Ataques em Moçambique: "Intervenção multilateral é crucial"
10 de janeiro de 2021"A Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC, sigla em inglês) está num dilema. Por um lado, tem de responder à catástrofe humanitária em Moçambique - que condena como terrorismo - mas, por outro lado, procura proteger a soberania de Moçambique e não intervirá a não ser que isso seja pedido pelo Governo", escreve a equipa de analistas da África Austral numa análise conjunta publicada no site do instituto.
Num artigo com o título "Terrorismo em Moçambique precisa de soluções africanas", os analistas lamentam que os presidentes da África do Sul, Botsuana, Zimbabué e o vice-presidente da Tanzânia, convocados por Moçambique para debater a insegurança, "não tenham acordado num papel específico para a SADC e tenham apenas agendado uma cimeira extraordinária para janeiro".
"Falta um plano concreto"
A falta de um plano concreto, acrescentam, "é sintomática da resistência moçambicana a qualquer tipo de apoio externo que possa levar a uma intervenção estrangeira multilateral no país". Esta, defendem, "não é uma crise que um país consiga resolver sozinho", por isso "a SADC tem de liderar uma resposta regional".
A crise de segurança e humanitária no norte do país não pode receber os mesmos remédios que estão a ser aplicados nas regiões do Sahel, onde o terrorismo ameaça diariamente a vida das pessoas: "Alguns dos maiores problemas do Mali e da Nigéria incluem a falta de uma estratégia abrangente nacional e regional, recursos limitados e um foco na ação militar à custa dos direitos humanos e de soluções de desenvolvimento", argumentam.
"Moçambique e a SADC parecem estar a ir pelo mesmo caminho", alertam, lembrando que num primeiro momento o Governo moçambicano classificou os ataques como simples crimes e contratou mercenários russos e sul-africanos em vez de negociar apoio coletivo dos países vizinhos.
"Futuro do terrorismo na região"
Para os analistas do ISS, "a maneira como a SADC e Moçambique lidarem com a crise vai determinar o futuro do terrorismo na região, já que uma resposta pouco decidida pode consolidar o califado do Estado Islámico na África Austral, tornando uma intervenção externa essencial".
Com Moçambique a admitir o envolvimento da SADC na crise, esta organização "tem de calibrar cuidadosamente a sua resposta, já que a segurança a longo prazo na região depende do sucesso da ação coletiva", concluem os analistas.
A violência armada em Cabo Delgado, onde se desenvolve o maior investimento multinacional privado de África, para a exploração de gás natural, começou há três anos e está a provocar uma crise humanitária com mais de duas mil mortes e 560 mil deslocados, sem habitação, nem alimentos, concentrando-se sobretudo na capital provincial, Pemba.
Algumas das incursões passaram a ser reivindicadas pelo grupo 'jihadista' Estado Islámico desde 2019.