Moçambique: "Cerca de 90% da população tem dieta aceitável"
15 de março de 2023A insegurança alimentar aguda diminuiu em Moçambique de 13% para 10% da população, segundo um relatório apresentado, esta quarta-feira (15.03), pelo ministro da Agricultura, Celso Correia, juntamente com parceiros.
"Estamos a reduzir o número de pessoas em insegurança alimentar. Falávamos que a tendência global é de aumentar, nós estamos a reduzir ao nosso ritmo, por isso acreditamos que estamos, talvez, no caminho certo", referiu o governante.
Celso Correia falava durante um evento público para divulgação do Relatório de Segurança Alimentar Pós-Colheita de 2022, juntamente com parceiros - como o Programa Alimentar Mundial (PAM) -- e transmitido em diretos pelas televisões.
No período em análise, de novembro de 2022 até ao presente mês (ou seja, período pós-colheita), "cerca de 90% da população moçambicana teve uma dieta aceitável para satisfazer as suas necessidades energéticas diárias".
Situação crítica em Cabo Delgado
Há 10% que se encontram "em insegurança alimentar aguda", ou seja, cerca de três milhões de pessoas, um quinto das quais na província de Cabo Delgado, devido à insurgência armada que ali dura há cinco anos.
Considera-se que alguém está em insegurança alimentar quando não sabe de onde virá a sua próxima refeição, nem quando.
No relatório refere-se ainda que daqueles que conseguem satisfazer as suas necessidades alimentares, uma parte (38%) fica depois sob pressão para poder responder às suas necessidades não-alimentares.
De acordo com o documento, não há população na classificação formal de 'fome' segundo os indicadores internacionais - a mais grave classificação de todas, mais que a insegurança alimentar, segundo o Integrated Food Security Phase Classification (IPC).
Impacto dos ciclones
Celso Correia ressalvou que os recentes ciclones que se abateram sobre Moçambique, provocando cheias com graves prejuízos, deverão levar a um novo levantamento com atualização de dados.
No capítulo dos desastres naturais, recomenda-se que devem ser antecipadas anualmente as necessidades de assistência alimentar direta.
"Temos de deixar de fazer o cálculo da assistência depois do desastre acontecer", porque a ocorrência de calamidades "é recorrente", assinalou o governante.
O ministro da Agricultura defendeu ainda no evento que o caminho a seguir deve incluir mudanças no apoio ao setor agrícola com ciclos de sete anos, que capacitam os produtores, em vez de ajudas curtas, após as quais voltam à miséria.
"Não podemos ser laboratório de experiências" de dois a quatro anos, no final das quais, "quando acabam os recursos, as famílias voltam à pobreza", referiu.
O relatório do Secretariado Técnico de Segurança Alimentar e Nutricional (Setsan) contou com um número maior de amostragem, crescendo de 51 para 151 distritos e de 5.064 para 12.890 agregados familiares, o que permitiu "uma avaliação mais precisa".
FDC pede desculpas
Também presente no evento, Joaquim Oliveira, diretor da Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade (FDC) pediu desculpa ao ministro da Agricultura moçambicano, depois de a FDC o ter acusadode minimizar a insegurança alimentar no país.
"Espero que com esta nossa aparição aqui consigamos pedir desculpas, se o ofendemos", disse Joaquim Oliveira.
"A nossa carta tem diversas incongruências", acrescentou, acerca do documento público que há duas semanas contrariou um anúncio feito por Celso Correia de que "90% da população [moçambicana] tem alimentação segura, ou seja, já consegue ter três refeições por dia".
Na altura, a FDC reagiu em comunicado, dizendo que "a informação prestada pelo ministro contrasta com a realidade vivida por milhões de cidadãos em Moçambique". "Morre-se de fome no nosso país", mencionou a organização.
Por sua vez, Celso Correia apontou falhas na informação divulgada pela FDC e salientou que "foi a crítica desta organização que sustentou 90% do debate e que gerou indignação" nas últimas semanas em Moçambique.
Celso Correia insurgiu-se contra a expressão usada pela organização -- ao referir "morre-se de fome" em Moçambique -, considerando que alimenta uma "indústria de miséria", sem que o país tenha população na classificação de 'fome' dos indicadores internacionais.
O ministro disse que a afirmação serve para "projetar um país de miséria, para mobilizar recursos", só que depois há "o custo de administração, 30%, que fica no gabinete, depois tem 'workshop'" e o dinheiro "não chega às tais pessoas" que dele necessitam.
"São biliões de dólares para ciclos de apoio que depois não têm sequência. É dar alimento e depois não sabemos como a família fica. Não contem comigo para perpetuar a indústria da pobreza e da miséria", referiu o governante, sendo aplaudido pela plateia.
Na resposta, Joaquim Oliveira referiu que a FDC não quer "fazer parte daquela indústria".
"Nós queremos fazer parte deste paradigma novo" de capacitação de produtores, anunciado pelo governante, concluiu.