Julgamento Rui Pinto: "Referências são penosas para Angola"
18 de outubro de 2022Rui Pinto voltou esta segunda-feira (17.10) a sentar-se diante do coletivo de juízes, no Tribunal Central Criminal de Lisboa, para prestar declarações. O pirata informático de 33 anos, que está a ser julgado há cerca de dois anos no âmbito do processo "Football Leaks", entrou para a sala de audiências pelas 10h00 (hora de Lisboa), de máscara, acompanhado de um dossier e computador portátil, que tem usado como suporte para esclarecer o tribunal.
O hacker português rebateu algumas das acusações, mas confirmou que acedeu a sistemas informáticos de empresas, pessoas e clubes de futebol para descobrir negócios pouco transparentes, que achou serem de interesse público.
Abordado persistentemente pelos jornalistas, Francisco Teixeira Mota, um dos advogados de Rui Pinto, não quis adiantar qualquer informação sobre os alegados crimes cometidos pelo seu cliente: "Eu compreendo o vosso trabalho, mas também tenho o meu e o meu obedece a outras regras diferentes. Não vou responder. Acha que eu vou dar a minha opinião sobre o julgamento em que sou parte?".
Rui Pinto explicou ao coletivo de juízes que queria saber qual a origem dos dinheiros que financiavam as transações nos negócios de futebol, acabando depois por pedir desculpa. "Sinto-me envergonhado por tudo isto. Não me sinto nada confortável", afirmou, referindo-se a e-mails em que terá tentado extorquir a Doyen Sports, um fundo de investimentos então liderado por Nélio Lucas.
Aproximação entre a defesa e a acusação
João Paulo Batalha, vice-presidente da Frente Cívica, uma associação portuguesa anticorrupção, considera interessante o arguido mostrar arrependimento e reconhecer, pela primeira vez, alguns dos 90 crimes de que é acusado. "Isto mostra que há uma aproximação, mesmo que mínima, entre a defesa e a acusação", afirma.
"Rui Pinto está disposto a assumir que praticou alguns dos crimes, mas ao mesmo tempo a mostrar arrependimento e a tentar que o desfecho final do julgamento possa ser uma pena suspensa, reconhecendo o interesse público das revelações que ele fez", diz ainda o vice-presidente da associação.
Paulo Batalha realça a importância das revelações feitas por Rui Pinto quer no âmbito do "Football Leaks" como no escândalo "Luanda Leaks", sublinhando que foram revelados dados "muito importantes" sobre crimes de corrupção e branqueamento de capitais cometidos na esfera do futebol e dos negócios angolanos em Portugal.
Ligações a Angola
Em ambos os escândalos há ligações a Angola, lembra o analista Carlos Gonçalves. No "Luanda Leaks" foi citado o nome da empresária Isabel dos Santos. Álvaro Sobrinho, empresário luso-angolano envolvido na transferência para o Sporting do ex-treinador do Benfica, Jorge Jesus, foi mencionado no caso "Football Leaks".
"Quaisquer referências são penosas para a imagem de Angola, ainda mais numa altura em que muito se questiona sobre o alcance do programa de combate à corrupção do Presidente João Lourenço", considera.
O jornalista angolano, que também acompanha o julgamento, está convicto de que estes dois processos "só farão estragos mesmo ao nível da imagem" de Angola, considerando que grande parte das informações veiculadas nesse âmbito foi obtida de forma fraudulenta.
Rui Pinto responde por um total de 90 crimes, ao qual se junta mais um anunciado na semana passada. Mais de 60 são de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, além dos crimes de sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão na forma tentada à Doyen.