Países da CPLP debatem agronegócio no Brasil
16 de abril de 2014Vivendo no Brasil desde 1997, o professor cabo-verdiano Paulino Tavares almeja o dia em que o seu país não precise mais de importar produtos básicos da alimentação. “O caminho é a agricultura. Não adianta países como Cabo Verde importarem tomate, cebola, coisas básicas que poderiam ser produzidas com novos conhecimentos, novas tecnologias, novas cooperações. Nós temos que aprender”, afirma.
Doutor em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (URGS), Paulino coordena o primeiro Simpósio Internacional do Agronegócio da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), que começou dia 15 e vai até 17 de abril, na Universidade Federal de Santa Maria.
Aproximar países membros em torno do agronegócio
De acordo com o docente, os países membros da comunidade precisam estreitar laços não apenas entre governos, mas também com instituições de ensino. “O primeiro motivo é criar esse espaço para que os países comecem a discutir a questão do agronegócio", começa por afirmar, para justificar a criação do evento. E continua: "a CPLP tem que chegar nos municípios, estados, organizações, universidades e institutos federais. As cooperações não podem ser só no sentido formal, tem que ter uma certa proximidade que ajude a transformar e desenvolver os países”.
O estado do Rio Grande do Sul, onde o simpósio acontece, é um dos maiores produtores agrícolas do Brasil, com destaque para o arroz e a soja. Em 2013, impulsionado pela agropecuária, o estado teve crescimento de 5,8% do Produto Interno Bruto (PIB), expansão maior do que a nacional, que fechou em 2,3%, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O caso do ProSavana em discussão
Mas, para além dos números de crescimento e experiências positivas na agricultura brasileira, é preciso avaliar com cautela as iniciativas de cooperação com outros países. Felipe Amin Filomeno, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), e doutor em Sociologia pela Johns Hopkins University, nos Estados Unidos, apresenta no simpósio uma pesquisa sobre a cooperação entre Brasil e Moçambique, especialmente o projeto agrícola ProSavana, atualmente em fase de implementação, que, juntamente com esses dois países, conta com a participação do Japão.
"O que eu tenho pesquisado como antecedente histórico ao ProSavana é o caso do Paraguai, que, assim como Moçambique, é um país menos desenvolvido que o Brasil, e que recebeu desde os anos 1960, progressivamente, uma onda de transnacionalização do agronegócio brasileiro", conta Filomeno.
"Eram programas de cooperação que envolviam tanto a agricultura familiar quanto o agronegócio em larga escala, naquela expectativa oficial de que as duas coisas fossem caminhar lado a lado, mas, na prática, o agronegócio acaba se expandindo em detrimento da agricultura familiar, então, há o medo da gente estar exportando esse modelo para Moçambique", explica o professor da UFSC.
Outro ponto que gera preocupação é o modelo brasileiro de agronegócio industrializado, com uso intensivo de agroquímicos. O Brasil consome cerca de 14 agrotóxicos proibidos no mundo e é o maior consumidor desse tipo de produto. De acordo com Felipe Filomeno, o Fundo Nacala para investimentos privados, alinhado ao ProSavana, tem como medida de apoio à agricultura familiar moçambicana o acesso mais barato à pesticidas.
"Em relação ao uso do agrotóxicos, não encontrei até agora nos documentos do ProSavana uma política específica de estímulo à agricultura orgânica ou à agricultura agroecológica", diz.