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Moçambique regista perdas no setor do gás, diz CIP

Márcio Pessoa
10 de fevereiro de 2020

Ainda não se sabe o valor das perdas, mas o CIP aponta que mais de 7 mil milhões de dólares não foram certificados pelo Instituto Nacional de Petróleo nos projetos de gás anteriores a 2015.

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Bacia do Rovuma, área de exploração de gásFoto: ENI East

O Centro de Integridade Pública de Moçambique (CIP) confirmou nesta segunda-feira (10.02) que o país deve ter perdido receitas importantes por não fazer a certificação dos custos dos projetos de gás anteriores a 2015.

As empresas entregam periodicamente relatório de custos que devem ser verificados pelo Governo. Caso o Governo não faça a certificação num prazo definido pelo contrato de concessão, automaticamente aceita os custos declarados pelas empresas.

O CIP chegou a conclusão de perda após o Instituto Nacional do Petróleo (INP) divulgar a auditoria dos custos recuperáveis dos contratos de concessão na Bacia do Rovuma de 2015 a 2017. Segundo o INP, foram apurados quase 2 mil milhões de dólares, o equivalente a 1,8 mil milhões de euros, declarados pelas concessionárias.

No entanto, a pesquisadora Inocência Mapisse, do CIP, diz que a informação divulgada pelo INP dá a certeza de que as receitas referentes ao período anterior a 2015 foram perdidas. Mapisse fala num montante que pode chegar a 7,2 mil milhões de dólares  - o equivalente a quase 6,6 mil milhões de euros - que não foram certificados pelo INP. No entanto, a receita perdida ainda carece de um levantamento específico para ser calculada.

"Governo está a assumir" as perdas

Moçambique regista perdas milionárias no setor do gás, diz CIP

"Podemos concluir que o saldo dos custos recuperáveis até 2015 – nós continuamos a bater na tecla de 2015, tendo em conta que o prazo de submissão do relatório expirou. Isso confirma aquilo que nós achávamos que era um risco: perder receita por não certificação da conformidade de custos. Hoje em dia é uma certeza", explica Mapisse, afirmando que "com essa publicação, significa que o Governo está a assumir que não certificou os custos pelo menos até 2015".

A informação do regulador do setor, segundo a pesquisadora do CIP, mostra que o processo de certificação iniciou  em 2015. "Portanto, os dados são referentes a 2015, 2016 e 2017. Significa que antes disso não houve certificação de custos. O que leva-nos a concluir que não houve certificação de custos em pelo menos 7,1 mil milhões de dólares se nós não considerarmos o ano de 2015. Mas, se considerarmos o ano de 2015, porque o prazo foi ultrapassado, significa que, sim, 7,2 mil milhões de dólares não foram certificados pelo Governo".

O diretor-executivo da agência de avaliação de risco Exx Africa, Robert Besseling, diz que vários países têm criado um organismo específico de desenvolvimento, com a participação do Governo, das empresas e da sociedade civil, que teria a responsabilidade de uma gestão ampla da indústria extrativa.

Estrutura sem interferência política

Esta seria uma estrutura sem influência política, responsável pela gestão de arrecadação de impostos e receitas do setor, com a função de agilizar a comunicação entre os interessados nos projetos  e garantir que os investimentos gerem retorno às comunidades no que elas mais precisam.

Inocência Mapisse Investigadora   CIP
Inocência Mapisse, investigadora do CIPFoto: DW/L. da Conceição

"Teria de ser uma organização central, sem interferência política, que pudesse coordenar diferentes iniciativas. Se isso puder ser feito, certamente o Banco Mundial e o Banco Africano de Desenvolvimento também seriam capazes de auxiliar na definição das estruturas. Isso é o que se encontra em vários países que tentam investir a receita arrecadada com a indústria extrativa no desenvolvimento local", diz Besseling, que ressalta: "isto é um aspeto crucial para ser construído no futuro. Como isso deve ser feito, depende de cada país".

A pesquisadora do CIP, Inocência Mapisse, lembra que este organismo em Moçambique poderia ser a chamada Alta Autoridade da Indústria Extrativa, regulamentada há quatro anos, mas que ainda não saiu do papel.

"Como uma forma de trazer informação verídica, de confiança, é importante que a Alta Autoridade da Indústria Extrativa entre em funcionamento. O principal fator que ainda pode gerar problemas no processo da Alta Autoridade da Indústria Extrativa é o fato de que até hoje dia, a forma com a qual está sendo conduzido o processo, esta instituição terá de prestar contas ao Conselho de Ministros, o que não faz sentido".

Proposta da sociedade civil

Mapisse considera que é hora desse organismo ser ativado em Moçambique, mas lembra que as suas atribuições devem ter mudanças: "A proposta da sociedade civil, e penso que seria a proposta mais viável, seria que esta instituição prestasse contas à Assembleia da República".

Neste perspetiva, aquele órgão "seria uma espécie de auditor do povo, não auditor do Governo mais uma vez, porque já existe o regulador do setor, que vai fazer esse trabalho, então a Alta Autoridade iria surgir como uma espécie de contrabalanço dos resultados apresentados pelo auditor do governo, pelo Instituto Nacional dos Petróleo".

A DW África entrou em contato com o Instituo Nacional de Petróleo, mas não recebeu resposta à solicitação de entrevista.

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