Mondlane é um "homem a abater", alerta académico
2 de novembro de 2024Pouco tempo depois do partido no poder em Moçambique, a FRELIMO, ter acusado Venâncio Mondlane de largar os seus apoiantes na hora crítica para optar pelo conforto da diáspora, o candidato presidencial anuncia que participará da manifestação contra a mega fraude eleitoral de 7 de novembro na sequência das eleições de 9 de outubro.
O académico português Fernando Cardoso acha que Venâncio Mondlane faz bem em resguardar-se, mas a narrativa de que Mondlane "abandonou o barco" visa, na sua opinião, atraí-lo para uma ratoeira.
Cardoso alerta que Mondlane é o chamado "homem a abater", sublinhando que "a FRELIMO de hoje tem tudo menos ética".
DW África: Venâncio Mondlane corre risco de vida?
Fernando Cardoso (FC): Se Venâncio Mondlane não se resguardar neste momento, tenterão matá-lo. Não tenho a mínima dúvida. Venâncio Mondlane não tem uma máquina atrás dele. Venâncio Mondlane não é a RENAMO. Venâncio Mondlane aderiu a um partido incipiente, que não tem sequer estruturas nacionais que é o PODEMOS. Venâncio Mondlane tem estado a representar um ressentimento generalizado no país e com uma grande adesão. Como ele tem, de facto, carisma e tem capacidade de expressar de uma maneira que toda a gente percebe os seus pensamentos, ele é o chamado ‘homem a abater'.
DW África: Acha que a FRELIMO, partido no poder, teria a ousadia de matar Mondlane depois dos assassinatos de Elvino dias e Paulo Cuambe que suscitaram grandes críticas?
FC: Eu acho que o regime não teria problema absolutamente nenhum em fazê-lo e negar que o tinha feito, porque sabe que não existe uma máquina atrás de Venâncio Mondlane. A História tem-nos demonstrado isso. Eu acho que, neste momento, o objetivo principal de quem manobra neste momento o aparelho da FRELIMO é tentar encontrar Venâncio Mondlane. Qualquer acusação que façam no sentido de o tentar provocar ou de tentar incitar o seu orgulho tem esse objetivo. Eu não tenho a mínima dúvida. Portanto, eu acho muito bem que Venâncio Mondlane se resguarde e não apareça.
Nos primeiros tempos, os [opositores do regime] não estavam dentro do país, mas sim em Dar-es-Salaam e em outros sítios. Além do mais a FRELIMO de Samora [Machel] tinha uma coisa que esta não tem que é ética. Neste momento o aparelho da FRELIMO que está no poder tem tudo menos ética e já o demonstrou. São um grupo de pessoas que está interessado em dominar os negócios do país e a continuar a governar à sua maneira, enganando quem for necessário enganar.
DW África: Em termos de eliminação de indesejados, o modus operandi da FRELIMO continua o mesmo?
FC: Não. Continua o mesmo desde 2014, desde que mataram Carlos Cardoso. Esta história dos esquadrões da morte é algo de novo que acontece já neste século. Antes os métodos não chegavam a esse ponto. A partir do momento em que a FRELIMO começou a perder o apoio entusiasmado, o apoio real, da maior parte da população, começou a recorrer a métodos deste género e a FRELIMO não precisava de recorrer a estes métodos, o que não quer dizer que não tenha havido, em momentos anteriores, períodos sombrios. Eu estou a falar dos esquadrões da morte, ou seja, de grupos que estão organizados para realizar assassinatos de pessoas, de pessoas que, de facto, são indesejáveis. Isto não acontece desde o início da FRELIMO, mas desde o consulado de Armando Guebuza.
DW África: Vê algum inconveniente no facto de Venâncio Mondlane estar a continuar a sua luta fora do país?
FC: Eu acho que o Venâncio Mondlane deve continuar a sua luta num sítio onde possa continuá-la sem ser liquidado. Fora do país, dentro do país… Fora do país também se pode ser liquidado. Não será a última vez em que há liquidações de opositores fora dos países, mas é muito mais complicado e também depende do país onde ele possa estar.