"Temos um ditador que não ouve os apelos" diz Rafael Marques
12 de abril de 2016"O regime angolano é autoritário. É uma ditadura que criminaliza ideias independentes. Esta postura obriga a pensar sobre o futuro do regime," expressa o ativista e jornalista angolano Rafael Marques em entrevista à DW África, em Lisboa.
A afirmação foi feita em alusão aos 17 jovens condenados a 28 de março último pelo Tribunal de Luanda entre dois a oito anos de prisão efetiva.
Marques está em Portugal para participar do Festival Literário Internacional da Madeira, onde vai expôr situação precária dos 17 jovens ativistas recentemente condenados entre dois a oito anos de prisão, e junta a sua voz ao movimento de solidariedade a nível internacional que tem apelado reiteradas vezes ao Presidente José Eduardo dos Santos para a libertação dos referidos ativistas.
"Qualquer estadista de bom senso teria feito isso. Infelizmente temos um ditador em Angola que não ouve os apelos da sociedade, que não dialoga com a sociedade, e vai levar isso ao extremo. E poderá também ser o seu fim essa sua teimosia," declara.
Condenação política
Os 17 ativistas, também conhecidos por revús, estavam a ser julgados desde 16 de novembro de 2015 "por co-autoria de atos preparatórios para uma rebelião e associação criminosa". Para o jornalista angolano, não se pode esperar nada dos recursos apresentados pelos advogados de defesa.
"Porque tomou-se uma decisão política de condená-los e a decisão de libertá-los também será política, ou por pressão ou porque o objetivo que leva o regime a condenar estes jovens eventualmente terá sido ultrapassado. Mas haverá sempre uma condenação," avalia.
Entre os ativistas detidos, Rafael Marques destaca o caso de Nuno Dala, há mais de 30 dias em greve de fome.
"Não tem assistência de vida. Tivemos o caso de Luaty [Beirão], o ano passado, que mereceu o apoio de muitos escritores a nível internacional, muito apoio a nível local. Temos o caso do Nuno Dala que, daqui a bocado, vai ultrapassar os [36] dias de greve do Luaty e está em condições péssimas. Teve de haver pressão para que lhe pudessem administrar o soro," revela Rafael Marques.
Literatura e liberdade de expressão
O jornalista de investigação, autor do livro "Diamantes de Sangue", é um dos oradores na 6a Edição do Festival Literário Internacional da Madeira, que decorre entre 11 e 16 deste mês. Também participam do evento o escritor angolano Ondjaki e o autor moçambicano Mia Couto.
Rafael Marques disse à DW África que o festival é um momento interessante para falar de literatura e da importância dos livros em Angola.
"Porque depois de 40 anos de independência temos 17 jovens que estão detidos em Angola, foram condenados porque estavam a discutir um livro. Agora, as ideias independentes foram criminalizadas em Angola e não há um fórum melhor do que um festival literário para se aflorar também a questão da liberdade, porque a literatura tem sido ao longo da História um dos principais elementos também de afirmação da liberdade de expressão," considera Rafael Marques.
Denúncias em Washington
Recentemente, num encontro no Departamento de Estado norte-americano, o jornalista angolano denunciou a situação desumana crítica em que se encontram os 17 ativistas colocados em prisões diferentes.
Em Washington, nos Estado Unidos, Marques também falou do caso de José Marcos Mavungo, ativista cabindês dos direitos humanos preso desde março de 2015, e de Arão Bula Tempo, advogado e presidente do Conselho Provincial de Cabinda da Ordem dos Advogados de Angola, igualmente em situação delicada e que deve ir a julgamento em breve.
Rafael Marques teve um encontro com Steve Feldstein, subsecretário de Estado adjunto para os Direitos Humanos, e com Todd Haskell, subsecretário de Estado adjunto para os Assuntos Africanos, durante a passagem pela capital norte-americana.
Na passada sexta-feira (08.04), os Estados Unidos consideraram que as "duras" condenações aplicadas aos ativistas angolanos são uma ameaça à liberdade de expressão e apelaram ao Governo de Luanda pela defesa dos direitos constitucionais dos cidadãos, segundo refere a agência Lusa.