Heinrich XIII, o príncipe extremista que planeou um golpe
8 de dezembro de 2022Há mais de um século, os antepassados de Heinrich XIII, príncipe de Reuss, governaram a cidade de Gera e arredores, no que é hoje o estado da Turíngia, no leste da Alemanha. Se Heinrich tivesse conseguido levar o seu plano avante, tudo isso e muito mais seria dele em resultado de um golpe de Estado que estaria a planear contra o Governo de Berlim.
Na manhã desta quarta-feira (07.12), a polícia alemã deteve o príncipe e 24 outros suspeitos de serem cúmplices deste plano em vários estados do país.
"Conheça o homem que queria tornar-se rei da Alemanha" foi um tweet partilhado vezes sem conta nas redes sociais. O líder do partido A Esquerda, Dietmar Bartsch, por exemplo, foi um dos que o partilhou.
Segundo as autoridades alemãs, os detidos pertencem a uma rede de "teóricos da conspiração" chamada "Reichsbürger" (Cidadãos do Império Alemão), que estima-se que tenha cerca de 21 mil seguidores.
Outrora um grupo marginal, o grupo entende que o Governo alemão é ilegítimo desde o fim da Segunda Guerra Mundial. E defende que a Constituição alemã, o chanceler Olaf Scholz e o Bundestag (Parlamento alemão) fazem parte de um sistema criado pelos Aliados no final da Segunda Guerra Mundial para fazer da Alemanha um Estado vassalo aos seus interesses.
Golfe, imobiliário e conspirações
Com 71 anos, o príncipe Heinrich divide o seu tempo entre Frankfurt, onde se localiza a sua empresa imobiliária e o seu clube de caça na Turíngia. Foi neste clube que acolheu os simpatizantes do "Reichsbürger", bem como o "Princely Hickory Golf Club Reuss".
Entre a organização de clubes de golfe para as elites locais e a venda de imóveis, Heinrich XIII encontrou tempo para preparar uma palestra sobre as suas teorias para o World Web Forum, em Zurique (Suíça), em 2019.
Na ocasião, Heinrich reiterou a sua crença de que, como não houve um tratado de paz no final da Segunda Guerra Mundial, a atual República Federal não tem uma base válida. Ou seja, concluiu, o único passo lógico, na sua opinião, seria devolver a Alemanha aos tempos do Kaiser (Impedrador), que foi derrubado há mais de cem anos contra a vontade do povo, afirmou ele.
Horrorizados, alguns participantes abandonaram a sala, outros vaiaram o discurso do príncipe, que foi convidado para o evento à última hora após a desistência de um dos oradores.
Processo contra o Governo alemão
Heinrich XIII, que foi casado com uma modelo e é amante de corridas de automóveis, fez durante anos campanha para que o mausoléu da sua família, no centro da cidade de Gera, fosse reconstruído.
Tal como outros membros da família - o príncipe tem cinco irmãos - Heinrich XIII exigiu do Estado alemão uma indemnização pela expropriação de bens artísticos e culturais. Em resultado, em 2017, o grupo de herdeiros recebeu 3,1 milhões de euros.
No entanto, tentativas seguintes de Heinrich de processar o Governo alemão para recuperar terrenos e propriedades que ele afirma serem seus falharam. Heinrich gastou avultadas somas de dinheiro nesta luta, tendo começado a alegar que existia uma conspiração contra si no sistema judicial alemão.
Ao mesmo tempo, continuou a coordenar uma "tropa de defesa da pátria" que, de acordo com os serviços de segurança de Berlim, tinha algumas dezenas de membros a planear um ataque violento contra o Parlamento. Entre os suspeitos estão antigos e atuais membros das Forças Armadas e da polícia.
Em declarações à imprensa local, pessoas que conhecem o príncipe afirmaram desconhecer que ele seria o líder de um grupo terrorista de extrema-direita. No entanto, a sua família distanciou-se dele há alguns meses. Um porta-voz da Casa de Reuss afirmou, na altura, que Heinrich era um idoso confuso que acreditava em "teorias de conspiração erróneas".
Após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a primeira Constituição democrática da Alemanha aboliu oficialmente a realeza e a nobreza, e os respetivos privilégios e imunidades legais. Atualmente, a nobreza alemã já não é reconhecida, e a Constituição estipula que os descendentes das famílias nobres alemãs não gozam de privilégios legais.
Rússia nega envolvimento
Ainda segundo as autoridades, a maioria dos cúmplices do príncipe são alemães. O grupo teria até um "esboço" para a organização do Governo alemão após o golpe, na qual Heinrich XIII assumiria o cargo de chefe de Estado.
Uma alegada cúmplice de Reuss, a russa Vitalia B., também foi presa durante a operação. De acordo com o Procurador-Geral, há fortes suspeitas de que ela tenha "ajudado Heinrich XIII a estabelecer contactos com representantes da Federação Russa".
A embaixada russa em Berlim já negou a sua ligação à suspeita em causa.