Mutilação Genital Feminina continua a preocupar o mundo
6 de fevereiro de 2014A modelo Yasmin Sissé, nascida em Portugal, é filha de pai guineense e de mãe senegalesa. A última das três vezes que esteve na Guiné-Bissau foi há 12 anos. A jovem estudante é a escolhida para dar a cara como embaixadora da campanha contra a prática da excisão.
Aceitou o convite em nome de uma boa causa: "Senti-me bem, até porque sou contra essa prática. Não é algo que faça parte de nós, que mude algo em nós, portanto não é necessário."
Com esta campanha, a Morabeza, Associação para a Cooperação e Desenvolvimento, e parceiras como a Musqueba e a UMAR, União de Mulheres Alternativa e Resposta, querem contribuir, com uma nova abordagem, para a mudança de mentalidades.
Insistem em despertar a consciência das pessoas, em particular as mulheres, envolvendo-as no combate ao ritual da Mutilação Genital Feminina (MGF), considerado crime em Portugal.
"A prática está numa série de rituais e tradições que tem a ver com a emancipação dos jovens e com a iniciação a vida adulta", afirma Filipa Costa, que coordena a iniciativa em nome da Morabeza.
A colaboradora da Morabeza deixa claro qual o alvo da sua organização: "Não queremos ir contra ou denegrir essas tradições, que muitas delas tem muito valor e são importantes. O que queremos é que deixe de existir a parte nefasta que neste caso é a mutilação."
Uma luta difícil na Guiné-Bissau
Não há registo exato de casos em Portugal, mas existem probabilidades da excisão ser feita aqui por alguns imigrantes, admite Yasmin Sissé, que tem participado em sessões de informação e levado a mensagem à comunidade guineense a respeito dos danos causados por esta prática oculta, conhecida na Guiné-Bissau por fanado.
Ela reconhece que na Guiné a sua luta não seria bem vista. "Se calhar os meus familiares na Guiné-Bissau não aceitassem tão bem, mas os que estão cá aceitam porque acho que o local onde estamos muda um pouco a mentalidade das pessoas", conta.
Na Guiné-Bissau, onde a excisão continua rodeada de preconceitos culturais, há mulheres que querem mudar esta realidade, afirma Yasmin. "Eu acho que sim, que querem mudar, mas se calhar não querem. Se calhar tem medo de gente mais velha, com outro tipo de mentalidade, mas se calhar os mais jovens já não ligam tanto a isso. Certas mães que não querem que se faça isso aos filhos têm medo de assumirem que não o querem", admite.
Nesta quinta-feira (06.02), Dia Internacional da Tolerância Zero contra a Mutilação Genital Feminina, vários parceiros analisaram, no Instituto Camões, como mobilizar e reforçar os esforços nacionais e internacionais para pôr fim à Mutilação Genital Feminina e outras práticas tradicionais nefastas, no âmbito da Agenda de Desenvolvimento pós 2015.
No passado 30 de janeiro, Dia da Mulher Guineense, esta problemática foi motivo de debate. "Tivemos um debate muito interessante sobre o papel da mulher, sobre a importância de termos um espaço de discussão deste assunto e de ajudarmos, de facto, no empoderamento das mulheres, não só as guineenses, a perceberem que será através delas é que se podem conseguir as mudanças", conta Filipa Costa:
Trabalho com a comunidade é a solução
A secretária de Estado portuguesa dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Teresa Morais, deu conta à DW África da apresentação pública, esta quinta-feira em Lisboa, do III Programa de Ação para a Prevenção e Eliminação da Mutilação Genital Feminina para o período 2014-2017.
Teresa Morais disse que o programa com 42 medidas abrange a prevenção, através das escolas, a formação de profissionais ligados a esta matéria e intervenção nas próprias comunidades de imigrantes afetadas. "Enfatizo muito a necessidade de um trabalho mais intenso com as comunidades, alias, julgo que essa é a orientação que a própria União Europeia reconhece."
Entretanto, através dos microfones da DW África, a modelo Yasmin Sissé deixa a seguinte mensagem: "Que as pessoas que têm conhecimento denunciassem, não só por elas, mas também pelo próximo. Acho que não é preciso passarmos por isso para nos sentirmos mulher, ou para ter um marido que nos ache que somos mulheres por termos passado por isso."
A modelo usa ainda outros argumentos para justificar o fim da MGF: "E até para evitarmos certas doenças e infeções, porque há quem fique com traumas, mas também a quem acabe por morrer, então acho que podiamos evitar isso tudo e acabar com esta prática."
A MGF é considerada uma violação dos dieritos humanos. Em dezembro de 2012 a Assembleia geral das Nações Unidas votou a favor do trabalho para a elimação desta prática no mundo. 29 países em África e Médio Oriente fazem a Mutilação Genital Feminina.
A Somália é o país que regista a maior taxa de excisão com 98%, seguido da Guiné-Conacry com 96%. O Egito tem 93%, Eritreia e Mali 89%.