Investigação: Em que ponto está o caso de Cafunfo?
27 de abril de 2023A investigação do caso do Cafunfocontinua parada. Dois anos depois dos acontecimentos em Lunda Norte, ainda não há responsabilização para os crimes cometidos em Angola naquele início de 2021.
O governo disse ter agido contra uma invasão a uma esquadra policial e contou seis mortes. Já a sociedade civil afirma que foram mais de 100 mortos em um massacre durante uma manifestação pacífica.
Segundo Zola Bambi, presidente da organização Observatório para Coesão Social e Justiça, que foi responsável pelo relatório civil, a mobilização iniciou como um protesto legítimo. "O melhor para o Governo é que não haja vozes discordantes”, enfatiza. Bamdi defende que o conflito serviu para tirar areia nos olhos da população com relação as falhas e excessos do Estado e, por isso, as investigações estão paradas.
"O que estamos em conta na questão do Cafunfo é que houve um crime de Estado. Há envolvimento do topo da pirâmide. Por isso é que não havia interesse em se esclarecer o que aconteceu. Então era necessário um bode expiatório que tornaram os manifestantes. Eles foram levados a um processo injusto, [já] que a intenção era apresentá-los como responsáveis de algo que realmente não aconteceu”, explicou.
Amnistia a Zecamutchima
Uma das lideranças que havia sido acusada de orquestrar a mobilização na Lunda Norte foi Zecamutchima. Há quase um mêsliberto pela lei da amnistia, o presidente do Protetorado da Lunda Tchokwe diz que é um alívio estar livre de todas as acusações, mas lembra que isso não significa justiça.
"Eu fui ilibado de todo o processo. Mas é da nossa preocupação que o estado angolano, que fez terrorismo ao destruir e matar pessoas inocentes, indemnize as famílias”, disse.
Manutenção de segredos
Além de Zecamutchima, o Observatório para Coesão Social também reinvidica a investigação. Zola Bambi enumera diversos crimes do Estado e enfatiza que o poder mantém segredo sobre todos eles.
"Foi muita gente jogada para o Rio Kwango, muitos corpos. Outros foram enterrados nas matas. Obrigaram os cidadãos a fazerem e muitos deles depois de o terem feito foram executados. É mesmo aberrante e inaceitável no século 21 que o Estado admita essas questões e não investigue a fundo. Como exemplo: quase todos os elementos das forcas (policiais e de segurança) foram transferidos. Ninguém trabalha agora naquela zona de Cafunfo, para guardarem o segredo”, afirma.
Bamdi também lembra que o relatório do Observatório que apurou esses crimes e as mortes foi feito sem nenhum suporte do Governo, mesmo durante a pandemia.
"Tivemos que ser inventivos. Foi constatado in loco, visitadas as famílias e temos a prova de que os atos aconteceram. Nós achamos as informações de formas mais simples, por vias telefónicas ou fotografias. E assim, realizamos esse relatório que estão os nomes, a antiga localização das pessoas, data e local de nascimento e o último dia que a família o viu e as circunstâncias, sobretudo, de como perderam as vidas”, relatou Bamdi.
Discordâncias e silêncio
Para o jornalista Rafael Marques, não se esconde 100 corpos no Cafunfo. Pesquisador da região há 30 anos, Marques afirma que o relatório tem incongruências e com a libertação do Zecamuchima o caso deveria ser considerado encerrado.
A procuradoria do Governo da Angola foi contatada na apuração dessa reportagem, mas se negou responder as questões sobre o caso do Cafunfo.