Nova antologia: "As Ilhas da Música do Meio do Mundo"
18 de dezembro de 2022Acaba de ser lançada em Lisboa a antologia bilíngue "As Ilhas da Música do Meio do Mundo - Literatura e Música De Cabo Verde" sobre a literatura e a música cabo-verdianas, organizada e traduzida por Barbara Mesquita.
A obra, que visa um público abrangente, contém textos em poesia e prosa de Germano Almeida, Jorge Barbosa, Amílcar Cabral, Baltasar Lopes, entre outras figuras ímpares da cultura das ilhas da "morabeza".
A apresentação da antologia, lançada sob a chancela da Editora "Arachne Verlag Bonn", é resultado da parceria entre as Embaixadas da Alemanha e de Cabo Verde em Portugal.
Barbara Mesquita, tradutora portuguesa licenciada em Filosofia Românica pela Universidade de Hamburgo, compilou e traduziu do português e do crioulo para alemão os textos (poesia e prosa) autorizados de vários escritores que dão corpo a este livro sobre a literatura e a música cabo-verdianas.
Terceira antologia
Depois de "Angola entdecken" (Descobrir Angola) e do trabalho sobre Arménio Vieira, esta é a terceira antologia que Barbara Mesquita publica por intermédio da mesma editora, na Alemanha, que tem divulgado trabalhos de autores africanos lusófonos, além de alemães. Com a seleção de textos que fez, a autora procura dar a conhecer um pouco mais de Cabo Verde, sobretudo ao público alemão.
Barbara considera que, com a tradução bilíngue, a obra poderá alcançar outros públicos, incluindo académicos alemães estudiosos das literaturas africanas de língua portuguesa. "Acho que mesmo para os estudantes do Português na Alemanha seja interessante haver um livro publicado nos dois idiomas, o que pode ser útil para os seus estudos", afirmou quando falava aos presentes no Centro Cultural de Cabo Verde (CCCV), em Lisboa.
No prefácio, Mesquita resume a história do país, a sua literatura e música, com especial destaque para o facto da sociedade cabo-verdiana se caraterizar pela mistura de diferentes culturas e pela sua insularidade. Mas também por ter uma grande diáspora como resultado da pobreza de recursos e da seca.
De acordo com a nota informativa sobre o livro, Cabo Verde desenvolveu "uma identidade cultural forte e independente, que se exprime na língua, na literatura e na música". E tem "uma sociedade inclusiva que pode servir de exemplo para o mundo nos tempos que correm."
"Eu achei que era necessário divulgar um país tão pequeno, com uma cultura tão própria construída em cima de uma história muito adversa, de escravidão, de violência e confrontada com uma natureza hostil", afirma Barbara Mesquita em entrevista à DW África.
"Apesar disso, [os cabo-verdianos] conseguiram construir uma sociedade tão resistente, tão resiliente e tão coesa por amor à terra", adianta.
"Cabo Verde, minha paixão"
"Cabo Verde é a minha paixão pessoal desde 1998, quando ouvi pela primeira vez Tito Paris a tocar num concerto", diz a autora para explicar como surgiu o interesse por esta iniciativa literária, numa altura em que ainda nem sequer conhecia Cesária Évora.
"Depois daquele concerto conheci Germano Almeida, que é o tio da Dina Paris, mulher do Tito, e fiz uma grande amizade com a família" – precisa –, para dizer que acabou por ir visitar Cabo Verde, em 2004, pela sua dedicação à literatura africana de língua portuguesa.
Foi desta sua experiência pessoal – explicou – que surgiu a ideia de divulgar Cabo Verde na Alemanha, "porque muitos alemães que iam às ilhas fazer turismo não sabiam nada sobre o país", conta.
Em Cabo Verde, há um claro casamento entre a literatura e a música. Barbara Mesquita dá-nos o exemplo de poemas que alimentaram a morna – música rainha do arquipélago –, não só cantados por Tito Paris ou Cesária Évora, para argumentar sobre a escolha do título da antologia. Nela estão figuras como Germano Almeida, escritor cabo-verdiano vencedor do Prémio Camões (2018), mas também Amílcar Cabral, pai da independência de Cabo Verde e Guiné-Bissau.
Amílcar Cabral e Germano Almeida
"Organizei os textos em capítulos sobre História e Geografia, as 'Gentes' e a sua forma de viver (…). E o poema de Amílcar Cabral é precisamente aquele do regresso sobre a chuva", explica concordando que, naquele período da luta de libertação e de autodeterminação das então colónias portuguesas em África, ele também foi um factor de união entre os dois povos, guineense e cabo-verdiano. Quanto a Germano Almeida, o primeiro escritor que conheceu pessoalmente, escolheu dele textos que se enquadram nos capítulos da antologia.
A académica são-tomense, Inocência Mata, professora na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa – a quem coube a apresentação da obra –, fez uma análise crítica exaustiva dos textos (prosa e poesia) para afirmar no final da sua comunicação que esta "simples antologia vai muito mais além daquilo que anuncia".
"Morabeza"
Na abertura do evento, Gerhild Steinhauer, diretora cultural da Embaixada da Alemanha em Portugal, associou-se ao ambiente da "morabeza" cabo-verdiana que então se vivia para enaltecer a parceria com o Centro Cultural de Cabo Verde por acolher o lançamento desta antologia.
"Esperamos bem que este seja o primeiro de muitos outros momentos de colaboração", no plano cultural, "entre as duas instituições", referiu Steinhauer que, entre os presentes, acompanhou até ao fim o momento musical proporcionado por Stephan Almeida e o seu grupo "Nos Raiz".
Momento bastante aplaudido em véspera de homenagem, também no CCCV, dos músicos Marino Silva e Humberto Ramos em reconhecimento dos seus contributos para a cultura de Cabo Verde, fazendo parte de várias sessões ao longo deste mês de dezembro de celebração da morna, elevada a 11 de dezembro de 2019 a Património Imaterial da Humanidade pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação Ciência e Cultura).
Esta sexta-feira (16.12), "é o dia em que Cesária Évora, Celina Pereira e Dulce Matias partiram para o universo incorporal das estrelas maiores da música cabo-verdiana", tal refere uma nota do CCCV. E esta data, lê-se, "é também um momento de celebração destas mulheres que dedicaram as suas vidas a cantar Cabo Verde".