Sociedade civil angolana está menos vibrante
29 de agosto de 2012
As terceiras eleições gerais de Angola, desde a independência em 1975, estão a agitar o país. No círculo político chovem críticas ao processo eleitoral: desde o domínio do partido no poder, o MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), nos meios de comunicação social; a inauguração de obras em plena campanha do Presidente e candidato José Eduardo dos Santos; ou a conduta da Comissão Nacional Eleitoral (CNE).
Mas também a sociedade civil lança críticas. Está desmotivada, considerando que o processo eleitoral representa um “fracasso” na democratização do país. Serra Bango, da Associação angolana Justiça Paz e Democracia (AJPD), considera que “a participação da sociedade civil no processo eleitoral não tem sido a mesma comparativamente a 2008. No contexto de 2008, havia muitas organizações que dependiam de financiamentos externos, que já se retiraram de Angola”.
Com perda de financiamento, a maior parte das organizações da sociedade civil tem menos margem para atuar, “o que foi empobrecendo, em termos infraestruturais e humanos, a [sua] capacidade interventiva”. Assim, apenas as associações e organismos que recebem apoio do Estado disponibilizam de meios e, assim, “fazem a campanha, propaganda e o branqueamento da imagem do governo e do Presidente”, afirma Serra Bango.
Fechar os olhos às leis
O ativista integra a equipa da AJPD, que procura, desde 2000, contribuir para uma participação ativa, consciente e responsável dos cidadãos angolanos no processo de consolidação da democracia. Serra Bango alerta para “vícios” do processo eleitoral anterior que também são verificados no presente, apontando “a lei eleitoral que prevê que todos os partidos concorrentes recebam uma cópia da ata síntese do apuramento preliminar dos resultados. Mas a CNE já disse que não vai fazer isso”.
Além disso, no terreno, esclarece o ativista angolano, “em relação ao mapeamento das assembleias de voto, que devem ser claramente discriminadas, algumas delas, segundos informações que temos vindo a receber, não existem no mapeamento, mas fisicamente já existem. E dizem que, nalgumas delas, o processo de votação terá começado ao arrepio da lei”.
O ativista refere também que a Associação Justiça Paz e Democracia tem informações de que a Casa Militar da Presidência da República atua no processo eleitoral. Segundo o ativista, o órgão tratou também de fazer a distribuição da logística das eleições de 2008.
Suspeições e desprezo
Serra Bango critica também a CNE por não ter ainda credenciado os observadores nacionais e internacionais, o que se espera que seja feito esta quarta-feira (29.08), último dia da campanha eleitoral. Tanto este como outros factores conferem à CNE pouca credibilidade, na opinião do responsável.
"Sobre o sistema instalado para contabilizar os votos, levantam-se muitas suspeições, pelo facto de não ter sido auditado, de a solução tecnológica apresentada não garantir segurança aos partidos concorrentes, sobretudo àqueles que fazem verdadeiramente oposição”.
A oposição política assim como a sociedade civil parecem não ter espaço para repirar. Os meios de comunicação social atuam com "parcialidade", destacando o MPLA. Serra Bango acrescenta que o partido no poder, nos últimos anos, "implementou as suas medidas de repressão, coação moral, sobre todos aqueles que não comungassem das políticas do regime”.
Por isso, “sentimos que, da parte da população, há um conhecimento dessas irregularidades, há um desprezo, falta de interesse em relação ao processo”, complementa o ativista.
Educação cívica deve ser mais ampla
Face a irregularidades no ciclo eleitoral em Angola, a AJPD decidiu não participar no processo tanto como observador como na área de formação de educação cívica. Porque entende "que a educação cívica não deve ser feita apenas em 30 dias, como é a pretensão do governo", mas num "ciclo, portanto, quando terminaram as eleições de 2008 deveria ter começado a educação cívica".
O governo do MPLA lançou em 2009 a política de tolerância zero. Mas Serra Bango entende que, ao invés de promover a transparência, o partido no poder fomentou a corrupção eleitoral.
Autora: Glória Sousa
Edição: Márcio Pessôa / António Rocha