“STAE e CNE influenciaram ilicitamente as eleições no Gurué”, diz Araújo
19 de março de 2014O presidente do Município de Quelimane, Manuel de Araújo, participa do chamado “Programa de Convidados” do governo da República Federal da Alemanha, que neste ano discute o tema “descentralização”.
O evento em Berlim conta anualmente com a participação de personalidades políticas de diversos países que visitam instituições públicas e fundações alemãs. Neste ano, participam delegações de Angola e Moçambique.
A troca de experiências ocorre em nível autárquico, estadual e municipal e tem diversas discussões ao longo de quatro dias - como a transformação das cidades e municipalidades e a experiência alemã no âmbito da descentralização e federação.
Manuel de Araújo, do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), é um dos nomes emergentes de maior força na política moçambicana, tendo sido reeleito para estar à frente do executivo da capital da Zambézia nas últimas eleições autárquicas.
Apesar da agenda apertada em Berlim, o Presidente de Quelimane encontrou uma brecha para conversar com a DW-África sobre as eleições e o modelo de governação discutido na Alemanha.
Nesta entrevista, ele fala sobre as eleições do próximo dia 15 de Outubro em Moçambique e dispara contra o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE) e à Comissão Nacional de Eleições (CNE), afirmando que foram órgãos que teriam “influenciado ilegalmente” o pleito no Gurué.
DW-África: O que o Senhor tem visto de positivo no modelo de governação alemão?
Manue de Araújo: Se tivéssemos que observar ou nos inspirar em um modelo, eu penso que a experiência alemã é aquela que mais se aproxima da verdadeira autarquia porque “autarquia” significa “governo autônomo”. Aqui nós conseguimos ver os poderes que as autarquias têm em termos patrimoniais, financeiros e administrativos. Eu acho que há alguns elementos que podem ser emprestados deste modelo que virão a ser benéficos para a gestão dos assuntos locais em Moçambique. Pensamos que é uma experiência a ter em conta e que há aspectos, especialmente nas fianças locais, que nós poderíamos emprestar e aplicar no caso moçambicano.
DW-África: Como é gerir um município cuja gestão financeira está ligada à governação central, que está nas mãos de um outro partido?
Manuel de Araújo: Agora a situação melhorou um pouco porque, nas últimas eleições [autárquicas] de 20 de novembro, nós conseguimos ter 69% do legislativo de Quelimane. Mas durante dois anos, eu estava a dirigir um município sem bancada. Para fazer aprovar o orçamento e o plano de atividades eu dependia da boa vontade ou da minha capacidade de negociação tanto com a bancada da RENAMO como a da FRELIMO.
DW-África: As eleições gerais estão à porta, previstas para 15 de Outubro. Para este pleito, o que Manuel Araújo ou o MDM pretende tomar emprestado da governação alemã?
Manuel de Araújo: Que os órgãos eleitorais sejam transparentes. Por acaso, hoje, [os novos integrantes da Assembléia Municipal] tomam posse no Gurué. Nós vimos que as eleições tiveram de ser anuladas no Gurué porque o STAE, a CNE ou a FRELIMO tentaram influenciar ilicitamente às eleições. A fraude nas eleições [é uma palavra que] deve ser banida do dicionário político moçambicano. Esta é uma boa prática que gostaríamos que todos os atores políticos de Moçambique se inspirassem. Nós queremos eleições livres. Também gostaríamos de contar com a observação de integrantes de partidos, de fundações e organizações da União Europeia ou do Estado alemão em vários níveis.
DW-África: A atual composição da CNE e do STAE vão favorecer maior transparência e justiça nos próximos processos eleitorais em Moçambique?
Manuel de Araújo: Nós pensamos que não, mas dize-se: “quem não tem cão caça com gato”. Quando fomos às autárquicas, estávamos em pior posição do que agora. Melhorou um pouco, mas ainda não chegamos ao nível desejado.
DW-África: A observação internacional dos processos eleitorais seria uma alternativa?
Manuel de Araújo: No caso do Gurué e de Quelimane, a presença da observação nacional e internacional foi fundamental. Se não tivéssemos os observadores, os resultados não teriam sido aqueles que temos hoje. Para nós é crucial.
DW-África: Em Moçambique pratica-se muito a pré-campanha eleitoral em um contexto ilegal. Isso já está a acontecer com o partido FRELIMO. Como esperar um ponto-final nesta situação?
Manuel de Araújo: Ainda bem que estão aqui conosco quadros do Estado moçambicano. Espero que aprendam desta experiência. Mesmo agora, no Niassa, o Presidente da República está a apresentar o candidato da FRELIMO, o que eu acho ilegal – usar fundos do Estado para fazer campanha eleitoral de um partido.