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Nyusi quer "repensar" o modelo de eleições. É um sinal?

4 de abril de 2024

Presidente moçambicano diz que as eleições são demasiado caras e o dinheiro poderia financiar o combate ao terrorismo. Para analista, as declarações são alarmantes e poderão sinalizar que Nyusi se quer manter no poder.

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Filipe Nyusi, Presidente da República de Moçambique
Foto: Phill Magakoe/AFP/Getty Images

O Presidente moçambicano Filipe Nyusi, disse, esta quinta-feira (04.04), que o país precisa "repensar o modelo de eleições", considerando que o dinheiro gasto com escrutínios "dava para equipar" os militares que estão a combater o terrorismo na província de Cabo Delgado.

Em declarações na abertura da reunião da Associação dos Combatentes de Luta de Libertação Nacional (ACLLIN), braço político da FRELIMO, Nyusi questionou as verbas gastas, por exemplo, nos processos de recenseamento, concluindo, no entanto, que, "não tendo outra hipótese", o país deve manter os sufrágios eleitorais no modelo atual. 

Lázaro Mabunda, investigador do Centro de Integridade Pública (CIP), considera, em entrevista à DW, que este é um discurso "que soa mal" e que "cria a suspeita de que [Nyusi] quer banir o processo eleitoral" para se manter no poder.

DW África: O que acha destas declarações do Presidente da República?

Lázaro Mabunda (LM): Primeiro, acho que se trata de um discurso totalmente descontextualizado, que soa mal nas vésperas de um processo eleitoral e ainda mais num contexto em que a sua sucessão está envolta no segredo dos deuses.

Lázaro Mabunda, investigador do CIP
Lázaro Mabunda, investigador do CIPFoto: Luciano da Conceição/DW

DW África: O que pode estar a querer dizer Filipe Nyusi com estas declarações, em véspera de eleições

LM: Cria uma suspeita de que ele quer banir o processo eleitoral, para poder usar a situação militar em Cabo Delgado como escudo para se manter no poder, alegando que não temos dinheiro para as eleições e precisamos de alocar esse dinheiro para o conflito. Mas o problema de Moçambique não são as eleições, o problema de Moçambique é a corrupção - não tem nada a ver com o modelo eleitoral, que foi escolhido pelo próprio partido FRELIMO e pela RENAMO.

DW África: Sim, porque nem o custo das eleições, nem o conflito em Cabo Delgado são coisas novas...

LB: Exatamente, e ele sabe de tudo isso. É estranho que ele esteja a reclamar dos custos e estabeleça uma relação entre o custo das eleições e o conflito em Cabo Delgado. Já há umas semanas circulava a informação de que se pretenderia declarar o estado de emergência em Cabo Delgado, e isso significaria de uma ou de outra forma, segundo as interpretações, que o Presidente se iria manter no poder, alegando que não há condições para sair, nem para a realização de eleições.

O que está a "tramar" a FRELIMO?

Então, quando estas declarações são feitas durante uma reunião de um órgão do partido FRELIMO, isto parece um alerta ou uma procura de apoio junto dos antigos combatentes no sentido de eliminar as eleições e alocar esse dinheiro para Cabo Delgado.

DW África: Em que medida poderá a candidatura de Samora Machel Júnior ter tido impacto nestes pronunciamentos de hoje do Presidente?

LB: Além da candidatura de "Samito", creio que há outras duas candidaturas que serão lançadas e podem criar algum "pânico" ao Presidente da República. As relações entre o Presidente da República e "Samito" nunca foram boas. E outra candidatura de que se fala, mas não posso confirmar, será supostamente apoiada pelo antigo Presidente Armando Guebuza.

Eu acho que o que está a provocar esta demora no anúncio de uma candidatura é a procura do candidato e próprias negociações internas para que quem ganhar não procure andar atrás dos antigos governantes. Este medo faz com que se adie o processo, se calhar para, no último minuto, tirar um "coelho da cartola" que provavelmente conseguiria domesticar, mesmo estando fora de mandato – ou, se não consegue domesticar, alguém que possa criar um escudo de defesa para que ele não seja tocado mesmo quando sair do poder.