África do Sul: Ramaphosa admite que corrupção dividiu o ANC
30 de abril de 2021Cyril Ramaphosa compareceu esta quinta-feira (29.04), em Joanesburgo, pelo segundo dia, perante a comissão de inquérito que investiga as alegações de que milhões de dólares foram saqueados dos cofres do Estado sul-africano nos últimos dez anos por funcionários do Governo que trabalhavam em conjunto com indivíduos e empresas privadas.
Perante a comissão de inquérito, e em nome do partido no poder, o Congresso Nacional Africano (ANC), Ramaphosa garantiu que não arranjaria desculpas para o fracasso do seu partido no Governo em erradicar a corrupção. "Todos reconhecemos que a organização poderia, e deveria, ter feito mais para evitar o abuso de poder e a apropriação indevida de recursos que descrevem a era da corrupção de Estado", disse.
O chefe de Estado foi questionado por que é que o seu partido assistiu, impotente, enquanto milhões estavam a ser saqueados. "As diferenças sobre a existência ou não da corrupção de Estado a sua extensão e forma, assim como o que deve ser feito em relação à mesma, contribuíram para divisões no seio do comité executivo nacional e outras estruturas do partido ANC", admitiu.
A comissão também quer saber porque é que o comité de destacamento de quadros do Congresso Nacional Africano recrutou pessoas acusadas de má administração de empresas estatais e permitiu que o interesse privado ofuscasse o seu mandato público. O financiamento do partido ANC por pessoas que recebem benefícios do Governo também foi alvo de escrutínio.
Ramaphosa deu um bom exemplo?
A analista Susan Booysen diz que o Presidente sul-africano foi estratégico ao evitar dar muitos pormenores sobre como a alegada corrupção aconteceu. "Vimos [Ramaphosa] esquivar-se triplamente de um campo minado de possíveis implicações. Primeiro, implicações sobre si mesmo; segundo, de qualquer colega no partido ANC e, por fim, de incriminar o próprio partido como tal. Foi muito hábil em mover-se pelo campo minado", argumenta.
Onga Mtimka, outro analista político, discorda e diz que Ramaphosa deu um bom exemplo ao sujeitar-se a interrogatório. "Era importante para a democracia ter o Presidente a responder às perguntas num processo que é quase judicial. O que isso faz é ressaltar a predominância do Estado de direito e do constitucionalismo sobre o poder político", sublinha.
Cyril Ramaphosa deverá regressar à comissão de inquérito no final do próximo mês para responder a perguntas sobre corrupção, principalmente por funcionários do governo durante o período em que estava a substituir o antigo Presidente Jacob Zuma.
Por sua vez, Zuma, que foi implicado por mais de trinta testemunhas na comissão, recusou-se a regressar para responder a mais perguntas, dizendo que preferia ir para a prisão a sujeitar-se a um processo destinado a criminalizá-lo.