Uma catástrofe humanitária no Cordofão do Sul?
16 de junho de 2011Enquanto ambas as partes envolvidas nos atuais confrontos no Sudão – o exército do Sul, SPLA, e as forças armadas do Norte, SAF – se acusam mutuamente de iniciar as hostilidades, organizações religiosas e de defesa dos direitos humanos temem uma catástrofe humanitária que venha a assumir dimensões maiores do que, por exemplo, na Síria e na Líbia. Esta terça-feira, a Federação Luterana Mundial condenou em comunicado "a violência contra a população civil e as limpezas étnicas que, segundo relatos, as forças armadas do Sudão, SAF, têm vindo a desencadear".
O documento da organização reflete a preocupação não só da federação mundial de igrejas luteranas, mas também de organizações como a Amnistia Internacional e a Human Rights Watch. Eberhardt Hitzler é o Diretor do Serviço Mundial do Departamento de Ajuda Humanitária e Desenvolvimento da Federação Luterana Mundial e diz que apesar de não haver provas de que, na região, estejam realmente a ser levadas a cabo limpezas étnicas, relatos de pessoas que se encontram no terreno apontam para um agravamento da situação para a população civil "e sobretudo para os cristãos, que estão a ser presos ou mesmo mortos".
Dezenas de milhares de deslocados
No passado dia 10 de junho, a organização de defesa dos direitos humanos Amnistia Internacional referia-se, também em comunicado, a uma "emergência humanitária" e contava dezenas de milhares de pessoas em fuga dos confrontos entre os dois exércitos.
A organização escrevia que tinha recebido relatos de residentes das cidades de Kadugli e Dilling, segundo os quais as forças armadas do Sul e as forças de segurança do Sudão "revistaram ruas e casas, prendendo e matando pessoas suspeitas de apoiarem o Exército Popular de Libertação do Sudão, SPLA", ou seja, serão apoiantes do Presidente do Sul do Sudão, Salva Kiir, que terão sido mortos, de acordo com o comunicado da amnistia internacional.
Apelos sem efeito até agora
A Federação Luterana Mundial fala mesmo de relatos sobre cidades fantasma e de 140.000 deslocados nas regiões do Cordofão do Sul e de Abyei, ricas em petróleo. De acordo com o Diretor do Serviço Mundial do Departamento de Ajuda Humanitária e Desenvolvimento da Federação Luterana Mundial, o Governo sudanês não permite a entrada de ajuda por terra nem via aérea. Daí a preocupação da organização religiosa.
Eberhardt Hitzler fala de pessoas que "estão a fugir da violência de ambos os lados (e isso tem de ser enfatizado) e que se estão a esconder nas montanhas e noutros locais" e continua: "pessoas que não têm o que comer e que passam frio durante a noite". A Federação Luterana Mundial apela, por isso, a que o acesso a essas regiões seja reaberto para que a ajuda humanitária possa chegar a essas pessoas.
Também líderes políticos de todo o mundo já fizeram os mesmos apelos: desde a ONU à chefe da diplomacia europeia, Catherine Ashton, que pediu ao Governo sudanês que procure o caminho do diálogo para resolver a crise na região, em vez de tentar desarmar o SPLA; e o Presidente norte-americano, Barack Obama, que hoje se pronunciou, apelando a um cessar-fogo. "Não existe solução militar", dirigiu-se Obama aos líderes de ambas as partes numa mensagem áudio difundida pela rádio Voz da América.
9 de julho, um dia de confrontos no Sudão?
Se tudo correr como previsto, dentro de menos de um mês, a 9 de julho, o Sul do Sudão deverá tornar-se independente, tal como a população optou por referendo em janeiro passado. Até lá, as organizações prometem tentar juntar os dois lados numa mesa de negociações, esperando que, entretanto, a violência termine.
Eberhardt Hitzler é da opinião de que o Sul do Sudão precisa da oportunidade de declarar a sua independência. Mesmo sem os atuais incidentes, "já será suficientemente difícil construir este Estado do Sul do Sudão, onde ainda tudo falta".
Autora: Marta Barroso
Edição: António Cascais