Total é alvo de queixa-crime por ataque em Moçambique
10 de outubro de 2023Sete sobreviventes ou familiares de vítimas de um ataque fundamentalista islâmico em Moçambique, em março de 2021, apresentaram uma queixa por "homicídio involuntário e omissão de socorro" contra a TotalEnergies, que realizava então um megaprojeto de gás na região.
O grupo petrolífero francês, que na altura ainda se chamava Total, é acusado de uma série de atos de negligência e de não garantir a segurança dos seus subcontratados, disse à AFP o advogado dos queixosos, Henri Thulliez.
Os queixosos, três sobreviventes e quatro herdeiros de duas vítimas, têm nacionalidade sul-africana e britânica.
A TotalEnergies nega qualquer responsabilidade e afirma ter feito tudo o que estava ao seu alcance para salvar o seu pessoal presente no local.
Ataque mortífero
O ataque de Palma, reivindicado pelo grupo extremista Estado Islâmico (EI), iniciou-se a 24 de março de 2021 e durou vários dias, saldando-se por um número desconhecido de vítimas entre a população local e os subcontratados da TotalEnergies.
Maputo anunciou que foram cerca de 30 as vitimas mortais, mas segundo o jornalista 'freelancer' Alexander Perry, que passou cinco meses a investigar em Palma entre novembro de 2022 e março de 2023, o número ascende a 1.402 civis mortos ou desaparecidos -- entre os quais 150 crianças -, incluindo 55 subcontratados.
Na altura, a Total estava a realizar o megaprojeto Mozambique LNG, para explorar uma enorme jazida de gás natural, e estava sediada na península de Afungi, a cerca de dez quilómetros do centro de Palma.
O atentado levou à suspensão do projeto, que representava um investimento total de 20 mil milhões de dólares (cerca de 18,8 mil milhões de euros ao câmbio atual).
O presidente do grupo, Patrick Pouyanné, anunciou recentemente que esperava relançar o projeto antes do final do ano.
Total acusada de negligência
Os queixosos acusam a Total de "negligência na avaliação dos riscos, em contradição com as declarações públicas de Patrick Pouyanné, na altura, segundo as quais a segurança era a prioridade da Total", considerou Thulliez.
"Pensámos que estávamos seguros", repete Nicholas Alexander, um sul-africano de 53 anos e sobrevivente.
Os ataques de fundamentalistas islâmicos têm aterrorizado esta região norte da província de Cabo Delgado desde 2017, "mas estavam a acontecer a 70-80 quilómetros de distância, e como a Total tinha estabelecido um perímetro de 25 quilómetros em torno do seu local de trabalho, sentimo-nos tranquilos", continua.
Os subcontratantes estavam alojados na cidade de Palma.
Em 2019, um dos concorrentes da TotalEnergies, a Exxonmobil, desistiu de investir no projeto e repatriou o seu pessoal.
Segunda queixa numa semana
Desde julho de 2021, milhares de soldados do Ruanda e da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) foram destacados para apoiar o exército moçambicano e ajudaram a recuperar o controlo de uma grande parte da província de Cabo Delgado.
Esta é a segunda queixa criminal contra o gigante petrolífero francês no espaço de poucos dias. A 2 de outubro, quatro grupos ambientalistas apresentaram uma queixa contra o grupo e o seu projeto petrolífero EACOP, na Tanzânia e no Uganda, por "alterações climáticas".
O grupo é acusado de lesão corporal não intencional, destruição, degradação ou deterioração de bens pertencentes a terceiros suscetíveis de criar um perigo para as pessoas e homicídio involuntário.