Parlamento português chumba condenação a Angola
1 de abril de 2016Antes da votação na tarde desta quinta-feira (31.03) já se sabia que os votos de condenação à sentença dos 17 ativistas angolanos, apresentados pelo Partido Socialista (PS) e pelo Bloco de Esquerda (BE), seriam rejeitados no Parlamento, sobretudo pelo Partido Social Democrata (PSD), Partido Popular (CDS-PP) e Partido Comunista Português (PCP).
BE e PS criticaram a condenação dos ativistas, incluindo o luso-angolano Luaty Beirão, a penas entre 2 a 8 anos de prisão, anunciada na última segunda-feira (28.03) pelo Tribunal de Luanda.
O PSD, principal partido da oposição, rejeitou os dois documentos por "razões de coerência" e por entender que constituem uma ingerência na justiça angolana, afirmou o líder da bancada parlamentar, Luís Montenegro.
"O princípio do respeito pelas decisões judiciais – e esta não é de resto uma decisão final, visto que ainda é passível de recurso – e o princípio do respeito pela separação de poderes devem estar presentes nas nossas intervenções, em todas as circunstâncias", justificou. Luís Montenegro defendeu a estabilidade nas relações institucionais entre Portugal e Angola, onde vivem e trabalham muitos portugueses.
"Angola é uma ditadura"
Por sua vez, os bloquistas condenaram o "silêncio cúmplice" do Governo português, alegando que em relação a este julgamento emitiu um comunicado que transparece prudência diplomática para não beliscar as relações políticas e económicas entre os dois países.
Na quarta-feira (30.03), durante o debate quinzenal com o Governo, a coordenadora do BE, Catarina Martins, afirmou que a "decisão política" do poder judicial angolano confirmou que "Angola é uma ditadura". Sublinhou ainda que o "silêncio cúmplice", seja em nome de negócios ou política, é algo "inaceitável".
Catarina Martins desafiou o primeiro-ministro português, António Costa, a pronunciar-se a favor da libertação dos jovens ativistas. "Estamos num debate no Parlamento português, que é casa de liberdade e democracia, e penso que este é o lugar para o senhor primeiro-ministro deixar uma palavra clara pela libertação dos presos políticos de Angola".
Acusações de ingerência
Em resposta, António Costa limitou-se a repetir parte do comunicado emitido esta semana pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros. Na nota oficial, o Governo português fez saber que "toma boa nota" da comunicação expressa pela defesa, da intenção de apresentar recurso judicial em face da gravidade e dimensão das penas decididas pelo tribunal de primeira instância de Angola.
Em declarações aos jornalistas, o chefe da diplomacia portuguesa, Augusto Santos Silva, disse confiar na justiça angolana e que "o processo seja agora tramitado de forma a que os direitos humanos sejam respeitados". Um desses direitos, acrescentou," é o direito à oposição por meios pacíficos às autoridades constituídas em qualquer momento".
O ministro português rejeitou também que a posição da diplomacia europeia quanto à condenação dos ativistas represente uma ingerência nos assuntos internos de Angola, classificando-a como sinal de empenho nos direitos humanos. Santos Silva reagia às declarações do secretário de Estado das Relações Exteriores angolano, Manuel Augusto, que disse ser "inamistosa" a postura dos diplomatas da União Europeia ao emitirem uma declaração sobre o julgamento sem antes consultarem o Governo angolano.
Manifestações
O voto de condenação do BE junta-se às manifestações de indignação registadas em Portugal, que suscitaram reação imediata do embaixador itinerante de Angola, António Luvualu de Carvalho.
Sublinhando que "a principal entidade interessada em garantir o bem-estar dos seus cidadãos é o Estado angolano", o diplomata afirmou que as manifestações "podem e devem acontecer" e lembrou que "isso tem acontecido em Portugal, no Rossio, em Luanda, no 1º de Maio ou em outra parte qualquer".
"Estamos num mundo livre. Quem certamente não sentir que alguns interesses vão de encontro com aquilo que pensa deve procurar as suas formas de expressão", acrescenta Luvualu de Carvalho que, no entanto, considera que as questões dos direitos humanos não se resolvem com manifestações na baixa lisboeta.