Há 350 mil crianças deslocadas em Cabo Delgado
1 de abril de 2021Em comunicado, o Fundo das Nações Unidas para a Infância apela à proteção das crianças vítimas da violência em Cabo Delgado e alerta para a urgência de ajuda humanitária à população de Cabo Delgado, assolada também pela Covid-19 e pela cólera, além da pobreza extrema.
Na terça-feira (30.03), a UNICEF recebeu um grupo de crianças evacuadas de Afungi pelos Serviços Aéreos Humanitários da ONU, das quais pelo menos sete estavam não acompanhadas.
"Desorientadas e com medo, muitas destas crianças passaram dias escondidas no mato, sem comida e água. A situação, que já era grave antes do recente ataque de Palma, ganha agora contornos ainda mais urgentes e desafiantes para as equipas da UNICEF no terreno", refere a agência da ONU.
Impacto "brutal" do ataque
Segundo a diretora executiva da UNICEF, Henrietta Fore, poderá ser "brutal" o impacto do ataque em Palma na quarta-feira da semana passada, que as autoridades moçambicanas dizem ter resultado na morte de dezenas de pessoas e na fuga de centenas.
"Palma já acolhia mais de 35.000 pessoas deslocadas vindas de outras zonas da província devido a ataques anteriores. Metade destas pessoas são crianças. As vias terrestres de acesso ao distrito foram cortadas devido à insegurança nos últimos meses, com níveis mínimos de fornecimento de artigos e assistência a chegarem por via aérea e marítima", disse Fore.
Pequenas quantidades de alimentos e outros artigos começaram a chegar recentemente, mas, até há poucos dias, grande parte do distrito para além da capital (Pemba) era praticamente inacessível aos colaboradores humanitários, adianta.
As últimas três unidades de saúde funcionais deixaram de estar operacionais e o hospital principal foi destruído, enquanto no Hospital Provincial de Pemba há crianças feridas a receber cuidados e mais a caminho.
"Situação gravíssima"
A UNICEF está a preparar-se para receber as crianças em vários pontos da província, calculando que "precisarão de absolutamente tudo - proteção, nutrição, cuidados de saúde e alguém para as ouvir e proporcionar apoio psicossocial".
Beatriz Imperatori, directora executiva da UNICEF Portugal, salienta que "a situação em Moçambique é gravíssima", somando-se ao alastrar da pandemia de Covid-19, um surto de cólera que está a evoluir para outras províncias e a recuperação das catástrofes naturais.
"Moçambique enfrenta ainda as consequências de um conflito armado que já obrigou a deslocar cerca de 350.000 crianças. As populações locais têm vindo a enfrentar choque após choque - incluindo ciclones e eventos climáticos extremos, desde 2019", afirmou Imperatori.
A UNICEF, que está a receber donativos para apoio às operações em Cabo Delgado, apela a todas as partes para que façam tudo ao seu alcance para manter as crianças fora de perigo, para proteger os trabalhadores humanitários e para permitir o acesso rápido, desimpedido e sustentado aos civis que precisam de assistência.
ONU registou mais 8.000 pessoas afetadas
Segundo o porta-voz do secretário-geral das Nações Unidas, a Organização Internacional para as Migrações (OIM) "já cadastrou cerca de 8.000 pessoas nos pontos de chegada em Nangade, Mueda, Montepuez e Pemba", em Cabo Delgado, desde a semana passada, mas ainda há centenas de pessoas a tentar sair da vila Palma e existem "milhares de pessoas" em movimento "a pé, de barco ou pela estrada".
"A escalada da violência na província de Cabo Delgado continua a impulsionar o deslocamento em massa, após os recentes ataques por grupos armados não estatais e confrontos em curso relatados em Palma desde 24 de março", disse Stéphane Dujarric, porta-voz de António Guterres, em conferência de imprensa virtual. "É importante para a comunidade internacional, neste momento, apoiar Moçambique da melhor forma possível", apelou.
Segundo o porta-voz, várias agências da ONU estão presentes e tentar prestar socorro e ajuda humanitária em Moçambique, como o Fundo das Nações Unidas para a População, que está a preparar e disponibilizar 'kits' de parto e medicamentos essenciais para apoiar mulheres grávidas e mães deslocadas.
O Programa Alimentar Mundial está a tentar ajudar 50 mil pessoas "afetadas pela violência mortífera em Palma", com a distribuição de pacotes de alimentos de emergência e, em conjunto com UNICEF, fornecer água potável a uma "população desesperada", segundo um comunicado publicado hoje.