Vitória de Hollande cria esperança de nova era entre França e África
7 de maio de 2012
O socialista François Hollande recebeu, de acordo com resultados divulgados domingo (06.05), 51,6% dos votos, contra 48,4% para o presidente cessante conservador, Nicolas Sarkozy, e foi assim eleito o novo presidente da França.
A mudança não deixa indiferente nomeadamente a África francófona, segundo as reações colhidas pela seção francesa da DW África.
As pessoas saúdam tanto a partida de Nicolas Sarkozy como a chegada à presidência de François Hollande, a exemplo de Mahamadou Issoufou, o presidente do Níger, ex-colónia francesa: "Penso que a França tem todo o interesse em apoiar a transição democrática em África para que a democracia se enraíze nos países africanos", avaliou Issoufou, que acredita que Hollande também terá papel crucial para a saída da crise que o mundo e, em particular, a Europa, atravessa.
"Com base nos valores que ele defendeu, estou convencido que será capaz de contribuir para a solução de vários problemas que preocupam o mundo, nomeadamente nas trocas mais igualitárias, em particular entre os países do norte e do sul, produtores de matéria prima. Entre o Níger e a França, queremos que exista uma parceira equilibrada, que tenha em conta os interesses de cada parceiro", afirmou Issoufou.
Fim da Françafrique
Moussa Diaw, chefe do departamento de Ciências Políticas na Universidade Gaston Berger em Saint-Louis, no Senegal, conta com uma ruptura nas relações entre a França e a África, o fim do que se convencionou chamar de Françafrique (termo que descrevia a política africana da França conhecida pelo traço neocolonial).
Diaw lembra que "François Hollande disse que vai personalizar as suas relações e trabalhar para que exista uma parceria negociada que permita equilibrar as relações entre a França e os países africanos".
Que a França reconcilie com as novas elites africanas e ponha fim nomeadamente ao seu apoio tácito das manipulações eleitorais em África, é também o que espera Evariste Ngarlem Toldé, da União dos Jornalistas do Chade: "Quando se sabe que o presidente cessante [Sarkozy] foi para muitos africanos um grande problema, para citar por exemplo o que aconteceu na Líbia, na Costa do Marfim e particularmente no Chade – onde esteve sempre do lado do presidente –, a sua saída do poder é uma boa notícia para as relações futuras entre a França e o Chade", avalia Toldé, que recorda que o "eleito presidente já foi claro: não vai haver mais eleições fraudulentas em África, onde alguns presidentes já ocupam o cargo há mais de 20 anos".
Este tuaregue que fugiu do Mali, espera também que François Hollande consiga solucionar a crise que atinge nomeadamente o norte do seu país: "Estou seguro que a situação será melhor com François Hollande. O nosso desejo é que ele ajude o Mali a enfrentar a crise que se vive no norte".
"França não vive revolução"
Também na Tunísia, espera-se muito do novo presidente francês, mesmo que Omar Mestiri, redator principal da rádio Kadima, em Túnis, mostre uma esperança moderada: "Não foi uma revolução que aconteceu na França. É uma alternância que permanece contudo sob alçada de uma crise econômica", lembra Mestiri, que defende uma abordagem "realista" da eleição no país europeu.
Até porque, segundo o redator, "a margem de manobra de François Hollande é muito limitada. Mas o essencial é medir o peso da revolução tunisina e o seu impacto. Para o presidente cessante Sarkozy dever-se-ia conter e controlar a revolução tunisina para evitar que o fogo revolucionário se propague", explica.
Por seu turno, Théobald Rutihunza, da Rede Internacional para a promoção e a Defesa dos direitos do Homem no Ruanda (RIPRODHOR), "alguns países africanos foram desestabilizados, como o Mali e a Líbia e muitos esforços foram feitos para impedir a União Africana de solucionar os conflitos africanos. Tudo isso foi uma vergonha para a França e os africanos ficaram zangados", diz, esperando que a França "imponha de forma firme as suas condições de cooperação com o Ruanda", entre outros com a "instalação de instituições democraticamente eleitas".
Hollande esqueceu da África?
Mas, muitos outros analistas afirmam que a vitória do socialista François Hollande na segunda volta da presidencial francesa foi baseada essencialmente em propostas de política interna e europeia, enquanto a política estrangeira em geral e africana, em particular, foi praticamente esquecida durante a campanha eleitoral.
Esses observadores e analistas em questões africanas interrogam-se sobre o que irá mudar com esta eleição nas relações entre Paris e África – ou então, o que se pode esperar sob o mandato de François Hollande? Que estilo de diplomacia? Que formas de parceria?
Entre as raras declarações feitas sobre o assunto, François Hollande disse nomeadamente que quer acabar com a "Françafrique" (sistema de redes de influências e de acordos secretos que durante muito tempo caracterizaram as relações entre Paris e suas ex-colónias) e o surgimento de relações mais sãs e equilibradas entre a África e a ex-potência colonial, apesar do peso do passado e dos interesses.
Ou seja: mais de diplomacia paralela e maiores vantagens na cooperação com a União Africana ou as instâncias regionais, como a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO).
Jean-François Bayard, pesquisador no Centro Nacional de Pesquisas Científicas (CNRS) afirma que, "mesmo que tenha uma visão simplista da emigração, Hollande tem mais sensibilidade e humanidade. Certamente terá mais reticências em recorrer às ações militares do que Nicolas Sarkozy", avalia.
Outros observadores recusam contudo a ideia de ruptura, ao considerarem que a "Françáfrica" já pertence quase ao passado ou então que esta promessa, já feita por Nicolas Sarkozy é algo sem fundamento porque não existe. Quanto à distancia de François Hollande sobre questões africanas, bem vinda para alguns, pode também revelar um certo desinteresse para outros: "Salvo erro, Hollande conhece mal a África. Não acredito que tenha uma fibra africana bem desenvolvida", diz Bayard.
Apesar de tudo, os dossiês que deverão ser geridos são muitos, nomeadamente a situação muito instável no Sahel e países árabes em plena mudança. A política africana sob François Hollande dependerá portanto das pessoas que farão parte da sua equipa, estima Bayard: "Tudo dependerá quem será nomeado para ocupar o cargo do "Senhor África" no Eliseu [sede do governo francês] e em seguida os nomes que irão ocupar as pastas dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação".
Para além das boas intenções patenteadas por François Hollande, como a solidariedade, o restabelecimento do Alto Conselho da Cooperação Internacional (desfeito em 2008) e a transparência nas atividades das multinacionais. Muitos analistas esperam também que seja relançado o projeto de União para o Mediterrâneo (sugerida por Sarkozy durante campanha presidencial em 2007 como alternativa da entrada da Turquia para a União Europeia).
Relações entre França e Alemanha deverão continuar boas
Entretanto, o porta-voz do governo alemão, Steffen Seibert, considerou que a qualidade das relações franco-alemãs será mantida, mesmo se a chaneceler Angela Merkel tenha manifestado um apoio a Nicolas Sarkozy.
Recorde-se que Angela Merkel anunciou que receberá François Hollande de "braços abertos" – mas que Berlim já colocou as suas condições ao novo presidente francês: está fora de questão uma possível renegociação do pacto orçamental europeu.
Autor: António Rocha
Edição: Renate Krieger