Presidência contestada de Angola no Processo de Kimberley
14 de novembro de 2014José Patrocínio, da associação angolana de defesa dos direitos humanos OMUNGA, diz que a entrada de Angola para a presidência do Processo de Kimberley é importante, porque "dá mais transparência", pelo que espera que daqui possam advir melhorias "não só para Angola mas para os diferentes países". No entanto, acrescenta ter "muitas dúvidas" que "isso possa representar uma melhoria direta da situação”.
O ativista aponta a situação nas Lundas que "demonstra que não há uma mudança a nível do processo de exploração dos diamantes" e muito menos se regista um "benefício para a população" derivado do comércio.
Os deveres da sociedade civil
A OMUNGA, que também já apoiou a candidatura de Angola a membro não permanente do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), considera que presidir o Processo de Kimberley é mais uma porta que se abre para os angolanos. Mas José Patrocínio deixa um aviso: "Cabe-nos também a nós, internamente, enquanto sociedade civil, fazer determinadas exigências no sentido de que isso vá pelo caminho certo. Nós cidadãos devemos precisamente aproveitar estas oportunidades para exigir, para pressionar, para tentar negociar inclusivamente, no sentido de que isto traga benefícios e que não vá pelo sentido inverso".
O Processo de Kimberley visa a certificação da origem de diamantes, processo produtivo e exportação, para garantir que pedras preciosas provenientes de áreas de conflito sejam negociadas nos mercados mundiais.
O sistema foi criado em 2002, tendo entrado em vigor no ano seguinte, com o apoio da ONU, para impedir que o comércio internacional de diamantes em bruto financie a guerra. Essas pedras preciosas são apelidadas de "diamantes de sangue" pelos conflitos que alimentaram durante décadas em África.
A invasão silenciosa
David Mavinga, do partido na oposição Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), saudou também a eleição do seu país para presidir o Processo Kimberley: "Para nós é sempre uma alegria Angola pertencer a essas organizações para defender os interesses de África em particular, e porque não do mundo?”
Mas também David Mavinga espera que a presença de Angola na direção do Processo de Kimberley contribua para a melhoria da situação dos direitos do homem na região diamantífera das Lundas: "Antes do multipartidarismo havia a proibição da exploração de diamantes. E hoje há uma lei, até porque os nossos diamantes nunca foram diamantes de sangue". Mavinga diz que o verdadeiro problema é "a invasão silenciosa dos povos vizinhos" e espera que um reforço da guarda das fronteiras ajude a resolvê-lo.
Já Betinho Cassoca, do Movimento do Protetorado Lunda Tchokwe, defende que a presidência do Processo de Kimberley não deve ser entregue a Angola, "porque Angola continua a usurpar os direitos da Lunda. A Lunda continua a reclamar os seus direitos. De certeza absoluta que não vai mudar nada", uma vez que o Presidente José Eduardo dos Santos, os seus filhos e alguns generais têm interesses a defender na região.
As vítimas das minas dos generais
Segundo Betinho Cassoca, seria bom que os povos das Lundas beneficiassem da exploração dos diamantes, porque ali falta tudo: escolas, saúde, habitação, respeito pelos direitos dos cidadãos, emprego e muito mais: "Dia após dia, a Lunda sempre chora, constantemente, porque as minas dos generais continuam a fazer vítimas. A situação não muda."
A produção diamantífera é uma das principais fontes de receitas em Angola, depois do petróleo, tendo o Estado arrecadado mais de 52 milhões de euros em impostos diretos sobre estas vendas entre janeiro e setembro deste ano, indicam dados oficiais.
Estima-se que Angola produza, por ano, cerca de 8,3 milhões de quilates de diamantes, o equivalente a uma receita bruta de aproximadamente 886 milhões de euros. O Ministério angolano da Geologia e Minas definiu, como meta, aumentar a produção total de diamantes, até 2015, em cinco por cento ao ano.