Iniciou-se julgamento do processo "Lancha Voadora" em Cabo Verde
18 de março de 2013O julgamento foi adiado no mesmo dia em que começou. Um dos quinze acusados não esteve presente na abertura do julgamento, alegadamente por falta de condições para se deslocar ao tribunal. Isso fez com que as primeiras audiências fossem adiadas para esta quinta-feira (21.03.2013).
Entre os quinze arguidos está o ex-presidente da Bolsa de Valores de Cabo Verde, Veríssimo Pinto, que é uma das oito pessoas que estão em prisão preventiva há 15 meses. Todos são acusados de crimes de tráfico de droga, associação criminosa e lavagem de capitais.
Maior apreensão de cocaína de sempre
A operação “Lancha Voadora” começou no dia 8 de outubro de 2011, quando a Polícia Judiciária cabo-verdiana fez a maior apreensão de sempre de drogas no arquipélago: uma tonelada e meia de cocaína em elevado estado de pureza.
Nessa operação foram apreendidos milhares de euros e outras moedas estrangeiras e milhões de escudos cabo-verdianos em notas. A Polícia Judiciária confiscou também algumas viaturas topo de gama e armas.
No dia 22 de dezembro de 2011, o Tribunal da Comarca da Praia decretava prisão preventiva ao então presidente da Bolsa de Valores de Cabo Verde, Veríssimo Pinto.
Reações da política
A prisão de Veríssimo Pinto deixou muito triste o primeiro-ministro, José Maria Neves, uma das poucas personalidades que se pronunciou publicamente sobre esta operação.
"É de lamentar o facto de isso ter acontecido com o presidente da Bolsa de Valores, um jovem muito capaz, muito competente", disse o primeiro-ministro. José Maria Neves disse também estar confiante na Justiça do país: "Este facto engrandece Cabo Verde porque nos apresentamos ao mundo como um país em que as instituições funcionam e em que ninguém está acima da lei."
O deputado Abraão Vicente, do partido Movimento para a Democracia (MpD) foi uma das poucas vozes da oposição que falou sobre o assunto. E, quando o fez, foi para comentar a declaração de José Maria Neves – na sua ótica, um claro aproveitamento político que roça o cinismo.
"Na sua primeira declaração sobre esse assunto, o doutor José Maria Neves não só desvalorizou o facto de Veríssimo Pinto ter sido preso, como aproveitou a situação para mostrar que as instituições da República funcionam", referiu. "Ora, é no mínimo irónico pensar que Veríssimo Pinto até há duas semanas atrás era um homem de absoluta confiança do doutor José Maria Neves."
Reputação de Cabo Verde em risco
Depois da prisão de Veríssimo Pinto, tanto a oposição como a sociedade civil ficaram apreensivas quanto a possíveis consequências do caso "Lancha Voadora" na praça financeira e na imagem de Cabo Verde.
O economista Paulino Dias lembra que o setor financeiro assenta na confiança das pessoas. E se essa confiança é afetada, o impacto em termos da estabilidade, da confiança e da credibilidade do sistema financeiro "é enorme".
A oposição chamou ao Parlamento o Governador do Banco Central. Carlos Burgo garantiu aos deputados que o sistema nacional de prevenção e repressão da lavagem de capitais é globalmente adequado, pese embora existirem riscos emergentes.
Burgo admitiu que Cabo Verde colocou em risco a sua reputação: "Não ignoro que preferiria que alguns eventos não tivessem tido lugar e danificam a reputação [do país]."
Veríssimo Pinto diz ser vítima de injustiça
Em janeiro de 2012, o antigo presidente da Bolsa de Valores falava pela primeira vez sobre o caso numa entrevista do jornal "A Nação" a partir da Cadeia Central da Praia.
Veríssimo Pinto disse que é inocente e que está a ser vítima de uma das maiores injustiças na história de Cabo Verde, negando assim todas as acusações. O ex-presidente da bolsa cabo-verdiana acredita que os motivos que levaram à sua detenção têm a ver com inveja e alguma maldade adoçada com alguma gota de política.
Uma semana depois dessa entrevista, o Conselho de Administração do banco angolano BAI/Cabo Verde confirmou a suspensão temporária de dois funcionários seus, por alegada lavagem de capitais relacionada com o processo "Lancha Voadora".
A notícia que vazou para a imprensa irritou um dos advogados de Veríssimo Pinto, José Manuel Pinto Monteiro, por na sua perspetiva, estar a haver uma violação do segredo de justiça.
"Os factos divulgados nas notícias não constam do processo nem de elementos que foram disponibilizados à defesa", disse. Por isso mesmo decidiu "reagir", para evitar que "continuasse a haver a violação do segredo de justiça."
Autor: Nélio dos Santos (Cidade da Praia)
Edição: Guilherme Correia da Silva / Helena Ferro de Gouveia