Privatização pode fazer bem à Sonangol, avalia economista
11 de outubro de 2018Num encontro em que a Comissão Instaladora da Agência Nacional de Petróleo e Gás (ANPG) apresentou às operadoras o modelo de reajustamento da organização do setor petrolífero, esta quarta-feira (10.10) em Luanda, o ministro Recursos Minerais e Petróleos, Diamantino Azevedo, disse que o processo levará à privatização de algumas empresas "non core" do grupo Sonangol e ainda à privatização parcial, no futuro, da Sonangol, com ações cotadas em bolsa de valores.
Em entrevista à DW África, o economista e investigador da Universidade Católica de Angola, Francisco Miguel Paulo, mostra-se otimista com os planos de se privatizar parte da estatal angolana.
DW África: É a favor da privatização da Sonangol?
Francisco Miguel Paulo (FMP): A Sonangol é uma empresa pública e o Estado angolano faz dela o que bem entender. É óbvio que, se estão com esse processo é porque é uma evidência de que o modelo atual não funciona como deveria ser. É por isso que estão a ir para este modelo de privatização parcial.
Provavelmente poderá tornar a empresa mais competitiva e também poderá resultar numa clara distinção entre as receitas da Sonangol como empresa e as receitas do Estado. Atualmente, a Sonangol age como empresa e também é a concessionária nacional.
Agora, com a Agência Nacional de Petróleos e Gás, que vai provavelmente assumir o papel de concessionária, aí teremos já entidades completamente distintas.
DW África: Então vê a privatização com bons olhos?
FMP: sim, poderá melhorar a eficiência da Sonangol dedicar-se apenas ao seu negócio principal que é a extração, pesquisa e produção de petróleo. E, de fato, todas aquelas empresas que não têm nada a ver com o seu negócio principal podem ser muito bem privatizadas. Se não, torna-se uma estrutura muito pesada.
DW África: A privatização parcial, no futuro, da Sonangol, com ações cotadas em bolsa de valores conforme anunciado pelo ministro dos Recursos Minerais e Petróleos, Diamantino Azevedo, significa mais transparência?
FMP: É claro. Em princípio, toda empresa com ações na bolsa tem que ter as contas em dia. Todas as peças contabilistas devem ser auditadas para que os investidores decidam comprar, ou não, as ações dessa empresa.
Cotando a Sonangol na bolsa, isso é um sinónimo, de fato, de transparência, porque terá que ter contas em dia. É uma forma também de recapitalizar a empresa, porque em vez de ser o Estado o único financiador, havendo cotação na bolsa, sempre que a empresa precisar de financiamento pode recorrer à bolsa para obter dinheiro para fazer novos financiamentos.
E os investidores que vão lá colocar dinheiro vão querer que a empresa tenha uma eficiência produtiva boa, que vai permitir o retorno do investimento.
DW África: Em termos de transparência, essa medida basta, ou são necessárias outras medidas?
FMP: Não, tem que haver maior transparência, não é? Aquando da privatização, há uma grande necessidade de se saber qual é o valor ativo da Sonangol. Quanto vale a Sonangol no mercado? É importante que se faça esse trabalho, fazer uma avaliação da própria empresa. E, na fase da privatização, a quanto é que as ações serão comercializadas.
DW África: Sobre essas empresas fora da atividade central do grupo Sonangol que devem ser privatizadas, porque elas devem ser privatizadas primeiro?
FMP: A Sonangol é um grupo. Tem investimentos na área da aviação, temos ainda uma parte da Sonangol que lida com a questão imobiliária. Ou seja, tem muitas empresas que muitas vezes não têm nada a ver com o seu “core business” [ou negócio central, em português] que é a produção e comercialização de petróleo.
Há que se desfazer essas empresas todas e há que se focalizar apenas no seu negócio principal.
DW África: Ainda segundo Diamantino Azevedo, o novo modelo pretende "conferir maior eficiência à Sonangol e eliminar conflitos de interesse": É mesmo assim ou deixa espaço para a corrupção?
FMP: Não esquece a forma como a Sonangol atua. Além de ser operadora, embora a produção real da Sonangol em termos de barris, não sei se chega a 10% da produção total do país. Então, tem uma estrutura muito pesada.
Se o próprio ministro disse que isso vai evitar conflitos de interesses, ele sabe o que está a dizer.
DW África: No final do mês de setembro, ao aprovar o Programa de Reestruturação da Sonangol a Presidência da República apresentou a medida como tendo a finalidade de "encontrar soluções capazes de contribuírem para a sustentabilidade e crescimento da indústria petrolífera em Angola". De que forma a privatização contribuirá para isso?
FMP: É assim: Numa sociedade, quando entram novos investidores, terão novas ideias para poder atuar e também poderão propor novas estratégias. Apesar de o setor petrolífero ser o que mais motiva a economia nacional - em termos das receitas de exportação e mesmo em termos das receitas fiscais – os angolanos não têm "expertise" [conjunto de habilidades e conhecimentos], não têm aqueles "skils" [ou, habilidades] na própria indústria. A maior parte dos trabalhadores qualificados do setor são estrangeiros.
Ou seja, de seguir exemplos como o da Noruega. Que a função não seja apenas extrair o petróleo, mas agregar todos os serviços associados à indústria petrolífera. O país devia ter capacidade de fazer isso.
DW África: Que resultados espera da privatização da Sonangol?
FMP: Que isso beneficie o país, beneficie a própria indústria, em si. Neste processo de reestruturação, o próprio Governo tem isso em mente.