Sul-africanos querem passaportes estrangeiros como "plano B"
1 de novembro de 2018"A tendência já existe na África do Sul e é mais frequente nos tempos em que a confiança no país diminui, seja por problemas como a corrupção, a reforma agrária, a criminalidade ou crises de energia", explica Angel Jones, da empresa de recrutamento sul-africana Homecoming Revolution, que tenta recuperar mão-de-obra no estrangeiro em nome de empresas sul-africanas.
"Sempre que há uma onda de perda de confiança no país, vemos sul-africanos a tentarem garantir aquilo a que chamamos 'pacote de segurança'", diz Jones em entrevista à DW.
Em 2017, cerca de 900 mil sul-africanos viviam no estrangeiro, segundo dados da empresa de estatísticas Eighty20. As maiores comunidades encontram-se no Reino Unido (210 mil pessoas), Austrália (190 mil) e Estados Unidos (100 mil). O Ministério do Interior da África do Sul não publica dados oficiais sobre a saída e regresso de cidadãos sul-africanos ao país.
A Homecoming Revolution faz as suas análises a partir de contatos com empresas especializadas em serviços de relocalização, universidades privadas e outras fontes. A situação política na África do Sul é geralmente um fator crucial na decisão de partir para o estrangeiro, diz Angel Jones. Em 2015, quando o então Presidente Jacob Zuma demitiu inesperadamente o ministro das Finanças, Nhlanhla Nene, registou-se uma onda de pedidos de passaportes estrangeiros.
Uma relação de amor-ódio com a África do Sul
"Vemos estes fluxos de pessoas a irem e a virem a toda a hora e a África do Sul está sempre nesta montanha-russa do bom e do mau", diz Jones. "Mas já recuperámos muitas vezes no passado e vai voltar a acontecer".
A questão da terra é especialmente delicada. Os sul-africanos brancos, que constituem apenas 10 por cento da população, continuam a deter 72 por cento dos terrenos agrícolas do país. Alguns políticos da oposição e cidadãos que enfrentam dificuldades económicas exigem a rápida redistribuição de terras.
O partido no poder, o Congresso Nacional Africano, anunciou planos para reformas constitucionais que permitiriam expropriar terras sem pagar indemnizações.
Angel Jones considera que o Presidente Cyril Ramaphosa está a tentar agradar a todos os investidores e pede a restituição de terras. "Seria melhor se ele fosse mais claro nesta questão", diz à DW. Muitos africanos vêem Ramaphosa como um homem de negócios de sucesso e um líder de confiança. Quando subiu ao poder, no início do ano, o número de pessoas que regressaram do estrangeiro triplicou, segundo a Homecoming Revolution.
As consequências da "fuga de cérebros"
As oportunidades de emprego no estrangeiro são particularmente atraentes para os jovens sul-africanos, diz Jones. Isto, no entanto, levou à fuga dos trabalhadores mais qualificados do país. Jovens professores, por exemplo, têm boas perspectivas de carreira nos Emirados Árabes Unidos, mas faltam docentes nas escolas sul-africanas.
Jonty Leon, gestora na empresa sul-africana Financial Emigration, considera que este é um problema grave. "Estamos a perder os nossos médicos, engenheiros, advogados e especialistas financeiros. São aqueles que ganham mais e contribuintes importantes", afirma.
Mas também os sul-africanos mais velhos emigram. O denominador comum: têm dinheiro e podem pagar o caminho para uma entrada legal na Europa. "Os clientes sul-africanos que conheço não estão necessariamente a tentar emigrar, mas sim a investir num plano B", diz, por sua vez, Amanda Smit, que coordena o escritório da Henley & Partners na Cidade do Cabo. A empresa de consultoria baseada em Londres trabalha com pedidos de cidadania e vistos de residência.
Preparar o futuro
"Vários fatores influenciam a solicitação de um segundo passaporte, ou dupla cidadania. Há mais mobilidade global do que antes. Os sul-africanos que emigram reconhecem que têm mais privilégios e benefícios para si e para as suas famílias se tiverem dupla cidadania ou visto de residência no estrangeiro. Há melhores condições de viagem, mais segurança para o futuro, melhores oportunidades financeiras e de negócios", explica Amanda Smit.
No escritório da Henley & Partners, o número de requerimentos de dupla cidadania subiu 229 por cento em apenas um ano. Entre os requerentes, 55 por cento são brancos e 45 por cento negros sul-africanos.
Os países mais populares para pedidos são Malta, Chipre, Moldávia e Portugal. E por uma razão simples: os passaportes desses países são mais fáceis de obter através da compra de propriedades, por exemplo.
Entretanto, o passaporte sul-africano é válido em apenas 102 países. Os centros económicos mais poderosos, como os Estados Unidos, Grã-Bretanha e do espaço Schengen na Europa são excluídos.