Michel Kafando regressa à Presidência no Burkina Faso
23 de setembro de 2015A iminente ameaça de derramamento de sangue no Burkina Faso parece ter sido evitada. Os militares golpistas entregaram de novo o poder ao Presidente de transição. Michel Kafando anunciou na manhã desta quarta-feira (23.09) que retomou o poder no país, uma semana depois de um golpe de Estado realizado pela Guarda Presidencial do ex-Presidente Blaise Compaoré.
Visivelmente cansado, mas aliviado, Michel Kafando dirigiu, a partir do palácio, em Ouagadougou, uma mensagem aos seus concidadãos.
"Lutamos juntos no sofrimento e agora vamos triunfar juntos no momento da liberdade. Livre, retomo o cargo e a transição está de regresso. Recomeço imediatamente o exercício do poder do Estado", disse Kafando.Ao anunciar o restabelecimento do poder do Estado, Michel Kafando aproveitou para saudar todas as forças vivas do Burkina Faso, os partidos políticos, as organizações da sociedade civil e os sindicatos, entre outros, pela sua tenacidade e combate. De igual modo, dirigiu-se aos militares: “saúdo o nosso exército que enfrentou o desafio lançado pelos golpistas e que, com o seu amor próprio, foi em socorro do povo martirizado do Burkina Faso".
Exército e golpistas chegaram a acordo
Durante a noite de terça para quarta-feira (23/24.09), o exército regular burkinabé que tinha cercado a capital do país, chegou a um acordo com os militares liderados pelo general Gilbert Diendéré para a solução da crise desencadeada com o golpe militar do passado dia 17.
Os militares amotinados aceitaram permanecer nos seus quartéis e retirar as barricadas colocadas nas principais artérias da capital, enquanto as forças leais, unidades habitualmente estacionadas no interior do país que nos últimos dias cercaram a cidade, prometeram recuar até 50 km do perímetro de Ouagadougou e garantir a segurança da Guarda Presidencial (autora do golpe) e de seus familiares.
Chefes de Estado da CEDEAO em Ouagadougou
Kafando dirigiu a mensagem à nação burkinabé numa altura em que seis chefes de Estado da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) em representação da Nigéria, Niger, Togo, Gana, Benin e Senegal chegavam a Ouagadougou para observar o restabelecimento das autoridades de transição.
Sobre as últimas propostas da CEDEAO para a saída da crise, o Presidente de transição disse no seu discurso que “é evidente que as propostas só serão aceites se respeitarem a vontade do povo burkinabé expressa de forma muito clara na Carta da transição".No entanto, Ralf Wittek, diretor da representação no Burkina Faso da fundação alemã Hans Seidel, ligada à União Social Cristã (CSU) criticou a mediação da organização regional nesta crise. “Deve-se simplesmente ver os factos. Faz-se um golpe de Estado que coloca em perigo as conquistas democráticas realizadas desde outubro de 2014 e, em seguida, chega-se a acordo sobre alguns pontos que de qualquer maneira reforçam os rebeldes. Para mim, isso é ridículo e não é mais do que um insulto ao povo burkinabé".
Também para o rapper Smockey, um dos líderes do movimento "Le Balai Citoyen", o acordo negociado pelos mediadores da crise burkinabé é desumano e injusto. “Será necessário que todos aqueles que tenham cometido ou ordenado crimes contra os burkinabés sejam julgados. Caso contrário, é como se disséssemos ao mundo: podem matar, podem assassinar e disparar contra a população inocente, porque sairão ilesos desses crimes e, principalmente, poderão controlar o poder".
Eleições legislativas e presidencial atrasam com o golpe militar
A ação dos militares liderados por Diendéré foi um duro golpe na organização de eleições gerais previstas para outubro e que deveriam pôr fim ao período de transição desencadeado com a destituição do ex-presidente Blaise Compaoré, derrubado do poder por grandes manifestações populares em outubro de 2014.
Compaoré, no poder durante 27 anos, queria, contra a vontade dos burkinabés, modificar a Constituição do país para se manter no cargo presidencial.Entretanto, observadores notam que se o regresso ao poder de Kafando é algo já concretizado, contudo, os chefes de Estado da CEDEAO devem ainda solucionar algumas questões consideradas cruciais para a saída da crise, nomeadamente a questão da amnistia exigida pelos militares golpistas ou a responsabilização dos autores da morte de pelo menos 10 manifestantes e de dezenas de outros feridos numa semana.
Por outro lado, muitos se interrogam sobre qual será o futuro imediato da RSP, a Guarda Presidencial, que não é mais do que uma tropa de elite no seio do exército burkinabé. A sociedade civil e várias forças políticas exigem a sua dissolução.