Sociedade civil de Moçambique rejeita ProSavana
6 de junho de 2013Os subscritores da carta divulgada esta quinta-feira (6.06) querem ser consultados antes que se dêem de novos passos na implementação daquele projecto, lançado em abril de 2011 no centro e norte de Moçambique.
A carta é dirigida aos presidentes de Moçambique e do Brasil e ao primeiro-ministro do Japão, os tres países que estão envolvidos no ProSavana.
O Programa ProSavana é um megaprojecto que irá ocupar uma área estimada em 10,7 milhões de hectares de terra em 19 distritos das províncias do Niassa, Nampula e Zambézia (as últimas duas as mais populosas do país). De acordo com o governo, o objectivo do programa é contribuir para o combate a pobreza, através do desenvolvimento da agricultura em grande escala nas savanas tropicais localizadas ao longo corredor de desenvolvimento de Nacala, em Nampula.
"Implementação pode ter consequências", dizem subscritores da carta
António Muagerene, Secretário Executivo da Plataforma da Sociedade Civil em Nampula, afirma que, depois de vários debates ao nível das comunidades abrangidas pelo programa, temem-se impactos negativos.
"O surgimento de comunidades e famílias sem-terra em Moçambique, convulsões sociais e conflitos sócio-económicos nas comunidades ao longo do corredor de Nacala", são apenas dois exemplos. Entre as possíveis consequências do ProSavana, diz Muagerene, estão também "o agravamento e aprofundamento da miséria nas comunidades rurais e a redução das alternativas de sobrevivência e resistência", bem como "a destruição do sistema de produção familiar camponês e a insegurança alimentar".
O ambiente é uma área que também preocupa os subscritores da carta, com o Secretário Executivo da Plataforma da Sociedade Civil em Nampula a apontar "a poluição de ecossistemas, devido ao uso de agro-tóxicos e o desequilíbrio ecológico" como "consequências do agro-negócio em grande escala".
Os subscritores da carta queixam-se de que este projecto está a ser implementado sem nunca ter sido aprovado o estudo de avaliação ambiental. Vanessa Cavanelas, da ONG Justiça Ambiental, frisa que "não está definido ainda como é que vai ser feito o estudo de impacto ambiental ou não foi informado ainda como é que será".
"A pouca informação que tivemos é que os pequenos projetos que fazem parte do programa farão um estudo para cada projeto o que, para nós é irresponsável", explica Vanessa Cavanelas, considerando que os projetos "estão todos situados numa mesma grande área e os impactos deveriam ser analisados de forma cumulativa e não fragmentada".
Sociedade civil alerta para expropriação, governo nega
Uma das preocupações dos subscritores da carta tem a ver com o facto de o programa não prever o reassentamento dos camponeses que serão obrigados a abandonar as suas terras.
"Queremos saber que modelo vai ser aplicado porque não queremos o modelo que aconteceu no Brasil", diz Augusto Mafigo, Presidente da União Nacional dos Camponeses. Nesse modelo, recorda, "as pessoas perderam as suas terras e estão sem elas até hoje". Por isso, Mafigo aconselha: "devia-se parar, sentar e explicar e nós também poderíamos propor a nossa ideia".
O Governo moçambicano veio a público nos últimos dias afirmar que o programa visa contribuir para resolver a crise alimentar no país e que não estava prevista a expropriação de terras. Por seu turno, o governo japonês reconheceu já, de acordo com a carta, as limitações e deficiências do primeiro esboço do projeto e mostrou-se aberto ao debate.
António Reina, Director da ONG Livaningo, rebate a posição do governo. "O objectivo do projeto é fazer agro-negócio, fazer agro-indústria, não é para resolver os nossos problemas", afirma. "Toda a gente sabe que esse tipo de países promove a produção das chamadas comodidades em vários países porque, no seu território, já não tem espaço. Promovem essas produções para quê?", questiona, respondendo imediatamente: "para que os preços dessas comodidades se mantenham estáveis e sejam mais baratas para eles, a importação".
"Eles não estão preocupados se comemos ou não comemos. Se o nosso nível de pobreza é mais de um dólar ou menos de um dólar", conclui.