Cerimónia marca 35 anos da morte de Samora Machel
19 de outubro de 2021O 35.º aniversário da morte do ex-Presidente moçambicano Samora Machel foi assinalado hoje em Mbuzini, localidade sul-africana junto à fronteira com Moçambique.
Estiveram presentes a ativista e viúva de Samora Machel, Graça Machel, o Presidente moçambicano Filipe Nyusi, bem como o Presidente sul-africano Cyril Ramaphosa.
Graça Machel, ativista e viúva de Samora Machel, considerou hoje que o primeiro Presidente moçambicano foi "assassinado" para calar uma voz de referência na região.
"Eu quero dizer aos meus filhos, jovens africanos, que estão nos seus 30 ou 20 anos, clamem e recuperem esta voz que se tentou calar aqui", declarou Graça Machel.
A ativista moçambicana falava durante a cerimónia no memorial e museu criados no local onde o avião se despenhou há 35 anos, em Mbuzini.
Para Graça Machel, a morte de Samora foi organizada e o objetivo era calar uma referência regional da lista de homens que lutaram contra a opressão do povo africano, uma "linha da frente" ao lado de nomes como Agostinho Neto.
"Muitas vezes pensamos que foi assassinado um líder, sim. Mas com ele, também foi assassinada a luta tenaz e incondicional" daqueles líderes, frisou "mamã Graça", como é conhecida.
O combate contra a pobreza, prosseguiu, deve ser a prioridade dos governos e as riquezas que a África Austral possui devem beneficiar o povo.
"Eu tinha de usar o meu cabelo branco para dizer: filhos meus, estes povos merecem muito mais do que têm recebido", disse Graça Machel, no mesmo palco em que estavam sentados os presidentes moçambicano, Filipe Nyusi, e sul-africano, Cyril Ramaphosa.
Projeto ameaçado
O Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi enalteceu a família Machel, com a viúva Graça ao seu lado, e fez a ponte entre a visão do primeiro chefe de Estado moçambicano e a atualidade.
"O projeto de Samora Machel está ameaçado por ações macabras em Cabo Delgado", disse Nyusi, numa alusão à onda de violência que já dura há quatro anos e que se transformou numa guerra. Desde julho, o país conta com apoios militares do Ruanda e da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC).
A África do Sul é um dos países que integram a força conjunta da SADC a combater em Cabo Delgado e cujo apoio está a permitir às Forças Armadas e de Defesa de Moçambique (FADM) virar a seu favor a maré da guerra.
Nyusi agradeceu o empenho dos "filhos" da África do Sul em Cabo Delgado e referiu que o apoio militar conjunto está a permitir "travar a agressão" contra o país e "os resultados são promissores".
Libertação de África
Por seu lado, Cyril Ramaphosa salientou, ao longo do seu discurso, a proximidade e irmandade entre os dois países, considerando que Mbuzini é um local "sagrado" e "um lugar onde um grande sacrifício foi feito".
"Os sul-africanos jamais esquecerão o contributo de Samora Machel e das pessoas de Moçambique na luta para garantir que a nossa liberdade [luta contra o 'apartheid']", declarou Ramaphosa.
Do lado sul-africano, o 35.º aniversário da morte de Samora Machel integra um conjunto de iniciativas do Governo que "visam corrigir e alterar a paisagem do património para transmitir autenticamente a história de libertação da África do Sul desde os tempos coloniais".
Relembre o acidente
O primeiro Presidente da então República Popular de Moçambique independente morreu em 19 de outubro de 1986, quando um avião Tupolev se despenhou, durante a noite, em território sul-africano, na zona montanhosa de Lebombo, junto à fronteira com Moçambique.
Um engenheiro de voo e nove passageiros das 44 pessoas a bordo sobreviveram ao acidente que atraiu alegações de sabotagem contra a então administração sul-africana do sistema de segregação racial do 'apartheid' e sobre o qual um inquérito da Comissão de Verdade e Reconciliação (TRC) sul-africana, em 1994, foi inconclusivo quanto às causas.
Samora Machel, 53 anos, regressava de uma conferência regional com líderes africanos, em Lusaca, na Zâmbia, e perdeu a vida ao lado de membros do seu partido, ministros, funcionários e tripulação da aeronave russa.