Ossufo Momade: "Combatentes da RENAMO querem futuro digno"
30 de julho de 2018Em entrevista à DW África, Ossufo Momade confirma que Moçambique continua a aguardar a reintegração dos homens armados da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) nas Forças de Defesa e Segurança (FDS), no âmbito do diálogo para a paz. No dia 21 de julho, expirou o prazo de dez dias que a RENAMO tinha para entregar ao Governo a lista de oficiais a serem incorporados nas FDS.
O líder interino do maior partido da oposição afirma que o documento está a ser elaborado e avança que deverá ser assinado nos próximos dias. Momade diz ainda que a RENAMO não precisa de armas, bastando "boa vontade das duas partes". O líder da RENAMO também falou da desmilitarização do seu partido, processo que vai ser iniciado em breve e de forma "digna e organizada".
DW África: Como vai o processo de integração dos oficiais da RENAMO nas Forças de Defesa e Segurança moçambicanas? Foi cumprido o prazo estabelecido a 11 de julho?
Ossufo Momade (OM): Neste momento está a ser elaborado o documento para que enquadramento dos oficiais da RENAMO nas FDS aconteça de facto. O processo ainda não se iniciou, mas trata-se de um processo que, tudo indica, vai iniciar em breve.
DW África: Havia um prazo de dez dias para concluir o processo, a partir do dia 11 de julho...
OM: É um processo complexo. Dentro de dias poderá ser assinado o documento por mim próprio e pelo chefe do Estado, espero eu.
DW África: A militarização é um dos fatores que diferencia a RENAMO de outros partidos, conferindo à RENAMO um certo poder que os outros partidos não têm. Por isso há quem acredite que a RENAMO não se vai desfazer tão cedo desse seu trunfo. Faz sentido esta desconfiança?
OM: Não, de maneira nenhuma. A RENAMO não é um partido que goste de ser militarizado. Os nossos dirigentes e a Comissão Política Nacional não estão no mato. Existe, sim, uma ala da RENAMO, uma força residual, que continua armada. Neste momento estamos num processo, como já referi. Queremos, de facto, ver os nossos militares enquadrados nas FDS desde 1992, ou melhor 1994, pois eles não tiveram oportunidades ou a sorte de serem promovidos. O que nós queremos é que eles também possam ocupar cargos de chefia nas FDS. Depois desse processo vamos caminhar para a integração de membros da RENAMO na Polícia da República de Moçambique (PRM). E depois disso, sim, vamos proceder à desmilitarização e à reinserção na vida social daqueles que não vão poder estar na polícia. De facto; não há necessidade de termos armas. Haja boa vontade de ambas as partes. Nós gostaríamos também de ter alguns quadros da RENAMO nos serviços secretos, ou seja; nos SISE. Porque é o SISE que faz planos para matar e armar emboscadas a elementos da oposição.
DW África: Em relação à questão do SISE, foi alcançado algum consenso com o Presidente da República?
OM: Na altura em que eu pude conversar com o chefe do Estado ainda não tínhamos alcançado um entendimento. Mas penso que se trata de uma negociação em curso e nós gostaríamos que a outra parte pudesse aceitar os nossos princípios. Nós queremos uma reconciliação nacional e não deveria existir qualquer receio da outra parte.
DW África: O desentendimento em torno do processo é sinal que a falta de confiança permanece?
OM: Eu ainda considero que há, da parte do governo, uma tentativa de chantagem. Iso ficou bem claro quando os membros da bancada da FRELIMO apareceram em público a dizer que a sessão extraordinária e as negociações não poderiam continuar. Isso foi, de facto, uma chantagem. Quando a Assembleia da República convocou a sessão todo o mundo sabia que a RENAMO tinha a sua segurança. Eles preferiam gastar o dinheiro do erário público e que tudo ficasse sem efeito. Preferiam que nós deixássemos de fazer aquilo que tinha sido planeado. É isso que está mal na posição da bancada parlamentar da FRELIMO.
DW África: Os Estados Unidos e outros países comprometeram-se a apoiar a RENAMO no processo de desarmamento. Que tipo de apoio interessa à RENAMO?
OM: Não podemos ter a mesma sorte que tivemos durante a desmobilização em 1994, depois do Acordo Geral de Paz de 1992. Nessa altura o desmobilizado recebia uma catana, uma enxada e uma camisa. Agora queremos uma situação diferente. E quando conversamos com a comunidade internacional, pedimos que apoiem este processo de desmilitarização e de reintegração social dos nossos desmobilizados. Queremos uma vida digna, diferente da do passado.
DW África: Já fizeram uma proposta nesse sentido?
OM: A nossa proposta ainda não é muito concreta, mas, em poucas palavras, queremos uma vida melhor, não queremos regressar àquela desgraça do passado.