Opinião: Fome no Corno de África não é um fenómeno climático
16 de março de 2017Quando as organizações das Nações Unidas apelam a ajuda de emergência para países como Somália, Sudão do Sul, Eritreia e Etiópia, é óbvio de que se trata de países cujos políticos corruptos e cínicos não valorizam a democracia, desrespeitam os Direitos Humanos e fomentam os conflitos étnicos e religiosos para se manterem no poder.
Somália? Há muito tempo, que deixou de ser um Estado. Ocupa o último lugar na lista de perceção da corrupção da Transparência Internacional.
Sudão do Sul? Tem a benção de ter grandes quantidades de crude, mas exporta milhões de refugiados por causa da orgia de violência da guerra civil no país.
Eritreia? Outrora um país de esperanças, hoje a "Coreia do Norte de África", fechada a sete chaves e governada por uma pandilha que até tira proveitos pessoais do negócio do tráfico de refugiados.
Etiópia – país rico num ciclo vicioso de fome e pobreza
Mas nenhum país ilustra tão bem a relação entre a boa governação e a fome como a Etiópia. Não é por acaso que a planta do café é oriunda deste país, situado numa posição estratégica no Corno de África. O Nilo Azul e duas épocas chuvosas por ano poderiam dar safras recorde na Etiópia, o país africano com a segunda maior população.
Mas em vez de prosperidade, a Etiópia vive crises de fome desde os anos 70, conheceu fluxos de refugiados, atualmente centenas de manifestantes foram mortos e os opositores estão atrás das grades nas prisões. A combinação de 85 milhões de etíopes que dependem da agricultura e um Governo que proíbe a posse da terra e que distribui sementes apenas para os membros do partido no poder, é uma receita segura para um ciclo vicioso de fome e pobreza. Mas isto não impede o Governo da Alemanha de fazer transferências generosas de ajuda ao Governo da Etiópia.
Não há dúvidas de que vários fatores externos pioram a situação alimentar no Corno de África: as mudanças climáticas e a desertificação de regiões férteis contribuem para o recrudescimento de conflitos sobre os acessos à água e às áreas de pastagem. A fuga do campo para a cidade de centenas de milhares de agricultores e pastores faz explodir a população das cidades. O terror islamista de grupos como Al-Shabaab na Somália impede o cultivo das terras.
Mas todos estes fatores poderiam – pelo menos com ajuda externa – ser dominados, se houvesse políticos responsáveis. Porém, em África, estes podem ser contados nos dedos.
O Governo da Alemanha tem que reconhecer a má governação em África. Atualmente, Gerd Müller, o ministro alemão de Desenvolvimento, faz campanha para um "Plano Marshall" para a África, um projeto tão ambicioso mas pouco definido. A diferença em relação ao projeto original do ano de 1948 é que os países recetores das ajudas, na altura tinham uma grande vontade e necessidade de reconstruir os seus países devastados pela Segunda Guerra Mundial.
Ajuda com interesses pessoais
A ideia do novo "Plano Marshall" alemão é criar com investimentos postos de trabalho e melhorar as perspetivas dos jovens africanos para que não abandonem os seus países de origem. Isto já desenha o problema: não se trata tanto de um plano de reconstrução, mas sim de um plano de defesa contra a imigração.
Se os governos dos países industrializados, entre eles, o Governo da Alemanha, fecham acordos com países de governos criminosos como a Etiópia, a Eritreia, a Somália e o Sudão para impedir a saída de migrantes, ajudam indiretamente a criar a próxima crise de fome. Estas "parcerias para a migração", como são chamadas de uma maneira eufémica, enviam uma mensagem aos governantes em Addis Abeba, Asmara e Mogadíscio: corrupção e violações dos Direitos Humanos são premiadas.
O mito das crise de fome causadas pelo clima
Como todas as outras, esta crise de fome passará com o tempo. A máquina internacional de ajuda, uma indústria de muitos bilhões nos países doadores, já arrancou. Centros de acolhimento para crianças subnutridas foram construídos, biscoitos enriquecidos estão a ser administrados.
Mas dentro de poucos anos, chegará a próxima crise alimentar. Há cada vez menos tempo para que as pessoas, o gado e as terras possam regenerar entre os ciclos de fome.
O mito, de que a fome em África é um fenómeno de clima, é exatamente isto: um mito.
A fome em África, especialmente no Corno de África, é um "produto caseiro". Um produto dos políticos e das elites africanas.
A política alemã, que preside no ano de 2017 ao grupo dos G20, as vinte economias mais influentes no mundo, tem que reagir a isto!