EUA: Invasão do Capitólio "é o maior atentado à democracia"
7 de janeiro de 2021Que Joe Biden seria confirmado pelo Congresso como o próximo Presidente dos Estados Unidos já todos sabiam. O que não se sabia é que seria possível a milhares de apoiantes do Presidente cessante, Donald Trump, invadirem o coração da democracia norte-americana, o Capitólio, para interromper a ratificação da vitória do democrata. Quatro pessoas morreram nos confrontos com a polícia.
O professor catedrático Jorge Miranda culpa Donald Trump pelo que aconteceu, por insistir que houve fraude nas eleições presidenciais de novembro, sem apresentar provas. "É o maior atentado à democracia que aconteceu nos Estados Unidos. Foi quase um golpe de Estado que iria acontecer. A gravidade do que aconteceu é terrível e foi preparado por Trump durante dois meses", afirma.
O constitucionalista português diz que, como consequência, Trump deveria ser afastado do cargo e levado à Justiça. À DW África, Jorge Miranda, de 79 anos, refere que não tem memória de algo semelhante na democracia norte-americana: "Entrada no Capitólio, só me lembro do que aconteceu em Portugal em 1975, durante a revolução, quando a Assembleia Constituinte foi sequestrada. Mas era um período revolucionário, agora os EUA vivem em democracia normal e o que aconteceu é de uma gravidade terrível, terrível".
À moda de um ditador africano
O jovem imigrante guineense Anizio Indamini, que vive há mais de 11 anos nos Estados Unidos da América, nota no dia a dia que Trump tem incutido na mente de milhões de pessoas que é mais importante do que o próprio Estado e que quem se lhe opõe é porque é antipatriota. "Tudo foi feito propositadamente e bem planeado", considera. "Ontem foi a última tentativa de se manter no poder a modelo dos ditadores africanos".
Anizio diz que, pelo que se vê nas ruas americanas, esta atitude não acaba com a saída de Donald Trump da Casa Branca: "Fica o Trumpismo. Ele semeou ódio na sociedade e acreditaram nas suas inverdades. Seria pior se fosse reeleito para um segundo mandato".
O antigo embaixador da Guiné-Bissau junto das Nações Unidas, em Nova Iorque, João Soares da Gama, comenta que a invasão do Capitólio ficará para sempre como uma mancha na democracia norte-americana, considerada exemplar - uma mancha difícil de apagar nas relações com os aliados. O diplomata diz que a América deu um mau exemplo aos países africanos que estão no processo da consolidação da democracia e "não incentiva outros países a sementarem as suas democracias internas".
"A democracia americana foi sempre exemplar. Se as eleições não corressem na perfeição noutros países, os EUA eram os primeiros a condenar, mas aquilo que vimos ontem foi uma vergonha", afirma Soares da Gama.
Críticas multiplicam-se
Na comunidade internacional, ninguém ficou indiferente à invasão do Capitólio. A União Europeia disse que o que aconteceu na quarta-feira foi um "ataque à democracia". A chanceler alemã Angela Merkel também não adoçou as palavras: "Fiquei furiosa e entristecida ao ver estas imagens. Lamento muito que o Presidente Trump não admita a derrota desde novembro e que ontem também não o tenha feito", afirmou.
França condenou igualmente o que disse ser um "ataque sério à democracia". Oficiais na Rússia disseram que a invasão do Capitólio é uma prova do declínio norte-americano.
Mas Donald Trump já prometeu que haverá uma transição ordeira. Joe Biden tomará posse a 20 de janeiro como Presidente dos Estados Unidos. E isso, segundo o professor queniano Nyaigoti Chacha, mostra que a democracia norte-americana continua a funcionar.
"Depois dos distúrbios, o Senado e o Congresso certificaram a vitória do Presidente eleito, Joe Biden, […] apesar de Donald Trump ter tentado fortemente minar a democracia do país", sublinha.
O resultado das eleições presidenciais norte-americanos está selado: 306 votos para Biden contra 232 para Donald Trump. O vice-Presidente cessante, Mike Pence, colocou como imagem de fundo, na sua conta na rede social Twitter, uma fotografia do próximo Presidente, Joe Biden, com a futura vice-Presidente, Kamala Harris. Pence disse que "a violência nunca ganha" e a liberdade vencerá.