Manifestação em Luanda: Seis jornalistas entre os detidos
25 de outubro de 2020Em declarações à agência Lusa este domingo (25.10), o presidente do Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA) repudiou os acontecimentos e afirmou que foram detidos três jornalistas da Rádio Essencial, bem como o seu motorista, dois jornalistas da TV Zimbo (um repórter e um operador de câmara) e um fotógrafo da agência de notícias francesa AFP.
Segundo Teixeira Cândido, a polícia obrigou o operador de câmara da TV Zimbo a apagar as imagens e agrediu o fotógrafo da AFP, apesar de este se ter identificado como jornalista.
O responsável salientou que a direção do sindicato vai reunir-se para analisar os acontecimentos de sábado (24.10) e irá tomar posição sobre a atuação da polícia.
"Há um ano, solicitámos um encontro ao comandante provincial da polícia de Luanda e saímos de lá com a garantia de que não haveria mais detenções nem agressões. Infelizmente, voltou a acontecer e com brutalidade", criticou.
Um deputado da União Nacional para Independência Total de Angola (UNITA), Nelito Ekuikui, foi também agredido, tal como alguns ativistas, que tiveram de ser assistidos no hospital. Vários manifestantes foram detidos.
A Lusa contactou a polícia para obter mais informações sobre as detenções, mas não obteve resposta até ao momento.
Profissionais ainda detidos
Três dos jornalistas ainda não foram libertados, disse à Lusa Edno Pimentel, editor da Rádio Essencial, órgão para o qual trabalham estes profissionais da comunicação social.
"A nossa equipa, constituída por três jornalistas e um motorista, continua detida", disse o responsável, acrescentando que falou pela última vez com a sua colega Suelly de Melo pela última vez no sábado, cerca das 22 horas locais.
Edno Pimentel afirmou que os responsáveis da Rádio Essencial estiveram no sábado praticamente todo o dia sem saber do paradeiro dos jornalistas, pois iam sendo "enviados de esquadra para esquadra".
Segundo o editor, Suelly de Melo terá sido agredida com cassetetes.
"Quando falei com ela, disse-me que estava a sentir-se mal", contou à Lusa. Sobre o motivo pelo qual os jornalistas da Rádio Essencial continuam detidos, ao contrário de outros três, já libertados, Edno Pimentel disse: "Não conseguimos perceber, já libertaram os outros, já libertaram ativistas e os nossos continuam detidos".
"Pode ser porque foram agredidos e estão a dar algum tempo para passar os hematomas", sugeriu.
Impedir a cobertura
Também este domingo, dois jornalistas da agência noticiosa francesa AFP queixaram-se de terem sido agredidos pela polícia quando faziam a cobertura de uma manifestação em Luanda e afirmaram ter sido obrigados a apagar as imagens.
Em declarações à Lusa, o fotógrafo da agência noticiosa francesa AFP Osvaldo Silva contou que foi espancado e agredido com cassetetes, tendo-lhe sido retirado o telemóvel, apesar de se ter identificado como repórter.
"Eu estava no chão, começaram a bater e eu disse que era jornalista, mas não quiseram saber", relatou.
Osvaldo Silva disse que tinha uma credencial, atestando que era jornalista, mas que a mesma foi "arrancada" pela polícia, que o coagiu também a apagar as imagens do cartão da máquina fotográfica.
"Fiz um esforço grande, agarrei-me à câmara e como tinha um outro cartão, troquei", explicou o fotógrafo, acrescentando que foi levado a uma esquadra e libertado algum tempo depois.
Um outro jornalista da AFP, Jorge Simba, disse à Lusa que foi obrigado a apagar as imagens e impedido de fazer a cobertura da manifestação.
"Se nós estamos credenciados como jornalistas, estamos autorizados a cobrir todos os eventos. O meu trabalho é esse, fazer a recolha das imagens para mostrar o que estava a constatar e fiquei sem nada", criticou.
Jorge Simba lamentou a atuação da polícia, que reprimiu fortemente a manifestação, com recurso a cavalaria, brigadas caninas e gás lacrimogéneo, e sublinhou que a polícia devia garantir a segurança dos jornalistas em vez de tentar travar o seu trabalho.
"Vandalismo e desacato às autoridades"
A governadora de Luanda, Joana Lina, considerou a manifestação, que foi fortemente reprimida pela polícia, como "um ato de vandalismo e desacato às autoridades", citada no Jornal de Angola.
Joana Lina lamentou as "cenas de violação das medidas contidas no Decreto Presidencial em vigor desde as primeiras horas de ontem [sábado (24.10)]" e sublinhou que são proibidos os ajuntamentos.
Afirmou ainda que não está em causa o impedimento ou limitação de direitos fundamentais, declarando que "é a própria Constituição que exige ponderação entre a liberdade de se manifestar e o dever de proteger a vida humana".
Por outro lado, lamentou os "prejuízos incalculáveis" e apontou fins "inconfessos" de pessoas que tentam manipular os jovens.
Ainda nas declarações ao Jornal de Angola, Joana Lina desmentiu os rumores sobre possíveis vítimas mortais na manifestação: "Lamentavelmente, os atos de vandalismo que causaram danos materiais, ainda por calcular, mas sem vítimas humanas, não devem voltar a acontecer na nossa província".
A marcha de sábado, convocada por ativistas da sociedade civil, contou com a adesão da UNITA e outras forças da oposição e visava reivindicar melhores condições de vida, mais emprego e a realização das primeiras eleições autárquicas em Angola.