Sociedade civil luta pelo Tribunal Africano dos Direitos Humanos
28 de novembro de 2012A União dos Advogados Panafricanos e o Centro de Litigação da África Austral pediram um parecer ao Tribunal Africano dos Direitos Humanos sobre a legalidade da suspensão do Tribunal da SADC, a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral. Recorde-se que, em agosto passado, a pedido do Zimbabué, os estadistas da região suspenderam o Tribunal. Isto porque Harare não quis aceitar uma condenação por expropriação ilegítima.
As organizações lembram que o Tribunal é vital para vários setores. A propósito, a DW África falou com João Nhampossa,(JN) pesquisador do Centro de Direitos Humanos na Universidade Eduardo Mondlane, em Moçambique.
DW África:A suspensão do Tribunal significa um retrocesso no que foi conseguido, até aqui, em matéria de direitos humanos?
JN: Em princípio, eu diria que sim. Porque quando foi constituído este tribunal, foi uma grande vitória para a sociedade civil e para os próprios governos da SADC. E esta decisão, sobretudo por causa da iniciativa do Zimbabué, traz um retrocesso nos direitos humanos, porque agora não é fácil levar os casos ao Tribunal dos Direitos Humanos, para resolver casos que não era possível resolver dentro dos Estados-membros.
DW África: Porque é que os casos não podem ser resolvidos a nível nacional?
JN: Os nossos tribunais, falo sobretudo de Moçambique, Angola e Zimbabué, não têm grande capacidade de intervenção em matéria de direitos humanos. O tribunal tem uma grande influência política, e o seu funcionamento depende, de facto, da vontade e dos interesses políticos. Quem fica a perder é o cidadão que vê os seus direitos humanos violados dia após dia, sem ter uma instituição própria com força para o defender. Em ações contra o Estado, ou ações contra as grandes empresas, que hoje em dia também estão envolvidas em questões de direitos humanos, é difícil a defesa no tribunal.
DW África: Esta suspensão pode ser vista como uma tentativa da SADC de ajudar o Zimbabué a expor-se menos no cenário internacional, considerando que o país tem sido alvo de várias críticas, nomeadamente na exploração de diamantes, no que se refere aos direitos humanos?
JN: Penso que, em primeiro lugar, os Estados da SADC procuram defender-se a si. O caso do Zimbabué abriu um precedente. Os outros países, em situações críticas também, a primeira coisa que fizeram foi defender-se a eles próprios. Através disso também defendem o Zimbabué, porque este país hoje ganha mais força, mesmo no caso da violação dos direitos humanos.
DW África: Pode-se dizer, mediante estes acontecimentos, que há uma falta de democracia e liberdade, ou mesmo ditadura, na África Austral?
JN: Não defendo que haja ditadura. Mas há uma democracia muito enfraquecida, que nos leva a situações críticas, que podem parecer ser de uma ditadura, pelo menos momentânea. Mas a verdade é que a democracia, como ela é definida nas nossas leis, não está a ser aplicada pelos nossos Estados. Por isso não podemos dizer que sim, trata-se de uma democracia, conforme prevista nas nossas Constituições. A política que é posta em prática viola a democracia e, automaticamente, põe em causa os direitos humanos. A democracia enfraquecida limita fortemente a nossa liberdade de expressão, e a opinião expressa, ainda que importante, não tem efeito vinculativo para os nossos Estados.
DW África: Existe algum mecanismo que possa pressionar os estadistas da SADC a recuarem na decisão?
JN: Depende da coragem da sociedade civil em não desistir e em aumentar a pressão, porque os nossos Estados têm boas Constituições. Só que, no plano prático, a implementação das leis é muito fraca, há muito secretismo que, de certa forma, amedronta tanto os jornalistas como a sociedade civil em geral. Os defensores dos direitos humanos ficam em silêncio. Se nós usarmos os nossos instrumentos, as nossas leis, penso que podemos avançar. Os instrumentos já existem, falta é a coragem de usar os nossos instrumentos.
Autora: Nádia Issufo
Edição: Cristina Krippahl/António Rocha